FUMAÇA MÁGICA

HUGO CARVALHO*

 

Arte e Prazer para os bons momentos da sua vida

050 ASSÉDIO SEXUAL 24/07/01
049 SPECIAL RESERVE 04/06/01
048 BENS DA NATUREZA 26/04/01
047 FALANDO DE PREÇOS 09/04/01
046 AFLIÇÕES COTIDIANAS 11/03/01
045 MARCHAND DE PRAZERES 20/02/01
044 BAFORADAS PROIBIDAS 09/01/01
043 FORMATOS 25/10/00
042 BAIANIDADE 02/10/00
041 PUROS PRAZERES 29/08/00
040 A ÁRVORE DOS MEUS AMIGOS 19/07/00
039 CONSULTAS 03/07/00
038 FLAUTA 15/06/00
037 GRANDE ALEGRIA 29/05/00
036 FEITOS NAS COXAS 12/05/00
035 MANIAS 20/04/00
034 PRAZER INDULGENTE 07/04/00
033 FUMOS PARA CHARUTOS 14/03/00
032 AXÉ 18/02/00
031 VARIAÇÕES NO PRAZER 31/01/00
030

O QUE É QUE A BAIANA TEM?

13/01/00
029

MÁRIO PORTUGAL

20/12/99
028 ALEGRIA DOS HOMENS 09/12/99
027 PRECONCEITO CROMÁTICO 20/11/99
026

PATAMAR DE EXCELÊNCIA

05/11/99
025 O TEMPLO AO TEMPLÁRIO 27/10/99
024 NÃO SE MATA SEDE COM CHAMPANHE 19/10/99
023 EUREKA 11/09/99
022 OS CHARUTOS E O CÂMBIO 06/04/99
021 SECRETÁRIO MUNICIPAL 14/01/99
020 COMUNICAÇÃO VIRTUAL 10/11/98
019 CIGAR JOY 26/10/98
018 SEMPRE NA FRENTE 10/09/98
017 GOSTO DE FESTA 27/07/98
016 PALAVRAS DE NESTOR JOST 30/06/98
015 SENTIMENTOS DE UM FUMADOR 30/03/98
014 DEU NA GAZETA MERCANTIL 12/01/98
013 FELIZ 1998 12/12/97
012 PREÇOS EM DÓLARES EM 1997 27/11/97
011 ACENDENDO UM CHARUTO 03/11/97
010 VIAGEM A SÃO GONÇALO – 4ª PARTE 16/10/97
009 VIAGEM A SÃO GONÇALO – 3ª PARTE 30/09/97
008 VIAGEM A SÃO GONÇALO – 2ª PARTE 16/09/97
007 VIAGEM A SÃO GONÇALO – 1ª PARTE 31/08/97
006 A GUARDA DOS PUROS 12/08/97
005 PRAZERES SENTIDOS 25/07/97
004 INDIVIDUALIDADE E ORIGINALIDADE 03/07/97
003 GLOSSÁRIO 05/06/97
002 QUEM ENSINOU A ARTE DE FUMAR 20/05/97
001 RITO DE 500 ANOS 29/04/97
 

FUMAÇA MÁGICA - CRÔNICAS 150 ATÉ 200

 
 

FUMAÇA MÁGICA - CRÔNICAS 125 ATÉ 150

 
 

FUMAÇA MÁGICA - CRÔNICAS 125 ATÉ 150

 
 

FUMAÇA MÁGICA - CRÔNICAS 101 ATÉ 125

 
 

FUMAÇA MÁGICA - CRÔNICAS 051 ATÉ 100

 

 

050.    ASSÉDIO SEXUAL

Eu que há muitos anos venho escrevendo sobre charutos e suas fumaças mágicas, incluindo-se as variadas formas de empunhadura dos ditos, ando avexado. Não o é, confesso, com o decreto de final do ano passado proibindo, entre outras tantas coisas, a propaganda dos fumígeros. Nem com as novas regras da Agência Nacional de Vigilância Sanitária determinando o uso de imagens contra o fumo na apresentação gráfica das embalagens. 

Estou preocupado mesmo é com o dispositivo que pune com o Código Penal o chamado assédio sexual. O famigerado assédio abandonou a condição de “vacacio legis”, tornando-se de fato criminoso por conta da lei aprovada recentemente.

 Palavras gentis e atitudes galanteadoras serão sempre bem vindas desde que não ultrapassem o bom senso e não criem constrangimento a quem as ouve ou as recebe. E, é aí que a coisa pega. Pelo andar da carruagem, à falta de uma clara delimitação entre galanteio e assedio, algo que ficará sempre a critério do humor do alvo, a coisa pode complicar. Nossos queridos Doubles, Robustos, Special Reserves e outros mais perigam acabar sendo enquadrados em atentado ao pudor. Se com um puro sedutoramente à boca, mirarmos uma beldade com olhos que nunca envelhecem, e a dita não gostar ou for dessas antitabagistas convictas, assédio à vista. Cadeia no sujeito!

Já não podemos degustar os puros em nossos escritórios; na morada familiar, se apartamento for, nem pensar; em shoppings e outros locais públicos somos quase execrados e, ainda por cima, querem acabar de vez com o galanteio, motivador de vaidades que mexem com o ego feminino. Tá ficando difícil....

Os tempos das lupas, bengalas, galochas, das cartas de amor e dos poemas acrósticos, os tempos dos véus e dos chapéus passaram. Agora tudo é rápido, veloz, direto. São tempos dos bits, dos hertz, dos quartz, dos waps, dos e-mails. Mas espero que nossos puros fiquem infensos aos modernismos, apesar de ter gente “inventando” charutos aromatizados e outros besteiróis. E que não passe pela cabeça de ninguém que fumar um robusto Alonso Menendez à frente de uma dama possa configurar insinuações de assédio, adjetivado ou não. Afinal, depois do que aconteceu com o Bill Clinton, tudo é possível.

049.    SPECIAL RESERVE

Acendem-se os puros de muitas maneiras. Além das tradicionais, outras há que também resolvem o problema. Entre as nada ortodoxas me refiro a meu hábito de acende-los no fogão, já citado em crônica anterior. Há também, quando dos festejos juninos ou das churrascadas, o costume de dar-se candela ao puro num tição do braseiro. Mas, dentre todos os modos, os fósforos continuam sendo a forma ideal de curtir-se o ritual. Por isso, a cada encomenda de seus charutos prediletos, o Amigo estará recebendo uma caixa com 200 fósforos de segurança na qual, além das instruções básicas de seu conhecimento, terá sempre à mão meus telefones para qualquer emergência. Passei a adotar essa praxe para atender constantes solicitações a respeito e espero que isso seja mais um fator diferencial a se agregar aos serviços que lhe presto. De novidades, além dos novos preços, antecipadamente anunciados, temos também o lançamento do charuto Alonso Menendez Special Reserve, do qual trato a seguir.

Majestosa, embora o adjetivo seja dos tempos d’El Rey, é sem dúvidas, o qualificativo que melhor se adequou à caixa dos Alonso Menendez Special Reserve, charutos que, anunciados na imprensa há algum tempo, são aguardados com incontida ânsia pelos consumidores nacionais. Fotos, diz-se, falam melhor que palavras. Mas, nesta edição irei desnudar o sonho sem saciar a curiosidade visual. É a vez primeira que falo dos Special Reserve.

Feitas a capricho, todas em cedro com quinas trabalhadas em baixo relevo, fechos dourados importados almofadados em preto, as embalagens dos Special Reserve, logo revelam a arte e a perfeição do seu conteúdo. Por dentro, para completar a distinção e a classe, em berço flocado na cor vinho se acomodam, separadamente, como se jóias fossem, dez unidades dos Alonso Menendez Special Reserve. Anéis brancos com arrojado design, a ouro impresso, aumentam a estética, aguçam a visão e complementam a riqueza desta obra prima da charutaria brasileira, cujo resplandecente sabor nasce de fumos de safras envelhecidas.

Capa Connecticut importada, capote da variedade piloto cubano plantado na República Dominicana e mescla composta por fumos das variedades Brasil-Bahia Mata Fina e Mata Norte, tudo superselecionado, transformam os Special Reserve nos charutos non-plus-ultra do mercado, causando inveja às melhores regalias mundiais. É ver para crer.

Você ao abrir uma de suas caixas sentirá, como eu senti ao manusear os primeiros protótipos, um misto de entusiasmo e alegria associado ao incontido desejo de logo degustá-los. E – oh! – delícia das delícias, ter  tal desfrute plenamente recompensado.

Por certo o Amigo não irá fumá-los em todos os momentos, mas em todos os momentos que apreciá-los, admirado, irá pensar consigo mesmo: “Puxa vida! Hugo Carvalho tinha razão; esse pessoal da Menendez & Amerino entende mesmo do riscado”.


048.    BENS DA NATUREZA

Consumo algo ao redor de oito charutos diários. Por prazer e por dever de ofício, amante apaixonado por puros, sei quando nossos charutos estão ou não, à perfeição. E, quando falo nossos charutos estou me referindo ao Alonso Menendez e Dona Flor aos quais meu paladar se afeiçoou. Confesso que fumar cubanos para mim é quase um pesadelo sem querer, com tal assertiva, tirar-lhes a qualidade que os caracteriza, nascida muito mais da fama passada que de suas características intrínsecas presentes. Considero os puros habanos com um “punch” demasiado a meu paladar. Se os fumasse habitualmente, não conseguiria manter minha enfumaçada média. Fumo não só pelos prazeres gustativo e olfativo. Os puros são também meus companheiros na fábrica, no campo, em casa e em muitos finais de tarde quando, eu e vários amigos veteranos da vida, jogamos cartas. Entre eles há alguns que também apreciam charutos. Bibi, que treme as mãos ao descartar, prefere os Alonsos # 10. Mário, o Amerino Portugal, sócio titular da companhia, prefere os Alonsos # 20. Lino, o galego dono do jogo, herético, alterna cigarros com puros; eu com meus Robustos. Há também Vavá do Capim, que de setent´anos não morre mais, fumante de cigarros desde menino e, para compensar pois nada é perfeito neste mundo de meu Deus, há um advogado, Gerson, nosso nobre causídico, que abomina fumo e vive sempre reclamando do fumacê geral. Acontece que sua paixão pelas cartas é bem maior que sua aversão ao tabaco. Tanto que, volta e meia, nos fila charutos, baba-os, e lança amadoristicamente para tristeza nossa, baforadas sem classe.

Neste começo de noite a rodada acabou mais cedo e eu me deixei ficar por aqui, sozinho, após haver acendido o undécimo charuto da jornada, rabiscando estas mal enfumaçadas linhas. Se trago? De vez em quando aspiro uma parte residual da fumaça, especialmente quando o puro está “redondo” ou seja, quando todos os fumos de sua mescla queimam de maneira uniforme. Como é óbvio, vez ou outra, me encontro com algum charuto que não queima bem, ou “amarga”, ou “pica” demais ou apaga a toda hora. Em tais casos não me aborreço, nem perco meu tempo. Desfaço-me dele pois aquilo que nasceu errado não se conserta.

Produtos 100% naturais os puros são assim mesmo. Isso também acontece com as frutas, os tubérculos e outros tantos bens da natureza. A gente só sabe se estão bons quando os prova. E a ninguém ocorre, por exemplo, insistir em comer um fruto ácido – mesmo que seja o proibido – ou culpar o agricultor que o produziu. Abandona-se o fruto, escolhe-se outro.

Bens da natureza por excelência os charutos têm dessas coisas. Agora mesmo, meu Alonso Robusto está divino. Cinza compacta, combustibilidade homogênea e persistente, aroma magnífico, sabor excepcional. Por isso me deixei ficar, gostando e degustando, enquanto a caneta escorre sobre estas folhas apoiadas no pano verde, plenas de cartas espraiadas no entorno. O Rei de Espadas olha para mim com invejado e congelado olhar. Acabo de perceber que ele e o Rei de Copas empunham bastonetes defensivos. Não ficaria melhor se fossem charutos? O Rei de Ouros, encabulado, abdicou das armas escondendo as mãos.

Sempre gostei de viajar nos baralhos. Lembro de minha infância, quando descobri nas gavetas do bureaux (era assim que se chamavam às escrivaninhas) de meu pai, um baralho que, no verso, em vez dos arabescos característicos, tinha mil mulheres nuas em poses, para a época, lá se vão cinqüenta anos, excitantes. Desnecessário dizer que tal baralho me deu tantos prazeres quanto os puros que, hoje em dia, fumo. Todos os dias, mas todo o dia mesmo, lá estava eu consultando as cartas, firme, forte, enamorado. Hoje, sessentão, em vez do verso, o anverso. Por isso, olhando para dentro de mim mesmo, acabo de redigir, sem barulhos, este bate-papo com Você. De puros e de baralhos.


047.    FALANDO DE PREÇOS

Aproveito a ocasional ausência da família e, papel e lápis à mão, saio do gabinete ou vou para meu recanto doméstico predileto: a churrasqueira-cozinha externa na qual, curto a aragem e posso fumar à vontade. A brisa que vem do leste, nesta noite de abril quase-verão, quase-outono, disputará comigo o precioso incenso. Vou dar candela a meu Alonso Menendez Especiales #2, o preferido de tais ocasiões. Para tanto, e sem frescuras, elejo uma das bocas do fogão. Fogo de fogão é ótimo! Acomodo-me à mesa e enquanto que com a destra rascunho este bate-papo, com a sinistra, cotovelo apoiado no braço da cadeira, empunho e manejo o magnífico puro. De um lado do dito, por embaixo, o polegar servindo de base. Do outro, por cima, os demais dedos como se estivessem à procura dos orifícios de imaginária flauta, tateiam, apalpam e rodam o charuto sentindo-lhe a maciez e a forma inconfundível. Minha cabeça pende à esquerda em busca da mão que guarda a fumaça mágica. Suavemente aspiro-a; olhos entreabertos. Inundo a boca retendo, por instantes, o enfumaçado aroma. Inebrio-me. Inspiro e inspiro-me. Exalo. Vivo. O diligente relógio tiquetaqueia essa hora de prazer a dois. Eu e meu charuto no habitual reencontro, a sós e sossegados, no momento em que me proponho a falar de preços com Você.

À parte ponho, portanto, o P de puros, de prazer, de poesia e parto para o P – pragmático – de preços sabendo que Você me compreende perfeitamente. Da mesma forma que os carnavalescos entendem, melhor do que eu, os enredos da Marques de Sapucaí.

Volta e meia sou questionado pelo fato de serem encontrados no mercado sulista, preços inferiores aos praticados na Bahia.

Até pouco menos de dois anos a rede nacional distribuidora dos charutos Alonso Menendez e Dona Flor, era inferior a 80 pontos de venda. Hoje, graças a esforços empreendidos pelo fabricante, passam de 300 os locais onde seus puros podem ser encontrados. Sendo assim, como seria de se esperar, a concorrência decorrente da maior oferta, forçou a muitos reduzirem suas margens de comercialização. Eu, por meu turno, que mantive o tradicional critério de formação de preços de venda divulgando nacionalmente a tabela, passei a ser quase que um «normalizador» de preços no mercado não podendo, nem devendo, por isso mesmo, entrar em tal disputa.

Tenho procurado compensar o fato com uma prestação diferenciada de serviços, mesmo quando por qualquer motivo, deixo de ser seu habitual fornecedor. E Você sabe disso. Minha ligação com meus leitores não se limitou, nem se extinguiu, com o último negócio feito.

Aliás, aqui vale um parêntese em nosso bate-papo. Quando em crônica anterior externei minhas preocupações cotidianas em manter nosso relacionamento em alta, não esperava receber tantas e tão simpáticas manifestações de amigos do Brasil inteiro. A todos, portanto, meu mais sincero agradecimento pelas palavras de apoio e incentivo.

Mas, voltando ao tema preços, vale ressaltar que o reajuste do salário mínimo em 19,2% e a desvalorização do real frente ao dólar, a qual nos últimos dez meses, atingiu 17,7%, tiveram seus inevitáveis reflexos nos custos de produção dos charutos. O primeiro deles por razões óbvias e a desvalorização cambial pelo fato do dólar ser a moeda de referência dos custos dos fumos em geral. Assim sendo, não se surpreenda o Amigo, se em maio os preços dos charutos nacionais venham a ser reajustados em algo ao redor da faixa 10 -15%. O corrente mês se constitui, pois, em valiosa oportunidade para renovação de seus estoques antes da alta.

Até nosso próximo encontro.


046.    AFLIÇÕES COTIDIANAS

Administrar o relacionamento com o maior bem do meu negócio, Você, Sua Excelência o Consumidor, é tarefa a que me imponho quando rabisco minhas crônicas; fumaças que pretendem ser a parte intangível, uma extensão de valor dos serviços que agrego aos puros que lhe encantam e que, ao contrário das fumaças desses, nem sempre se evolam em azuladas espirais.

Luto conscientemente contra a entropia (perdoe-me o palavrão) – a tendência natural de erosão da sensibilidade e da atenção – neste meu relacionamento consigo. E me alegro quando acolho seus pedidos ou queixas, comentários, observações, sejam quais forem, pois são o termômetro que revela que nossa relação está em alta.

No momento em que redijo esta crônica, numa vila de pescadores, vejo-os passarem com seus caniços e me dou conta que quando uma pessoa vai comprar uma vara de pesca, na realidade ela está mesmo é querendo pescar; quando alguém vai comprar uma broca, no fundo, está necessitando de um furo. Produtos são meios para satisfazer necessidades. Em si, nada valem. A fábrica produz charutos, mas eu lhe entrego prazeres e satisfação, aquilo que na verdade, Você me encomenda.

Charutos por charutos Você encontra em muitos lugares mas, charutos do Hugo, lá da Bahia, Você só encontra em minhas mãos. Por isso, pelo privilégio de Você me fazer o aposto qualificativo dos seus prazeres, me envaideço, gosto de Você e sei que a recíproca é verdadeira.

É claro que luto com dificuldades para manter acesa a chama de seus puros e a de nosso relacionamento. A regra ensina que o sucesso na expansão do negócio, na medida em que ilustramos clientes acerca de nosso produtos, mais vulnerável nos tornamos em perde-los.

Quando o auxílio que converteu um cliente potencial num cliente efetivo não mais se faz necessário, ele se sente à vontade para buscar outras fontes às quais atribui mais valor que o auxílio. É aí que, muitas vezes, surge o fator preço.

Há, sem dúvida, muitas opções para adquirir puros. Se Você rodar, procurar, pechinchar, vai acabar encontrando-os a preços iguais aos meus e, até, mais baratos. Nesta hipótese, cuidado para Você não acabar entrando na armadilha dos genéricos. Os charutos Alonso Menendez ou Dona Flor,  à luz das fontes onde Você os encontra, podem ser considerados como produtos genéricos mas, deixam de sê-lo sob a ótica da forma como são estocados, dos meios que chegam às suas mãos e de como a chama acesa se mantém.

O bom senso revela que todos nós usamos as aparências para julgar a realidade. Somos dependentes, até certo ponto, das impressões externas, das imagens, daquilo que imaginamos. Por isso quem lhe oferece um puro  entra sempre em julgamento e ambos se tornam, inevitavelmente, um só produto.

E, assim como a Bahia tem um jeito que nenhuma terra tem,  os charutos do Hugo, lá da Bahia, se esforçam para ter um charme que nenhum charuto tem.

Na próxima crônica prometo tratar menos de fumarketing. Deixarei de lado as mercadológicas aflições cotidianas tipo Você estará lendo minhas Fumaças? E, se está lendo, estará apreciando? E, se está apreciando, estará consumindo? E, mesmo que não esteja consumindo, por que não me telefona ou não me manda um e-mail?


045.    MARCHAND DE PRAZERES

Numa de minhas fumaças passadas aludi quanto ao folclore de se imaginar o fabrico de charutos, sobre roliças coxas baianas cor de canela, nas quais o doce tabaco, suavemente, seria enrolado.

E não é que agora, na sua novela das oito, Porto dos Milagres, a Vênus Platinada desnuda o mistério, para encanto dos fumadores que nunca estiveram numa fábrica? Quem teve oportunidade de assistir o capítulo no qual se mostravam cenas de uma manufatura de puros, deve ter se deliciado ao acender seu charuto seguinte. Eu mesmo, o confesso sem pejo, me deleitei com as tomadas da indiscreta câmera e fiquei com um gosto de quero mais a misturar-se com os gostos e os aromas do Robusto que me apressei em acender.

Dia seguinte, passada a sensação, ficou a doce lembrança de quanto seria bom se aquilo tudo fosse verdade. Rodei a fábrica de cima para baixo, e lá estavam as charuteiras na sua azáfama diária, enrolando nossos puros, gentilmente como deve ser, mas sobre a dura prancha de madeira sem a qual charuto nenhum pode ter sua capa bem estirada. Nada da beleza cosmética global mas muito, muito mesmo, da graça e da leveza de um dos mais autênticos artesanatos baianos. Arte que não me canso de apreciar todos os dias, e sobre a qual, quase sempre, versam minhas enfumaçadas crônicas.

Alguns amigos, tendo assistido o capítulo novelesco, me indagaram do local onde a filmagem fora realizada. Esclareci que cenas foram gravadas no interior da fábrica de charutos Dannemamm, na cidade de São Félix, empresa que funciona no prédio que abriga o Centro Cultural, de igual nome, no qual são realizadas as Bienais do Recôncavo. Mas, caríssimo leitor, não se apresse em pensar que lá, os puros sejam produzidos de forma distinta. Lá (São Félix), assim como cá (São Gonçalo dos Campos), bem como acolá (Alagoinhas ou Cruz das Almas) os segredos do fabrico de charutos são os mesmos: não ter segredos. Quando Você percorre a manufatura a tudo assiste de forma transparente e cristalina. Mãos de fadas, primeiro misturando os fumos, depois ocupadas com o ato de envolver as ligas com o capote, a seguir a prensagem seguida do capeamento, pouco mais adiante o controle dos padrões cromáticos, e olhando mais em frente, lá estão elas, as mãos de fadas novamente, nos setores do anelamento e da embalagem. Tudo manual como compete a autênticos hand-mades de personalidade própria. Produzidos para quem sabe diferenciar entre o original e a reprodução de uma obra de arte.

Eu que lido com tais originais, acabei me transformando num marchand de prazeres por haver eleito apregoar as maravilhas do que, no ramo, há de melhor no mercado nacional. Refiro-me aos Alonso Menendez e aos Dona Flor, seus velhos conhecidos e que quanto mais velhos ficam, assim como alguns vinhos, melhor sabem aos paladares apurados.

Até nosso próximo bate-papo.


044.    BAFORADAS PROIBIDAS

A tranqüilidade da vida no interior tem um astral que induz a uma paz interior difícil de encontrar quando, por força das circunstâncias, vivemos nos grandes centros. Mas não pense Você que, por se viver no interior, fica-se infenso a tudo quanto acontece no mundo e que perturba nossa tranqüilidade. 

Há pouquíssimos dias, a legislação antifumo brasileira avançou no sentido de restringir, mais ainda, o uso e a propaganda dos produtos fumígeros. Não se surpreenda com o adjetivo pois é tudo quanto faz fumaça (mesmo se não for um derivado do tabaco) que foi considerado na Lei 10.167 de 27/12/00 que deu nova redação a alguns, e introduziu outros, artigos na Lei 9.294 de 15/07/96. Está ficando difícil a gente baforar e temo que as minhas, assim como a fumaça de nossa famosa esquadrilha aérea, sejam também execradas. Restringiu-se a propaganda comercial a “pôsteres, painéis e cartazes, na parte interna dos locais de venda”. Proibiu-se o “emprego de imperativos que induzam diretamente ao consumo”. Desde 96, já era proibido fumar-se em “recintos coletivos, privados ou públicos¨”. Vedou-se definitivamente o fumo nas aeronaves. Os fabricantes não mais podem distribuir qualquer tipo de amostra ou brinde. A “propaganda por meio eletrônico, inclusive internet” foi proibida. Entraram na dança a “realização de visitas promocionais em estabelecimentos de ensino ou locais públicos; o patrocínio de atividades culturais ou esportivas” e, até, o merchandising. Ator de televisão fumando charuto vai acabar tendo que provar que os fuma por exigência do papel e não por se tratar de propaganda comercial indireta. Para o patrocínio das atividades culturais ou desportivas deu-se um tempinho até 1º de janeiro de 2003. Para o restante a lei entrou em vigor agora, em 28 de dezembro de 2002.

Recomendações explícitas de consumo, associação com idéias ou imagens de êxito, virilidade ou bem-estar, vinculação com celebrações cívicas ou religiosas, e outras coisas mais, foram banidas. Os textos ficarão pois, doravante, bem mais enxutos. Adjetivos de atração? Será prudente evita-los.

É lógico que a literatura especializada não foi proibida e irá continuar pois à mesma, apenas terão acesso as pessoas que, realmente, o desejarem. E por isso, é óbvio que também iremos continuar mantendo nosso habitual bate-papo sobre a manufatura de puros.

A revitalização do mercado nacional tem feito crescer, de forma acentuada, o número de pessoas que escrevem sobre o tabaco. Assim é que, no ano recém findo, duas novas publicações, ambas excelentes diga-se de passagem, começaram a circular. Refiro-me às revistas Charuto & Cia e Arte & Tabaco. Sendo um dos escribas antigos sobre a matéria, compenso os desprazeres legais restritivos com a satisfação em registrar auspiciosos lançamentos e, ao mesmo tempo, fazer um mea-culpa.

Estando no ramo desde 1976, com o privilégio de haver sido dirigente das maiores fábricas brasileiras de puros, tenho, em função disso, acompanhado bem de perto, a oscilação do mercado charuteiro, e anos atrás, supunha que, na data presente, nada restaria da indústria do ramo. Em parte não errara em minhas premonições. A gigante Suerdieck, não resistiu. Encerrou suas atividades, há um ano, e seus bens remanescentes vêm sendo leiloados para quitar passivos. Mas, esquecera-me que sendo a vida um eterno renascer, se vão uns para que outros ocupem seus espaços. Assim é que surgiram novas empresas baianas. A Chaba, Charutos da Bahia Ltda., na cidade de Alagoinhas, a Manufatura Tabaqueira Le Cigar Ltda., em Cruz das Almas, que estão envidado esforços com a líder nacional do segmento, a Menendez & Amerino, para que se mantenha viva a velha tradição de se produzirem puros de qualidade no Brasil.

De minha parte pretendo dar prosseguimento ao trabalho,  do qual não irei falar se não vão acabar dizendo que estou fazendo propaganda de charutos. Não sou propagandista. Sou, sim, defensor de uma atividade secular.

Minhas crônicas continuarão sendo publicadas.

Todos almejam preços justos, atendimento personalizado, experiência no metier, especialização na atividade, garantia de qualidade e procedência, estoques sempre renovados, informações permanentes, velocidade no processo e isso o Amigo sabe, melhor do que ninguém, onde encontrar.

Longe de mim a pretensão de ser seu único informante pois sei da competência e dos conhecimentos de muitos que labutam nas tabacarias e fábricas nacionais. Quero apenas, se não conseguir ser o melhor, estar entre os melhores e os mais competentes.

A verdadeira diferença não se faz numa única oportunidade. Ela se materializa através do tempo. Que o digam os incontáveis Amigos que, há anos, seguem minhas recomendações e se comprazem com minhas fumaças.


043.    FORMATOS

Hoje vou falar um pouco sobre as diversas formas construtivas dos charutos. É claro que não pretendo esgotar o assunto nestes rabiscos mas, apenas, mostrar, algo sobre a essência classificatória dos bitolários detendo-me, principalmente, nos formatos de corpo reto, que são os predominantes.

Nos primórdios da organização empresarial charuteira, os puros ditos do mesmo tipo, como os Churchills p. ex. , tinham todos um tamanho standard. Agora não. Hoje em dia, o comprimento de um Churchill poderá variar de 170 a 204 mm e tal flexibilidade se estende a todas as bitolas.

Não havendo, pois, uniformidade entre nomes e medidas, é melhor analisarmos os formatos genéricos, independente dos nomes que lhes sejam dados pelos fabricantes.

Além dos diferenciais comprimento e diâmetro, há dois tipos básicos de bitolas: os cilíndricos, de corpo reto, e os figurados, de formas irregulares. Há algumas décadas estes últimos tinham marcante presença na linha de produção das fábricas, sendo depois superados pelos puros retos. No momento nota-se uma certa tendência de volta ao passado com o mercado demandando puros figurados os quais, vias de regra, apresentam preços mais elevados, dados à maior dificuldade em sua confecção.

Os principais charutos cilíndricos ou retos se resumem nas categorias genéricas abaixo relacionadas.

Coronas: Bitola tradicional cujo comprimento médio oscila de 140 a 152 mm, por um diâmetro em torno de 17 ou 18 mm e que permite uma fumada ao redor de 45 minutos. São considerados Coronas, o Dona Flor de mesmo nome e o Alonso Menendez Nº 20.

Coronas Gordas: Os Coronas, quando em diâmetros acima de 18 mm, assumem essa denominação. Em nossa linha dispomos dos Alonso Menendez Especiales #2.

Churchills: Com dimensões mínimas de 178 x 18,2 mm são puros consistentes e com o caráter de quem lhes deu o nome. São Churchills o nosso Dona Flor assim chamado, o Alonso Menendez # 8-9-8 bem como nossos Brasil 500 Anos.

Double Coronas: Partem da idéia de quanto mais, melhor. São charutos para iniciados, medindo 190 mm, ou mais, de comprimento, por um diâmetro ao redor de 20 mm, tais como o Alonso Menendez Especiales #1 e o Dona Flor Double Corona.

Petit Coronas: Tal como o nome indica, trata-se de um puro pequeno de até 140 mm, para fumadas mais rápidas. Em nossa linha, temos nessa bitola, os El Pátio Nº 4.

Lonsdales: Charutos com diâmetro ao redor de 17 mm e comprimento a partir de 165 mm. Trata-se de bitola de grande aceitação no mercado, destacando-se em nossa linha, os Alonso Menendez Nº 10.

Robustos: Curtos e de grosso calibre estes charutos têm se transformado em indiscutível preferência mundial. De aspiração excelente e grande caráter, aos poucos, vêm assumindo a liderança das vendas. Destacam-se, em nossa linha, os Alonso Menendez e os Dona Flor, ambos adjetivados por Robustos.


042.    BAIANIDADE

Donde provém a conhecidíssima indagação o que é que a Bahia tem?

Se as razões estão numa colonização múltipla, as conseqüências da baianidade estão espalhadas por todos os lados. Uma mescla que faz da Bahia, para muitos, a maior referência cultural do Brasil, dentro e fora do território nacional. A resposta à indagação do poeta, implica numa infinidade de possibilidades, não só com relação à origem mas, principalmente, à constituição da nação baiana.

A amabilidade, a hospitalidade, características da baianidade, não escondem, entretanto, conflitos que não foram apagados com o fim da escravidão ou com a miscigenação de raças.

A baianidade é uma ideologia das elites do Recôncavo, de Salvador e de algumas cidades fora do sertão e do semi-árido. A rigor essa associação de baianidade com gentileza, cordialidade, é uma descrição dela própria, camuflando a pobreza e o índice de analfabetismo que, na Bahia, é próximo aos piores do Brasil.

Mas, seja como for, análises sociológicas à parte, a verdade é que a Bahia tem um jeito que nenhuma terra tem.

E dentro de tal característica está o fato de, somente ela, saber produzir charutos de qualidade apreciada no mundo inteiro. Puros que, por sua altíssima nobreza, rivalizam com as melhores regalias mundiais. Assim são os charutos Alonso Menendez e Dona Flor.

 Os charutos da Bahia têm um sabor que os de nenhuma terra tem!


041.    PUROS PRAZERES

Charutos são puros prazeres.

Degustá-los é um sinal de abertura: o fumador desfruta, compartilhando sua volúpia. O aficionado é um benévolo por natureza vez que se compraz em compartir sua paixão. Quantas e quantas vezes Você, ao oferecer um de seus charutos a um neófito, foi recusado? O ignorante persevera na sua santa ignorância. Preserva-se de aprender a evadir-se, inefavelmente, dos sem sabores da vida. E, quantas vezes Você, ante a prova da imperfeição humana, voltou a guardar seu puro, às vezes até com certo alívio de recuperar aquilo que havia oferecido com o coração?

Os quatro elementos: a terra, o ar, a água e o fogo, são os únicos que intervém na feitura e na apoteose de um puro. Por isso ele é natural, homogêneo e coerente: tabaco dentro de tabaco e nada mais do que tabaco. Os puros autênticos nada têm a ver com máquinas. E, não há charuto sem carinho.

Os puros antes de irem para sua embalagem final, são cuidadosamente guardados para se recuperarem sem pressa, das agressões (manejos) que padecem para atingirem a perfeição: o estiramento das capas, a torcida do filler, a compressão da prensagem, a umidificação necessária para dar-lhes forma sem rompe-los. E nada há que se iguale à placidez de uma fábrica de charutos à mão. Quem já teve a oportunidade de conhecer uma, não esquece.

Para bem se aproveitarem os prazeres dos puros necessita-se de tempo. O tempo sem relógios que nos leva às reflexões. Não se exige seja chegada a noite para desfrutá-los, pois também caem, e muito bem, após as refeições. Desde que essas não tenham sido, é claro, um Mc Donald’s da vida.

Isso posto eles também exigem um entorno propício pois um certo silêncio pacificador é elemento essencial. E não há nunca que se transgredirem as três regrinhas de ouro: um ambiente protegido, corpo relaxado e estacionário e não se tragar a fumaça. O fumador de classe devolve o fumo ao ar e conserva o seu sabor.


040.    A ÁRVORE DOS MEUS AMIGOS

Amigo Hugo,

Raramente encontramos alguém que goste tanto do que faz como você, e que o faça tão bem. Sua gentileza e disponibilidade, sua maneira de escrever o "Fumaça Mágica", demonstram claramente o carinho que você dispensa aos seus charutos e aos seus clientes, de forma muito sincera e espontânea. Seus textos transmitem, com talento e poesia, o enlevo que o ato de fumar um puro pode proporcionar, além de conterem informações e ensinamentos preciosos. Foi muito bom ter tido a oportunidade de conhecer você, e até já me sinto um amigo. Não deixe de escrever o "Fumaça Mágica" e enviá-lo aos confrades.

Um abraço do PAULO WEIRICH (Caxias do Sul, RS)

Outro dia me chegou às mãos um artigo de autor desconhecido, intitulado A árvore dos meus amigos. Ao degustar meu predileto Alonso Menendez Robusto evoquei a essência do referido texto o que, associado à gentil mensagem acima, me induziu a escrever sobre meus amigos.

Talvez as folhas de um pé de fumo caracterizem cada um deles. E, permita-me, utilizarei a terminologia cubana nestes rabiscos. Assim tentarei associar ao prazer de ler, o de propagar conhecimentos sobre as características da matéria prima do produto que nos une.

As folhas de um pé de fumo simbolizam meus amigos. Algumas, as sempre mais próximas das raízes, representam os recém chegados. Com o passar do tempo aprendemos a conhecer toda a família de folhas, sem o que não conseguiremos bem viver, nem produzir bons charutos. Cada folha, assim como cada pessoa que passa em nossa vida, é única. Mesmo que ela, porventura, se desprenda do pé e caia, continuará alimentando nossa raiz. Será uma agradável lembrança dos momentos nos quais dividíamos nossas alegrias. Nesse caso se situam muitos dos meus clientes que já me privilegiaram com suas preferências e que, agora, por uma ou outra razão, optaram por se valerem de serviços de outro fornecedor de puros.

Mas as folhas que caem são poucas. A grande maioria se mantém firmemente ligada ao caule, nutrindo-se da seiva representada pelas Fumaças minhas e pelas fumaças dos puros que faço chegar às suas mãos. Você sabe do que estou falando. E, ao eu discorrer sobre as ditas, saberá identificar-se.  

Poderá estar entre as folhas mais próximas das raízes (libre-pie), entre as duas outras acima do libre pie, conhecidas como uno y medio, ou estará um pouquinho mais acima, nas folhas chamadas centro fino e centro alto, ou ainda, estar identificado entre as folhas do ápice, conhecidas como coronas, aqueles que, com fidelidade ímpar, prestigiam meu trabalho.

039.    CONSULTAS

Consultas sobre nossos charutos e tudo o mais que esteja relacionado com a guarda e a degustação de puros são bastante freqüentes.

Ditas consultas revelam a preocupação em se desfrutar ao máximo o que é que a baiana tem, denotam o carinho dispensado para com nosso negócio e confirmam que fumar charutos é uma arte.

E como arte que é, nem sempre há unanimidade de pontos de vista acerca de determinados aspectos. Muitos dos limites da arte em questão são condicionados por vivências pessoais ligadas aos sentidos e o que, para um possa parecer válido, para outro pode ser irrelevante ou passar desapercebido.

Tenho em minha mesa de trabalho duas consultas e, valendo-me deste meio para elucidá-las, creio assim estar colaborando com similares questionamentos que, porventura, estejam nas mentes ou paladares de outros tantos fumadores de nossos puros.

Uma delas se refere ao padrão gustativo de nossos Alonso Menendez. Vem da cidade de Barueri-SP e revela que o cliente é dono de apuradíssimo paladar. Observa ele, um apreciador da bitola Robustos, que as edições mais recentes destes charutos, estariam mais “pesadas” e indaga a razão.

Tentarei esclarecer de forma sucinta. Os fumos Brasil/Bahia usados no filler são uma liga de tipos procedentes de duas regiões, conhecidas como Mata Fina e Mata Norte. Esta liga, sempre que sofre variações na sua relação percentual, afeta discretamente o paladar. Foi o que aconteceu. Com o crescimento das vendas e a escassez do fumo tipo Mata Fina, efetuou-se um ajuste no balanço do filler aumentando-se a participação do tipo Mata Norte, fumo de mais caráter, resultando gustativamente, num charuto de maior punch. A equação retornará tão logo os fumos da nova safra, ora em processamento, estejam em condições de uso.

A outra consulta é quádrupla. Procede de Curitiba-PR. Qual o charuto mais recomendado para obsequiar um grande amigo? Se não for iniciado não o afugente com um Especiales #1 ou um Robusto. Fique com o Número 20. Onde encontrar guilhotinas e bolsas telescópicas para portar charutos? Em tabacarias especializadas dos grandes centros pois eu, infelizmente, não trabalho com acessórios. De que são as embalagens de 3 unidades dos El Pátio #4? São caixinhas de papelão com 3 charutos celofanadas individualmente, comercializadas em lotes de 10 carteiras. Por qual motivo não mais se usam lâminas de cedro para revestir charutos: custo ou perigo de contaminação do aroma do puro com a madeira? Trata-se de sofisticação que, com o passar do tempo, foi abandonada pelos fabricantes, por questões de custos. A prática não prejudica a qualidade gustativa. Pessoalmente penso até que a aperfeiçoa.


038.    FLAUTA

João Alex Monteiro Catan, de Campo Grande no Mato Grosso do Sul, um dos meus diletos clientes e amigos, outro dia estava preocupado com o fato de haver encontrado dois charutos furados, dentro do umidificador no qual, como manda o figurino, guarda suas apreciadas regalias. Meu charuto está furado, e aí? o que faço? Com tais indagações sugeriu-me escrevesse algo a respeito.

Vamos lá.

Você que acompanha meus comentários recorda, que todos os charutos de Menendez & Amerino passam por um processo de congelamento prévio que esteriliza os eventuais ovos da lasioderma (o famoso “bichinho do fumo”) cujo habitat natural é o tabaco. Acontece que, eventualmente, no tempo que decorre entre o momento no qual os charutos foram embalados e o em que seguiram para a unidade de congelamento, o ovo eclodiu e o “bichinho” procurando uma saída, furou o puro. Isso é raro pois via de regra, uma vez embalados, os charutos seguem logo para o congelamento. Problemas eventuais e aleatórios podem fazer com que o prazo se dilate, dando tempo a que a lasioderma atue. É raro mas pode acontecer. Mas fique tranqüilo que, mesmo estando seu charuto furado, não haverá o menor risco de contaminação dos demais charutos, estejam eles na embalagem original, estejam eles no seu umidificador. O “bichinho” já morreu. Tal consolo, sei, não resolve o fato de haver pago o justo preço pelo apreciado charuto. Então me telefone apontando o problema.

Você estará contribuindo para o aperfeiçoamento de nossa qualidade e será, merecidamente compensado. Afora disso, ante a dúvida, se poderá degustar o puro furado, afirmo que sim. De duas formas.

A mais paciente delas, como se fosse uma flauta, tapando com um dos dedos o orifício encontrado, no momento da aspiração. A outra, mais cômoda, retirando um pedaço da capa no pé do charuto, e com a dita e mesmo com saliva, obstruindo o orifício.

Problema resolvido! Boas fumaças!


037.    GRANDE ALEGRIA

A onda anti-tabagista dirigida de forma particular contra os cigarros, não deixa de ter reflexos e dar respingos na arte e no prazer de fumar. A par disso, as mudanças nos hábitos do cotidiano, as grandes cidades, os ambientes fechados, as horas perdidas na locomoção casa-trabalho-casa roubam, do homem presente, minutos preciosos e o confinam em espaços onde fumar é quase impossível.

Sou pai novo-velho e explico o contra-senso. Novo porque tenho um filho com menos de dois anos, estando às vésperas de outro. Velho porque beirando o portal dos 60 anos, tenho me detido sobre a obrigatória exibição do informe que não se deve fumar na presença de crianças, posto que as mesmas imitariam o exemplo.

Ora bolas! Minha experiência nega isso. Além do citado pequeno infante, tenho mais 8 filhos (eu disse oito), na faixa etária dos 18 aos 40 anos e nenhum fuma! Minto. Um dos ditos, fuma charutos de caju em caju. (Você, por acaso, sabia que o termo caju, em linguagem indígena, significa ano?). Mas, mesmo sem fumar, eles adoram o cheiroso aroma dos charutos do pai.

Tenho o hábito de findo o puro, jogá-lo entre as plantas do jardim da casa. A mulher reclama. Mulheres adoram reclamar. Digo que é adubo.

Outro dia, o caçula recolheu um de tais puros abandonados e nos apareceu com o dito enfiado na boca, exclamando: Papai! Papai!

Grande alegria. Quem sabe esse, um dia descubra, como Você e eu descobrimos, que fumar puros não é um vício. É um prazer.


036.    FEITOS NAS COXAS

Dentre as muitas lendas que circulam no mundo charuteiro uma há, das mais difundidas, segundo a qual, os charutos são feitos nas coxas. É mais ou menos como aquela história, que mistura mesa e cama, de sempre perguntarem se a mulher baiana é mais apimentada. Coisas do público masculino.

Tais crenças nutridas, com um certo charme turístico não têm, como é óbvio, o menor fundamento.

No que se refere à pimenta não sendo, essa, minha especialidade, não posso nem devo discorrer, deixando o assunto para iniciados em culinária e outros misteres. Ou mistérios.

Já no que tange aos puros, estando mergulhado neles do fabrico ao consumo, há mais de duas décadas, sinto-me à vontade para afirmar que, eventualmente no passado, alguns charutos poderiam ter sido feitos sobre as coxas.

Negócio seguinte. Nos grandes armazéns que recebiam (e ainda recebem), o fumo vindo do campo para o processo de beneficiamento, era hábito as mulheres trabalharem sentadas no chão, separando e espalmando as folhas de tabaco. Uma ou outra delas, a pedido das chefias, preparava charutos mais ou menos rudimentares, para a devida degustação dos fumos da safra em processamento. E, como é óbvio, não dispondo de mesas, dado à forma como trabalhavam, sobrepunham uma tábua às pernas e sobre aquela, enrolavam os charutos para testes. Daí à afirmativa dos charutos serem feitos nas coxas, foi um passo.

Portanto, quando Você estiver se comprazendo com seu Alonso Menendez ou com o novíssimo Dona Flor, e alguém lhe perguntar se “ele é um dos bons, daqueles feitos nas coxas”, sorria, discreta e indulgentemente, dizendo que sim. Deixe o seu interlocutor, por certo um não iniciado, ficar imaginando como um objeto cilíndrico possa ser produzido sobre formas arredondadas. Assim como ele, se nunca veio à Bahia, sonha com a pimenta da mulher baiana.

Afinal, e isso é muito bom, um pouco de mistério não faz mal a ninguém.


035.    MANIAS

Duas manias tenho na vida: tomar meu chimarrão e fumar meus charutos. A primeira delas, gaúcha por excelência, se mantém apesar de estar longe dos “pagos” há 35 anos. A segunda, adquirida na Bahia lá se vão 22 anos, nos finais de tarde, completa a primeira de forma indescritível.

São sabores e sensações gustativas e olfativas que, alegremente, se misturam enquanto me deleito em estar escrevendo a meus Amigos. Como agora, quando sai do prelo mais uma Fumaça Mágica.

Sou réu confesso: quantas e quantas vezes passam-se as horas do jantar, dos jornais nacionais e das terras nostras da vida, me deixando estar aqui, à frente do computador, mãos multiplamente ocupadas, cabeça a mil, meu Alonso “pendurado” na boca volta e meia sendo reaceso (por que não?), cinzas despencando por sobre o teclado, a mulher reclamando que a comida está na mesa, já vou, já vou, já vou...

Mas me deixe antes exaurir meu charuto e tomar meu “mate” enquanto a água não esfria.

Para que a pressa? As coisas boas da vida foram feitas para serem aproveitadas à exaustão.

Por isso, se Você não tiver tempo suficiente para “viver” o seu charuto, não o acenda. Deixe-o descansando, no aguardo do momento apropriado. Seu charuto não irá se incomodar consigo. Muito ao contrário, ser-lhe-á grato por saber que Você o merece.

Não fume por fumar, fume por prazer.

Até nosso próximo encontro! E, boas fumaças para Você.


034.    PRAZER INDULGENTE

Revendo papéis, localizei entre as mensagens recebidas da parte de amigos apreciadores de puros, um e-mail reproduzido a seguir, de forma condensada. Dita mensagem, pela natureza de seu conteúdo, retrata com especial competência, muito daquilo que Você que me lê, também pensa e sente.

Vamos, pois a ela.

“Querido Hugo Carvalho,

Após o recebimento da Fumaça Mágica 31 parei para analisar minha "trajetória" como apreciador dos puros.

Sou consumidor há aproximadamente 8 anos e, como não poderia deixar de ser, bailei entre as diversas marcas e bitolas do mercado até que, por indicação de meu abençoado amigo Marcelo Ferreira, descobri os Alonsos e você, hoje um de meus diletos amigos, mesmo à distância.

Falando de nossos produtos nacionais, posso dizer com firmeza que, sem sombra de dúvidas, o Alonso Menendez se encontra num patamar muito distante de todos os que tive o prazer (e, muitas vezes, o desprazer) de experimentar.

Sobre os tão falados e cantados, em prosa e verso, cubanos, meu comentário se reduz a dizer que há no mundo, em todos os setores, pessoas e empresas que vivem em função de seus nomes e marcas, conquistados em épocas anteriores, nas quais não havia opções de escolha, sendo importante ressaltar que não deram continuidade ao compromisso com a qualidade que um dia teriam possuído. Logicamente não quero generalizar, até porque gosto não se discute.

Coloco-me então na categoria daqueles que se tornaram habituais em consumo de um só tipo de puro. Como você bem sabe, quando faço meus pedidos não existe a necessidade de citar qual o tipo de puro a ser enviado. O faço somente para firmeza e tranqüilidade minhas pois, quando envio meu pedido, já estou em processo inicial de angústia pela possibilidade de ficar sem meus queridos Alonso Robustos.

Tal escolha foi fruto de experimentos com charutos apertados demais, rápidos demais, lentos demais, fortes demais, fracos demais, ou seja, tudo mais ou menos do que eu gostaria que fosse.

Todos os meus amigos sabem que eu fumo Alonso Menendez, que é um charuto baiano e que é de procedência excepcional, me proporcionando, assim como aos meus "associados" ocasionais, prazeres inomináveis.

Se me perguntarem qual presente eu não gostaria de ganhar, direi que é uma caixa de charutos, pois gosto de comprar meus puros de suas mãos em função do rigoroso processo de escolha, sem falar que você já conhece minhas preferências e manias.

Hoje, já sei por quanto tempo terei a companhia de meu Robusto, se ele está um pouco apertado, se está queimando de forma desigual, "esfarelando" demais, ou seja, achei a medida de meu prazer.

Acho que escrevi demais por hoje.

Abraços do amigo e fiel parceiro. RUBENS TINOCO”.


033.    FUMOS PARA CHARUTOS

Muitos aficionados não têm conhecimento dos cuidados e tempo necessários para que uma folha de tabaco esteja em condições de se transformar num inefável puro. Imaginam que, colhida a planta, prontamente dispõe-se da matéria prima apta ao fabrico. Ledo engano. Do plantio, passando pelos tratos culturais e a colheita, até as folhas do fumo para charutos chegarem ao ponto certo para seu uso, transcorre grande espaço de tempo, onde há significativa incorporação de mão de obra nos processos relativos à indispensável e importantíssima fase do beneficiamento.

Menendez & Amerino, para o filler e os capotes de seus charutos, emprega fumos plantados na Bahia, conhecidos mundialmente como Brasil/Bahia, adquirindo-os junto a lavradores do Recôncavo Baiano. A unidade de compra de tais tabacos é a arroba e os mesmos são adquiridos brutos, em grupos de folhas amarradas chamados de “manocas”. Os fumos quando chegam do campo foram apenas secos, não estando fermentados, nem classificados. Após os fumos serem adquiridos dos lavradores, o processo se inicia com uma verificação das “manocas” classificando-as em quatro tipos básicos, denominados, em ordem decrescente de qualidade e de tamanhos, por “altos”, “baixos”, “trintinha” e “refugos”. Ao consumo da companhia apenas interessam os tipos mais nobres (altos e baixos) os quais serão beneficiados para se obterem os capotes, as capas escuras e os fillers. Todavia a empresa não pode se dar ao luxo de ficar somente com os tipos que lhe interessam, negociando sempre os lotes globais e pagando preços diferenciados de acordo com a estrutura percentual dos tipos básicos encontrados. É patente que a companhia opta por comprar fumos de lavradores que apresentem os menores índices dos tipos não desejados. Em geral, embora isso possa variar de safra para safra, os fumos Brasil/Bahia apresentam um percentual de 40% para de “altos”, outros 40% de “baixos” e algo ao redor de 20% para os demais tipos inferiores.

Quanto mais cedo a empresa inicia suas compras junto aos lavradores tanto maior a oferta de fumos “altos” (correspondentes às plantas-mãe) e maior, portanto, a possibilidade de se obter um mix dos tipos que atendam aos objetivos de produção de charutos long-filler. No momento das compras a companhia deve, pois, dispor de recursos financeiros suficientes para adquirir o volume previsto para seu consumo e para suas exportações do ano seguinte. Se errar em suas previsões ou se as vendas crescerem acima do esperado, certamente irá faltar fumos para atender a demanda.

Uma vez adquiridos os tabacos no volume pré determinado, se inicia o processo de beneficiamento, o qual demanda um espaço de tempo de 6 a 7 meses.

Os fumos, já separados nos tipos antes referidos, são revisados e empilhados (“camas”) quando, com pressão e umidade controladas, irão ser fermentados. Esta fase, importantíssima para qualquer tabaco para charutos, requer a supervisão de técnicos profundos conhecedores do ramo. Tanto que, a depender do beneficiamento, uma safra de qualidade insatisfatória poderá resultar em bons fumos para charutos e, por outro lado, uma safra ótima, se for mal beneficiada, irá comprometer a qualidade dos tabacos respectivos.

Menendez & Amerino conta em seus quadros com um técnico cubano, Arturo Toraño, que tem toda a sua vida dedicada ao beneficiamento de fumos, por experiência e por ascendência. Da vivência deste técnico, bem como da complexidade e custos consumidos em beneficiar tabacos, falarei noutra oportunidade.


032.    AXÉ

A gente quando quer escapar do mundo, acende um charuto. Quando estamos em momentos de reflexão, ante caminhos de múltipla escolha e, ainda, quando pretendemos criar algo ou sermos nós mesmos, também damos candela a um puro.

Companheiro de todas as horas, silente ouvinte e confiante conselheiro, inspirador perfeito, acompanhado ou não, nos inebria e nos faz esquecer o mundo e tudo o mais quanto nos rodeia.

Que não nos interrompam quando, em auto-reconciliação, desfrutamos o enamorado apalpar deste inigualável objeto de prazer e aspiramos, indolentemente, sua etérea fumaça mágica.

Pecado mortal imperdoável.

Que ardam ardores dos que nos circundam.

Que se rompam horários impostos pelas circunstâncias.

Que clamem nossa atenção, docemente distante.

Que bradem do invasor aroma que revela nossa presença.

Que o mundo todo tema o bug.

Mas que não nos interrompam.

Deixem-nos a sós.

Na aparente solidão, incompreensível para os que não têm o privilégio de saber que um charuto tem princípio, meio e fim.

E que tal paixão, mesmo consumada, não se extingue.

Você, um dos integrantes de nossa confraria especialíssima, sabe do que estou falando.

E sabe também, tanto ou mais do que eu, que há momentos de meditação, tendo à mão sua bebida predileta, ouvindo sua canção preferida, apreciando a paisagem, olhando para nada, ou simplesmente nada fazendo, nos quais nosso velho amigo e companheiro é indispensável.

Por isso e para isso existem os Alonso Menendez.

Para aqueles que entendem que fumar um puro não é gesto mecânico, automatizado. É incorporar a si mesmo uma história, um modo de viver, uma opção, que não é o desprezar do que está acontecendo ao redor. Muito pelo contrário. É, pura e simplesmente, viver a vida com o que, depois daquela outra, é uma das melhores coisas que ela tem para nos oferecer.

Da próxima vez que o Amigo for acender seu Alonso Menendez, lembre-se disso.

E que ninguém lhe interrompa, reclame, azucrine ou brade exigindo sua valiosa atenção.

Muito axé para Você, amigo, cliente, irmão e camarada!


031.    VARIAÇÕES NO PRAZER

Os técnicos ligados ao ramo charuteiro, tanto da área de vendas, quando da esfera da produção, estão sempre a discutir sobre qual o melhor charuto e qual a melhor embalagem. Navega-se num mar de compreensíveis divergências de interesses, às vezes contraditórios, entre os que produzem e os que canalizam os puros às mãos dos consumidores. Num ponto porém todos estão de acordo. O melhor charuto é o que mais vende e com isso, creio que, sem dúvida alguma, o prezado leitor concorde. Por isso posso afirmar, sem pretensões ou veleidades, que os puros Alonso Menendez são os melhores charutos nacionais.

Não há quem desconheça a decisão do velho Ford de fabricar Modelos “T” de qualquer cor, desde que fosse a preta. Mas há, também, o consenso que embora qualidade não queira representar novidade, alguma novidade sempre contribui para a qualidade.

Quem afinal, respeitando-se as características de um produto como o charuto, que não tem pressa de inovações tecnológicas, não gosta de receber e saber de novidades? A busca de novidades está enraizada à curiosidade, característica inata ao ser humano. Por tal motivo é que os fabricantes, volta e meia, lançam novidades as quais em si mesmas não passam de variações sobre o único tema. Mas que, apesar disso, além de fazerem a alegria da confraria dos iniciados, favorecem e flexibilizam as vendas.

Há fumadores de puros, e ao afirmar isso não quero ultrapassar os limites da gentileza, que são ortodoxos, quase radicais. São de uma fidelidade ímpar. Elegem uma determinada bitola de nossos charutos Alonso Menendez e ponto final. Conheço algumas dezenas deles. Basta se identificarem e, prontamente, já sei que é para repetir a última encomenda. Maravilhosos clientes que fazem a alegria de qualquer homem de marketing. Para eles o mesmo charuto, na mesma bitola, dá sempre o mesmo prazer, a qualquer hora ou em qualquer companhia.

Mas, em compensação, há amantes da arte e do prazer de fumar, que gostam de variar. No gênero (marca) e no grau (bitola). Quando variam no gênero me sinto traído. Quando variam no grau, que nada mais é do que a intensidade em se desfrutar o puro, rejubilo-me. Eu mesmo devo confessar sem pejo, dou lá minhas variadas. Contumaz fumador de Robustos, passeio sempre pelos outros tamanhos.

Gosto de, no momento certo, apesar de serem muito parecidos entre si, optar entre um Robusto e um Especiales #2. E assim, igualmente, encontro ocasiões para os Número 10, os 8-9-8, os Especiales #1 e os Número #20. Não me indague as razões de tal comportamento. São variações no prazer.


030.    O QUE É QUE A BAIANA TEM?

Como já comentei em edição anterior, o mercado nacional de charutos encontra-se revigorado. A evolução das vendas da companhia Menendez & Amerino em 1999, comprova a assertiva. Cresceram em volume, no mercado doméstico, algo ao redor de 64% em relação ao ano anterior.

Alguns fatores contribuíram para tal resultado. Com a desvalorização do Real que retirou competitividade das regalias importadas, muitos consumidores brasileiros, recém ingressos na arte e no prazer de fumar, começaram a se aperceber que os charutos Alonso Menendez nada devem a uma enorme gama de charutos provenientes do Exterior, alguns de embalagens consideradas atraentes mas de qualidade duvidosa.

E muito do que foi conquistado se deve a pessoas como Você, distinto cliente, que não fuma embalagens dispensando-as, inclusive, o mais das vezes, e que sempre tem prestigiado nossas regalias e colaborado com suas críticas e comentários.

A companhia, por outro lado, e seus fiéis consumidores bem podem testemunhar, tem procurado retribuir, seja com a prática de preços competitivos, seja com o constante aprimoramento da mão de obra, seja com um quase impecável serviço de atendimento. E, além disso, promete novidades para o ano 2000.

Amorosa e carinhosamente, a baiana de São Gonçalo dos Campos pega cada uma das folhas de fumo plantado no Recôncavo Baiano e cada uma das outras importadas, para manufaturar os charutos Alonso Menendez.

No Brasil e mesmo no Exterior, nem todos os charutos são feitos à mão como os nossos. Mãos hábeis e sensíveis que trabalham desde os tratos culturais das plantas, pré-seleção das folhas, até chegar à escolha das mais nobres para a capa externa e o miolo. O engenho e a arte desta manufatura exige muito rigor. Tudo isso para assegurar que os charutos produzidos por Menendez & Amerino, atendam ao gosto dos mais exigentes consumidores, que poderão encontrar toda nossa família de puros nas melhores tabacarias do Brasil ou, simplesmente, ligando para mim.

“O que é que a baiana tem? pergunta Dorival Caymmi na sua conhecidíssima canção.

Tem muito mais do que ele canta com todo o dengo da Bahia. Tem também a habilidade e o esmero de manufaturar cada charuto nosso para Você acendê-lo e viver a vida bem vivida ou dissipar suas preocupações em nuvens de prazer.


029.    MÁRIO PORTUGAL

Há pessoas desconhecidas da maioria do público consumidor de puros, as quais no entretanto, são verdadeiros esteios da produção brasileira de charutos. Sem a participação destes quase anônimos artífices, a arte e o prazer de fumar os melhores puros nacionais, não seria o que é.

Nesta edição apresento um destes líderes da vanguarda charuteira. Em primeiro lugar escolhi, por todas e quaisquer razões elencáveis, Mário Amerino da Silva Portugal.

Mário, “Marreco” para os mais íntimos, é uma figura ímpar. O “Amerino” de seu nome integra a denominação social da Menendez Amerino & Cia. Ltda.

É meu amigo desde 1965 quando vim morar na Bahia. São, pois, 35 anos de conhecimento recíproco. E, baseado em tanto tempo, posso falar com a autoridade de quem bem o conhece e que com ele trabalha, desde então.

Seu pai, falecido em 1948, já era exportador de fumos para diversas partes do mundo. Assumiu a empresa exportadora, pois, já se lá vão mais de quarent’anos. Numa de suas incontáveis viagens à Europa, conheceu, nas Ilhas Canárias, Benjamin Menendez, exilado cubano, que lá estava a produzir puros na Companhia Insular Tabacalera. Descobriram um ideal comum: queriam produzir bons charutos no Brasil.

Mário Portugal, como já disse, descende de família tradicional proprietária de uma empresa de comercialização internacional de fumos. Benjamim Menendez, por sua feita, um dos herdeiros diretos de quem criou e produziu os famosíssimos charutos “Montecristo”, em Cuba. O baiano sempre sonhara em produzir charutos de qualidade. O cubano encantou-se ao encontrar na Bahia profundas similaridades com a pátria perdida.

Em 1977, unindo esforços, fundaram a Menendez Amerino & Cia Ltda. da qual tive a honra em participar, inicialmente como sócio e economista, depois como diretor, e hoje como consultor e agente de vendas na área do marketing direto para consumidores. Em fins de 1978, nasciam os charutos El Pátio. Era a consolidação de uma secular união: a grande novidade positiva no mercado charuteiro nacional dos últimos setenta anos.

Em 1980 começaram a ser produzidos os charutos Alonso Menendez, sendo que estes, desde então, apreciados e respeitados por quem os conhece, tornaram-se os líderes nacionais dos premium-cigars.

Mário Portugal foi, e continua sendo, o grande fiel da balança e, com seu otimismo ímpar, tem lutado contra todas as vicissitudes que têm assolado o mercado produtor nacional, como um todo. Mais de um milhão de dólares investiu na companhia, ao longo desses 23 anos. E continua perseguindo fórmulas de modernidade e de expansão dos negócios sociais..

Sem Mário Portugal, Você que aprecia excelentes charutos, por certo estaria sem alternativas onde o trinômio qualidade-preço-serviço, são a nota marcante no atendimento da inefável satisfação de degustar bons puros.

No ano 2000 pretendo continuar em sua companhia, quero continuar sendo o seu privilegiado fornecedor de puros e compartilhar consigo, Amigo que me acompanha e que comigo divide a alegria de fumá-los, os 366 dias que antecederão o século XXI. Para tanto continuarei me devotando, com redobrado empenho, em fazer chegar às suas mãos minhas mensagens, meus comentários, minhas considerações e meus esclarecimentos sobre este mercado altamente segmentado e sofisticado.

Para fumar-se bem não há que se fumar muito. Todos os exageros são perniciosos. Para fumar-se bem não há que se pagar muito. Os bons puros brasileiros nada ficam a dever às regalias importadas.

O fumo pacifica. Todos conhecem o significado do cachimbo da paz. E, como o fumo pacifica e acalma, nenhum melhor e mais silente momento há, do que o desfrutar-se a deliciosa e inspiradora companhia do nosso charuto preferido, amigo de todas as horas. Cuja fumaça se esvai, mas não desaparece. Magicamente entrecruza halos e elos, lá no topo da pirâmide em cuja base, felizes prisioneiros, nos encontramos.

A todos os meus amigos, e a Você em particular, meus mais sinceros agradecimentos, associados a meus melhores votos de um Natal pleno de alegrias e um 2000 duas mil vezes mais feliz que o mais feliz dos anos já vividos por Você.

Que os Charutos, Alegria dos Homens, sigam estando entre seus melhores amigos e companheiros. Para sempre.

028.    ALEGRIA DOS HOMENS

Estamos chegando a um novo ano, ano esse que trás consigo o simbolismo de completar um milênio. Ocasião rara para a maioria da humanidade, há que se aproveitar o excepcional momento para refletirmos sobre a importância dele participarmos. Em especial nós que apreciamos a arte secular, de se degustar puros. Iremos transportar para o novo milênio impressões e experiências que patenteiam que o homem, malgrado os avanços da ciência e da tecnologia, ainda se compraz com prazeres que as home-pages da vida não contemplam.

Abrir-se uma caixa de charutos, dedilharem-se os puros em busca da maciez, aspirar-se o aroma de mel do bom tabaco, escolher-se aquele charuto para o momento próprio, deliciar-se com a grande chama ao acendê-lo, aspirar até as profundezas d’alma os primeiros aromas desprendidos da combustão que se inicia, acompanhar a vida e a morte do tabaco queimando compacto, teimando em se manter preso ao corpo e que ao se desprender não cai reto deixando uma forma pontiaguda tal qual um lápis, inebriar-se nas azuladas fumaças espirais que ascendem ao alto, rodá-los entre os dedos, enamorar-se pelas cinzas plúmbeas, saber enfim que cada puro é um puro de individualidade própria o que nos torna mais individuais ainda. São prazeres que só os iniciados entendem e que, com indulgente benevolência, perdoam os que, reclamando, lhes invejam.

Como os homens, parecidos entre si, nunca iguais, são os charutos.

Você que, ao longo do ano 2000, será um dos especialíssimos mensageiros da arte e do prazer de fumar para o novo milênio, deve se dar conta da importância em participar dessa confraria. E, na virada do ano novo, acenderá e oferecerá a seus amigos, os charutos do seu agrado pessoal, simbolizando assim sua crença que, depois de uns poucos, degustarem-se charutos é um dos melhores prazeres da vida.

Eu, ligado por fraterna amizade a todos os que me privilegiam com suas preferências, assim também estarei procedendo.

E, Charutos, Alegria dos homens, das cinzas que se desprenderão dos puros que guardaremos com carinho para a virada do milênio, tenho certeza que, tal qual Fênix, renascerão esperanças de novos e importantes tempos para nós, testemunhas vivas da história, e que, como na corrida contra o tempo dos que conduzem o fogo pátrio, legaremos aos que nos sucederão, a acesa chama do savoir-faire e do savoir-vivre.


027.    PRECONCEITO CROMÁTICO

De há muito, tenho rascunhados alguns escritos sobre charutos de capas escuras, também conhecidos como “maduros”. Falemos deles, recapitulando antes, um pouco, o assunto “capas para charutos”.

Como todos sabem, os fumos empregados na parte externa dos “puros”, também denominados no ramo, fumos capeiros, além das múltiplas variedades genéticas e regionais, apresentam distintas características caso sejam plantados ao sol, ou sob telas.

Tais telas de cobertura visam reduzir e regularizar a incidência dos raios solares e, assim, conferir ao fumo, melhor textura e cores mais uniformes.

Veja, ilustre passageiro desta maravilhosa viagem pelo mundo dos charutos, falei de cores mais uniformes. E Você, naturalmente há de me indagar: afinal, o fumo da mesma semente, não tem sempre a mesma cor?.

Não. As cores de uma dada safra, de um mesmo pé de tabaco capeiro poderão variar, desde os tons esverdeados, até os tons marrons (colorados). Quando tratei do processo de produção de charutos, numa das Fumaças Mágicas passadas, esclareci que há um setor do controle de qualidade dos puros, que cuida em se selecionarem os mesmos, cromaticamente, de forma a se obterem lotes os mais uniformes possíveis, para comporem as unidades acondicionadas numa mesma caixa.

Sendo o tabaco produto que não sofre nenhuma ação química, após o processo de fermentação, resultam perceptíveis nuanças cromáticas. As primeiras folhas (da parte mais baixa) são mais sedosas e tendem ao tom esverdeado. Já as folhas superiores da planta, são menores, mais encorpadas e mais escuras.

Nos sistemas de plantio sofisticados, as folhas são colhidas em separado, de acordo com os cortes procedidos. Mesmo porque, o processo posterior de fermentação, deverá levar em conta, a “altura” em que as folhas se encontravam nos pés das plantas. Como é óbvio, mesmo para leigos, as folhas das partes superiores (mais encorpadas), não poderão ser submetidas ao mesmo processo de fermentação que as folhas inferiores (mais delicadas).

Portanto, já aí, temos uma diferenciação que, a depender da variedade genética, poderá resultar em cores “coloradas escuras” mesmo que os fumos tenham sido plantados protegidos sob telas para uniformização da luz solar.

Afora disso, há determinadas variedades, entre as quais se ressalta o fumo Brasil/Bahia, escuras por sua própria natureza, e que portanto, são plantadas ao sol. Tais tabacos, sempre de tons marrons acentuados, quando empregados para “capear”, resultam nos charutos “escuros” ou “maduros”. Tais puros, são tidos e havidos pela maioria dos consumidores, como charutos “fortes”. É fácil entender-se o pressuposto.

Temos a tendência ótica em traduzir cores claras, a partir da branca, como simbolizando leveza e cores escuras, a partir da preta, como sinalizando uma sensação de peso. Assim, quase que inconscientemente, transportamos tais preconceitos para os charutos. Ledo engano.

Há charutos “maduros” (capas escuras) – os alemães que o digam – mais “leves” que muitos charutos de capas claras.

Os consumidores brasileiros que apreciam produtos com menos punch, não têm grandes possibilidades de se aperceberam desta realidade, pois a oferta de charutos “maduros” é escassa.

Os fumos originais da Bahia, com destaque para os da região mundialmente conhecida como “Mata Fina” (justamente onde se localiza a fábrica Menendez & Amerino), são escuros, de excelente combustibilidade e sabor de leveza incomparável.

Se for este o produto que Você procura para satisfazer o seu prazer, vença o preconceito cromático. Da próxima feita em que encomendar seus Alonso Menendez preferidos, indague se não os tenho disponíveis, na versão “maduros” (produzidos, sob encomenda, para o mercado alemão).

A experiência, penso eu, valerá a pena.


026.    PATAMAR DE EXCELÊNCIA

Durante muitos anos convivemos numa verdadeira reserva de mercado para os charutos nacionais. Importarem-se charutos era proibitivo; as poucas regalias estrangeiras que aqui chegavam eram trazidas por viajantes ou por outros meios pouco ortodoxos.

O fato, num certo sentido, contribuiu para que nossas seculares indústrias de charutos “parassem” no tempo, sem empreenderem grandes esforços na busca do aperfeiçoamento e melhoria da qualidade. Sentiam-se confortavelmente instaladas no mercado, não se preocupavam em “enriquecer” seus blends acrescentando fumos de outras procedências e dedicavam boa parte de sua atividade para produzir charutos populares.

O público nacional, por sua vez, sem tradição de ser grande consumidor de puros, contentava-se com as poucas alternativas de qualidade que, então, lhe eram ofertadas.

O advento da empresa Menendez & Amerino, nascida da feliz associação entre cubanos e baianos, ainda bem antes da abertura do mercado, foi o primeiro sinal de alerta para que os demais competidores se apercebessem da importância em se produzirem charutos de qualidade no país. Tanto que, lançado em inícios dos anos 80, os charutos Alonso Menendez, logo conquistaram a preferência da elite nacional, conhecedora do que é bom.

Com a abertura do mercado e os reflexos do boom havido no ramo no mercado norte-americano, os charutos ficaram em moda. Novos empresários ingressaram no ramo da distribuição, novas tabacarias surgiram e as prateleiras e vitrines se enriqueceram com dezenas de marcas estrangeiras. Num primeiro momento, os preços relativamente competitivos dado à paridade cambial favorável aos importados, associados ao fator novidade, provocaram um razoável deslocamento da demanda para os charutos procedentes de outros países. O que foi muito bom para todos. Ao nosso público iniciado na arte e no prazer de fumar, permitiu efetuar comparações e dos produtores nacionais se exigiu o aprimoramento qualitativo.

Menendez & Amerino que se manteve sempre num patamar de excelência, atravessa agora, momentos de euforia com a expansão de seus negócios no mercado interno. A equação qualidade & preço, com a desvalorização da moeda nacional, está francamente favorável aos nossos charutos.

Em tempos de Real, porque se pagar mais pelo mesmo prazer?


025.    O TEMPLO AO TEMPLÁRIO

Quando, há mais de dois anos, resolvi voltar a publicar textos e artigos tratando da arte e do prazer de fumar, não esperava que fossem tantas as manifestações que iria receber, de Amigos das mais variadas regiões do Brasil.

Constatei que meus atentos leitores, sempre sintonizados com o que acontece no mercado charuteiro, não perdem qualquer oportunidade, seja para me enviarem recortes de matérias veiculadas na imprensa, seja para me dirigirem palavras encorajadoras e de estímulo, seja ainda, para recomendarem meus charutos e serviços a terceiros.

Convivemos pois, numa autêntica confraria, com expressivo vínculo de inter-relacionamento. Tanto é que, algum tempo atrás, quando me encontrava envolvido com atividades extra mundo tabaqueiro, adiando e adiando minhas regulares mensagens, o que mais recebia, além dos habituais pedidos de charutos, eram reclamações pela falta de notícias e comentários.

Dei a mão à palmatória.

E, enquanto desfrutava do inefável prazer de degustar um Robusto, me dispus a refazer o visual de minhas cartas Fumaça Mágica, dando-lhes nova feição, e assumindo o compromisso de me fazer presente, com muito maior regularidade, junto a Você e a todos os meus demais distintos e especiais clientes.

Assim é que estou aqui agora, de corpo e alma, na expectativa de ser brindado, com o costumeiro retorno dos que me privilegiam com suas leituras e preferências.

Mas, falemos um pouco, de tabacarias. As tabacarias são templos onde os fiéis charuteiros se reconciliam com suas regalias, sabem das boas novas e se comprazem com o incensado aroma do bom tabaco, presente em todos os cantos. Ambientes de quase solene recolhimento, como templos que são, inebriam o espírito, aumentam a fé.

As relações do cotidiano, todavia, profundamente alteradas em velocidade crescente, fazem com que, apesar da fé, não haja mais, quase, tempo para os templos. De forma que os fiéis clientes buscam novas formas de interagirem, recorrendo aos serviços especializados. Como os meus, nos quais levo o templo ao templário, poupando-lhe precioso tempo, sem prejuízo da sua crença e do seu prazer.

Na grande catedral, simbolizada pela fábrica Menendez & Amerino, estão os melhores charutos nacionais, mantidos com extremo cuidado. E é, pois, deste templo que eles saem, diretamente para seu público fiel, carregando consigo o charme de terem passado por mãos que praticam a fé charuteira há muitos anos.

E, saindo da Bahia de Todos os Charutos, como não poderia deixar de ser, levam também as lembranças do Senhor do Bonfim

A Catedral está sempre de portas abertas. Portanto, a qualquer tempo, ligue para mim. Prepare-se para as grandes festas da virada do milênio, reforçando seus estoques.


024.    NÃO SE MATA SEDE COM CHAMPANHE

Sempre que alguém reclama dos preços dos charutos, recordo o caso de alto executivo de um dos maiores fabricantes norte-americanos de puros o qual, ao ser indagado das razões de serem os charutos produtos de preços relativamente altos, de pronto respondeu:

Quem tem sede não bebe champanhe e quem tem fome, não come caviar”.

Charutos não foram feitos para saciar a sede, nem para matar a fome de ninguém. São produtos que conferem prazer e, assim pois, como o champanhe ou o caviar, têm seu justo preço.

Há um antigo refrão popular que afirma “mais valer um prazer do que dez vinténs”. É o caso do champanhe, do caviar, dos charutos, et caterva.

Produtos consagrados são eles, verdadeiras definições artísticas do savoir-vivre. Elaborados com esmero e técnica admiráveis, pelo simples prazer indulgente que concedem, fazem a alegria dos iniciados.

Na vida, tudo é muito bom, mas com um bom charuto.....


023.    EUREKA

Meus mais atentos leitores devem se recordar de minha crônica número 5, na qual comentava que o pré ato e o ato de se degustarem puros, incorporam nossos cinco sentidos. De vez em quando, ao falar dos puros, me refiro ao “enamorado apalpar deste inigualável objeto de prazer”. Mas, afinal, quando é que este “apalpar” é realmente prazeroso? Quando é que, apalpando-o, reconhecemos sua consistência mais que perfeita?

Qual a “brandura” ideal de um charuto?

Aprendi isso, pelo conhecimento passado de geração para geração. Colhi a definição junto a Félix Menendez (cubano, amigo e diretor de produção da Menendez & Amerino). Num de nossos rotineiros encontros matinais na fábrica, Félix referindo-se a seu pai, (Alonso Menendez, o criador da marca Montecristo), disse-me que, segundo o “velho”, o charuto tem que ter a consistência de uma rolha de cortiça.

Eureka! Eu encontrara a definição do que, para mim, era indefinível até então.

De fato, o charuto mais que perfeito tem que ter a consistência da cortiça. Se for mais brando do que essa, estará com insuficiência de filler ou úmido demais.  No primeiro caso o charuto “não terá graça alguma” pois fumaremos mais ar do que tabaco; no segundo, o puro é praticamente “infumável”. Arderá na boca e haja candela!

Por outro lado, se “estiver duro”, estará muito seco ou com excesso de filler. Na primeira hipótese, apesar de se perder o prazer tátil, se pode degustá-lo sem maiores problemas. Já na segunda hipótese, não há cristão que consiga aspirá-lo.

Vale ressaltar que, apesar de todos os cuidados e controles, sendo nossos charutos produtos inteiramente artesanais, vez ou outra poderão ocorrer casos de excessos, para mais ou para menos, na quantidade do filler. Isso acontecendo, não se acanhe em reclamar. Ao contrário, ser-lhe-ei muito grato, por sua contribuição.


022.    OS CHARUTOS E O CÂMBIO

Meus habituais leitores sabem, pois disso tratei em edições anteriores, da forte vinculação dos preços dos charutos “premium” a dois fatores: o custo da mão de obra e o custo dos fumos importados.

O primeiro deles tem se mantido praticamente estável. O segundo, no ano em curso, sofreu forte oscilação para mais, comprometendo a equação dos preços de venda, em reais. Como resultado, charutos importados, tiveram seus preços de comercialização proporcionalmente majorados.

Quanto aos puros produzidos no Brasil, e aqui consumidos, os fabricantes em geral, com exceção da Menendez Amerino & Cia. Ltda., aumentaram seus preços. A Menendez todavia optou, ao menos por agora, em manter para seus charutos Alonso Menendez, Amerino e El Pátio, os preços que estão vigorando desde abril do ano passado e, ainda, beneficiados por descontos promocionais ofertados a partir de agosto de 1998.

Com tal iniciativa a Companhia visa voltar a ocupar espaços perdidos para a enorme gama de charutos importados o que, aliás, vem sendo comprovado pelas recentes estatísticas de suas vendas no mercado interno. Afinal, qualidade a preços atraentes ainda é, sem dúvidas, um importante fator de alavancagem dos negócios.

E disso a clientela tem se apercebido, deslocando sua preferência para nossos consagrados charutos.

Da próxima vez que o Amigo for repor seus estoques, pense nisto. Compare nossos preços com os praticados pela concorrência nacional e estrangeira e certifique-se que o trinômio “qualidade, preço e atendimento” é, nas atuais circunstâncias, inegável privilégio de nossos puros.

021.    SECRETÁRIO MUNICIPAL

Ausente de cartas, estou em falta consigo, há algum tempo. Melhor seria dizer que a falta tem sido comigo mesmo por ser, para mim, grata satisfação manter regulares contatos com os que me privilegiam com suas leituras e preferências.

Sendo homem com formação voltada para a iniciativa privada, a vida inteira me mantive afastado de lides políticas e de cargos públicos. Há dois meses porém, por reiterada insistência do Prefeito de São Gonçalo dos Campos, preocupado ele em promover uma reforma administrativa no governo municipal, aceitei seu convite para assumir a Secretaria da Administração do município onde vivo e onde são produzidos os charutos que fazem parte da vida de muitos brasileiros.

Desnecessário dizer que minha rotina ficou um tanto quanto tumultuada no afã de tentar implementar uma visão empresarial na condução dos negócios municipais. E estes primeiros sessenta dias, num governo que já esgotou metade da sua gestão, têm sido, como não poderiam deixar de sê-lo, de árduo e intenso labor.

Por isso, e somente por isso, minhas FUMAÇAS MÁGICAS se esvaíram um pouco.

Porém, não esqueci dos Amigos. Ao contrário. Entre as nuvens de prazer dos Alonso Menendez, vezes muitas reconheço, degustados às pressas, no vai e vem e no entra e sai do dia a dia da gestão dos negócios municipais, e nos constantes memorandos manuscritos de agradecimentos a meus prezados clientes, os quais preservo com fidelidade absoluta, a consciência me repreendia pela omissão. E, para ficar em paz comigo mesmo, eis que nesta madrugada, sono abandonado, voltei à presença de meus amigos.


020.    COMUNICAÇÃO VIRTUAL

Triste, de noite na parede a vejo

E de seus lábios o gemido escuto

É leve a criatura vaporosa

Como a frouxa fumaça de um charuto.

 

Mas quis a minha sina que seu peito

Não batesse por mim nem um minuto

E que ela fosse leviana e bela

Como a leve fumaça de um charuto.

 

E vejo além na sombra do horizonte,

Como viúva moça envolta em luto

Brilhando em nuvem negra estrela viva

Como na treva a ponta de um charuto.

 

(Fragmentos poéticos de Álvares de Azevedo)

Álvares de Azevedo, o poeta maior do charuto brasileiro, viveu noutros tempos. Tempos em que escrever e se comunicar exigiam pertinácia e habilidade. Tempos do pescar-se a tinta nos tinteiros de porcelana, dos mata-borrões, das letras caligráficas, tudo à luz de velas. Tempos dos saraus e nos quais as livrarias eram o ponto de encontro da elite intelectual.

As pessoas, então, eram que corriam atrás do conhecimento. Hoje tudo se inverteu. É o conhecimento que corre atrás das pessoas.

Bob Frankenberg, principal executivo da Novell, há cerca de dois anos, declarou: “Ou você é alguém@lugar.com.br ou você não é nada”. Se os tempos de Álvares de Azevedo fossem hoje, tempos da comunicação virtual, ele por certo também seria algo como álvares@azevedo.com.br. Eu, que por meu turno, longe das pretensões poéticas, mas como um simples cronista que tem os charutos por pano de fundo de seus escritos, tive que me transformar no hugocharutos@uol.com.br

Para não perder as oportunidades de continuar fazendo chegar às mãos de meus amigos minhas mensagens e de associarem ao modernismo das comunicações a tradição incomparável dos puros.


019.    CIGAR JOY

A feira CIGAR JOY oferecerá a inédita oportunidade de combinar, no mesmo espaço físico, o Show & Sales Room e as atividades sociais do First Pan-American Meeting, o que permitirá uma presença e um contato amplo entre expositores e apreciadores de puros. Três países produtores estarão presentes: Brasil, Cuba e  República Dominicana. E nós, como não poderia deixar de ser, lá estaremos com os charutos da nossa empresa baiana, Menendez Amerino & Cia Ltda.

O encontro, por suas características, permitirá o inter-relacionamento entre os apreciadores da arte e do prazer de fumar e também uma excelente oportunidade de aproximação pessoal e/ou comercial com os dealers das melhores marcas do mercado, de produtos diretos tais como, além do carro-chefe, os charutos, também seus acessórios (isqueiros, umidores, cinzeiros, etc.) e de produtos indiretos, autênticos complementos tais como, bebidas e gastronomia, literatura, e outras delicatessens. Para aqueles que, como o Amigo, participam de nossa exclusiva confraria, trata-se de uma imperdível ocasião de aumentar seus conhecimentos e amizades.

Aguarde, dentro de poucos dias, a magnífica programação do CIGAR JOY.

Afora tudo quanto o espera, palestras especializadas, dezesseis expositores, degustações, passeios turísticos, ainda haverá a que, para mim, será a melhor de todas as atrações: poder cumprimentá-lo pessoalmente. Portanto, programe-se para estarmos juntos de 3 a 6 de dezembro em Foz do Iguaçu.


018.    SEMPRE NA FRENTE

Malgrado as idas e vindas no processo de conquistas, no sentido de uma interação das economias regionais, entendo que, mesmo aos trancos e barrancos, nosso sistema econômico que pode não ser perfeito, mas tem dado mostras setoriais de invejáveis progressos, baliza crescentes vantagens para os consumidores.

Especialmente em áreas como a dos charutos, na qual a presença do Estado é por de todo, dispensável. Ou melhor, onde a União de se fazer presente apenas com os objetivos de se valer da atividade com vistas a arrecadar recursos. O que é compreensível.

Foi-se, felizmente, o tempo em que o Estado (atendendo, diga-se de passagem, a pleitos de uma ótica destorcida de passadas lideranças) concedia danoso protecionismo ao nosso negócio. Uma exorbitante taxação de charutos importados impedia aos consumidores nacionais, o acesso às regalias produzidas noutros países. Como conseqüência, os produtores brasileiros tendo praticamente garantida a exclusividade do mercado interno, “pararam no tempo”. Os resultados em longo prazo de tal política estão espelhados pelas poucas fábricas nacionais que sobreviveram. Sendo muito pequeno o mercado interno e “protegidas” que estavam as indústrias de então, ao tentarem ingressar em mercados externos esbarravam em custos de produção incompatíveis com os preços pagos pelos consumidores de tais mercados.

A Menendez & Amerino atenta a tal realidade vem se esforçando para, reduzindo custos sem prejudicar a qualidade que fez a fama e o nome dos seus charutos, encontrar maior de tornar seus produtos acessíveis a uma gama sempre maior de consumidores. Internos e externos.

Por isso, num Brasil onde a redução de preços deixa de ser novidade, antecipou-se à concorrência, e anunciou em caráter promocional, por sessenta dias, descontos nos diversos produtos de sua linha de fabricação.

Sempre na frente.


017.    GOSTO DE FESTA

Há poucos dias recebemos a visita da equipe da TV Subaé (retransmissora em Feira de Santana, da TV Globo) para outra reportagem, desta feita a ser veiculada no canal Globo News. E, naquela natural bate-papo com o repórter, enquanto o pessoal de câmeras e iluminação cuidava dos ângulos para as tomadas de imagens, o entrevistador me indagou que gosto tinha um charuto. Respondi-lhe que, no meu entendimento, charutos têm gosto de festa.

Surpreso com a resposta, fiz-lhe observar que os charutos estão sempre associados a sucesso e a grandes e alegres momentos. Sabem a festa e cheiram a riqueza. Nascimentos, casamentos, batizados, formaturas, premiações, tudo isto tem um gosto próprio e muito especial, chamado charuto. A ninguém ocorrer degustar um puro por ter perdido um amigo mas, por exemplo, sempre se lembra, ao nascer um filho ou para comemorar um bom negócio ou qualquer vitória.

Prossegui minha explicação dizendo que a par deste lado positivo, intrínseco ao produto, outro há, interessante, e que merecia uma reflexão: todos adoram ganhar charutos de presente, mas poucos se lembram de compra-los. Os fumadores habituais sabem muito bem disto.

Nas tomadas de cena a equipe, como sempre acontece, ficou encantada com a plasticidade do processo. E, em absoluta primeira mão, conheceu um dos equipamentos importados neste mês, com o qual estamos realizando testes para a produção de cigarrilhas para o mercado externo, 100% tabaco natural.

Como se vê pois, não estamos parados. Continuamos perseguindo o intento de sempre nos superarmos, oferecendo o que há de melhor na arte e no prazer de fumar. Aumentamos a área de nossos plantios próprios e conseguimos contornar, de forma bastante razoável, a crise de matéria prima nacional. Tanto que hoje dispomos de estoques de todas as regalias para pronta entrega.

Produtos com gosto de festa. Para Você. Para seus amigos.


016.    PALAVRAS DE NESTOR JOST

Charuto. O inseparável companheiro dos importantes momentos.

Autistas do prazer sabemos como ninguém, desfrutar do privilégio de degustar um puro. Seja nas alegrias de nossas vitórias, quando nos inebria em inefáveis nuvens azuladas, seja nas aflições quando nos consola, acalma e reanima.

Devo reconhecer que cotejo charutos com cachimbos. Uns e outros requerem iniciação, conhecimentos e uma sabedoria própria para saber cultuá-los. Tanto que não são raros os fumadores que preferem, alternativamente, as inteligentes soluções das fumaças mágicas de nossas vidas.

Presenciamos, nos dias que correm, ressurgirem clubes e associações de apreciadores da arte e do prazer de fumar, em muitas cidades do País. Contra-ofensiva ou não das restrições que nos vêm sendo impostas o fato é que, cada vez mais, os iniciados se reúnem para desfrutar de incomparáveis ocasiões de descontração e intercâmbio de conhecimentos e experiências. Entre tais inúmeras entidades devo registrar a competência e a organização do Club do Cachimbo e do Charuto de Vilhena, em Rondônia. Surpreso? Pois saiba que também lá um grupo de amigos se reúne, regularmente, para somarem e dividirem seus prazeres. Contas incompreensíveis para aqueles que não sabem das boas coisas da vida. O que não é o caso de Você que agora me prestigia com sua leitura..

Houvera, em correspondência anterior, prometido iniciar a publicação seriada, do trabalho de Jean Batista Nardi, “A História do Fumo no Brasil”, pois sei que seu conteúdo será do interesse do Amigo. Todavia irei adiar tal intento para abrir espaço a artigo de Nestor Jost, intitulado O Fumo: Tradição E Cultura. Credenciais não faltam ao autor. Presidente da abifumo – Associação Brasileira da Indústria do Fumo, desde sua fundação em 1979, Nestor Jost, natural de Candelária/RS, comanda até hoje a referida entidade e só a deixou transitoriamente em uma oportunidade, quando assumiu o Ministério da Agricultura e Abastecimento. Vamos ao magnífico texto 

"Aturdidos pelas comoções sociais, que agitam hoje nosso país, os brasileiros parecem esquecer nossa origem e evolução, em seus cinco séculos de convivência humana.

Somos uma democracia racial, consolidada sem conflitos fratricidas. A maior economia dos trópicos, ainda que nos pesem disparidades gritantes. Possuímos uma cultura, rica na pluraridade de suas raças, religiões e na sua universalidade espontânea.

Nossa integração à sociedade global moldou na Europa novas feições de sua vivência cotidiana, através de dádivas como o cacau (chocolate), o açúcar e o café. Bem menos efêmeras todas do que o ouro e a prata que financiaram a crueldade das guerras dinásticas, religiosas e pela supremacia do poder europeu. Nos cafés, sorviam-se taças de chocolate e moca; negociavam-se seguros; transações marítimas e, às vezes derrubavam-se ministérios e regimes seculares.

Foram, porém, o fumo brasileiro e o norte-americano que levaram aos europeus a empatia da meditação, o relaxamento do espírito e da liberação das fainas diárias. As pinturas clássicas mostram patriarcas serenos e seus cachimbos ornamentais, como mostraram também os nossos mestres os “caipiras picando fumo” ou nossos escravos pitando. O século XIX traz a sofisticação dos charutos dos capitalistas opulentos. O cigarro chega aos salões, com a ostentação das cigarreiras e a graça das melindrosas exibindo suas longas piteiras: em desafio à hegemonia masculina retrógrada. O cigarro e o “charme” das “fumenses” emanciparam a mulher, bem antes do seu acesso ao voto e às carreiras liberais. Pais orgulhosos saudavam a maioridade de seus filhos ao oferecer-lhes o primeiro cigarro, ante a emoção e a “furtiva lágrima” materna.

Ancestrais reuniam-se em torno ao “porto” e charutos feitos com carinho artesanal, cercados no lar pela família numerosa e por comensais solícitos. Vez que outra escapavam para aventuras galantes, subsidiadas no bom tom da época. Nos salões fumava-se com elegância e discrição, pedindo-se permissão, sempre concedida com naturalidade.

Os prazeres do fumo estavam longe de reservados aos abastados. Fuma-se enrolados de palha, cachimbos de barro. Não faltavam os que regalavam com os charutos reverenciais, deixados nos “despachos” das esquinas e portões de cemitério. Todos fumavam e a cordialidade era apanágio de todos. Nosso Brasil não era dividido entre fumantes e não fumantes.

A intolerância e a imposição são veleidades estranhas ao temperamento do povo brasileiro, ainda que marcando este pelas desigualdades sociais, em plena fermentação nos nossos dias. O antitabagismo exacerbado e impositivo choca nossas tradições de individualismo e nossa própria personalidade. Desconhecido era o proselitismo em nossa sociedade até sua importação, calcada em figurinos de países com peculiaridades distintas e jogos tendenciosos de poder econômico.

Avessos que somos à segregação, dificilmente poderíamos conceber e não aceitamos a configuração de castas com direitos constitucionais e humanos tolhidos pela discriminação. Aceitamos sim a regulamentação comprovada de direitos individuais manifestados. A rigor jamais antes infligidos porque sempre respeitados pelos fumantes e seu bom senso. E, mais do que isso , Abifumo participou e continuará participando, com as autoridades e o Congresso, na elaboração e implementação de regras destinadas a soluções de harmonia.

Não existe no Brasil comunidade de não-fumantes, exigente de patrulhamentos de locais ou da aplicação de penalidades àqueles que procuram o convívio ameno nos restaurantes e nos bares. A legislação estabelece claramente as condições desse convívio, que se tem processado de maneira civilizada. A mídia e os veículos de publicidade divulgam, em cumprimento fiel, advertências e limitações respaldadas na noção da escolha livre e, sobretudo, da moderação.

A campanha antitabagista é, presumivelmente, produto de uma ação com base em alegações científicas que restringem a mortalidade às apurações estatísticas parciais, limitadas ao fumo e à amostragem excludente de causas outras. Preferimos não discutir a extensão da validade ou métodos científicos de apuração da contaminação da saúde humana neste nosso universo de reconhecida degradação ambiental. Não podemos, todavia, desconhecer certas inconsistências a recursos tendenciosos, e às vezes contraditórios, da campanha antitabagista.

Certas proposições do antitabagismo fogem mesmo à nossa compreensão. Baseiam-se em princípios éticos e humanitários, per se superiores pelo seu altruísmo em defesa da vida e da saúde. Há , não obstante, altruístas que propõem o aumento da tributação como escalada à redução do consumo, ou seja, a execração condicionada ao pagamento. Estranha reformulação do que defendiam eles com base em princípios de moral e ética. Conceituação utilitária, aliás, das mais bisonhas sabendo-se que o cigarro brasileiro, dos mais taxados mundialmente, já traz contribuição maior do que imposto recente em socorro à saúde.

Menos altruísticos ainda os processos de indenização, reconhecidos, recentemente, no pacote multibilionário norte-americano para gáudio das pendengas judiciais rendosas: com honorários advocatícios invejáveis . Não existe, evidentemente, uma doutrina antitabagista consistente numa sociedade que se tem recusado a aceitar divisões de classe, cor, religião e livre escolha na formação de sua felicidade.

Espero que continuemos assim. Sejamos brasileiros em tradição e cultura”.


015.    SENTIMENTOS DE UM FUMADOR

Ligado que sou a atividades de cunho sócio-cultural nesta aprazível cidade de São Gonçalo dos Campos, editando inclusive um semanário citadino, vi meus primeiros noventa dias do ano se esfumarem em inúmeros outros afazeres. E, muitas vezes, o afazer priva do prazer. Daí haver estado ausente da companhia de meus leitores, leia-se do prazer de escrever sobre o prazer de se degustar um puro.

Senti saudades. Menos mal que com elas veio a felicidade de sabe-las recíprocas, manifestadas nos chamados telefônicos e cartas recebidas no entretempo.

Na retomada de nosso contato protocolar, sinto-me no dever de esclarecer o reajuste dos preços de nossos charutos. A safra 97/98 dos fumos Brasil/Bahia foi, quantitativamente, um fracasso. As chuvas escassas provocadas pelo fenômeno “El Niño” reduziram a produção regional aos menores índices históricos registrados. Associado à redução da oferta da matéria prima ocorreu a elevação da demanda decorrente de fatores mercadológicos conhecidos pelo Amigo. Como resultado da conjunção destas duas variáveis, os fumos regionais foram adquiridos a preços 50% superiores aos do ano anterior. Numa economia “estável” isto é fatal, ainda mais se associarmos a tanto o poder artificial da ditadura da falsa moeda conforme se refere ao Real, Gilberto Felisberto Vasconcellos em seu livro “O Príncipe da Moeda”, Editora Espaço e Tempo, 1997, RJ., cuja leitura recomendo. Daí a nova lista de preços que acompanha a presente.

Gostaria agora de reproduzir uma das cartas recebidas a qual, exceção feita às bondosas referências ao meu trabalho, capta e reproduz, com extrema sensibilidade, muito do que se passa nos corações e mentes dos que apreciam a arte e o prazer de fumar. Confesso não haver pedido licença ao remetente para publicá-la, mas sei que ele não irá se incomodar com a indiscrição em revelar seus sentimentos os quais afinal, são de todos nós.

 

Duque de Caxias, 16 de março de 1998.

Meu prezado Hugo Carvalho,

Recebi meu último pedido e, logicamente degustando o, para mim até então inédito “Especiales/2”, senti-me saudoso de suas “Fumaças Mágicas”.

Seus textos tão bem acabados e elaborados com sentimento e prazer nos transportam para um mundo diferente por alguns momentos.

Eu, que até então simplesmente FUMAVA UM CHARUTO, passei com as suas orientações e esclarecimentos a DEGUSTAR UM PURO.

Percebi que realmente existe essa forma diferente de raciocinar e possibilidades mil de elevação de pensamento a patamares diversos e deveras prazerosos.

Ressalto porém, a minha identificação com o Alonso, que vem paulatinamente aprimorando-se, não do ponto de vista de nomes e famas estampadas em publicações, mas sim no sentido de me proporcionar mais prazer na degustação.

Iniciei-me com o número 10, experimentei o Delano; que, diga-se de passagem é espetacular, mas não para mim; e me achei “navegando” entre: Robusto, 8-9-8 e o que deveria chamar-se Espetacular/2.

Se você me perguntar qual entre os três é o meu preferido eu lhe diria que são todos, pois, cada um se identifica com determinado momento, sendo naquele espaço temporal o meu preferido, porém  me encontro apaixonado pelos três e, diga-se de passagem, não sou volúvel ou infiel.

O mais engraçado é que algumas pessoas têm a extremamente desagradável mania de criticar outras por hábitos ou posições de natureza pessoal.

Adotam posições mais ou menos assim:

O charuto faz mal à saúde.

É incômodo.

É um hábito desagregador.

Mediante tais afirmações adoto os seguintes posicionamentos:

O fazer mal é relativo, pois, o que é mais nocivo? Você fumar um charuto ou remoer-se interiormente sem nenhum tipo de prazer ou atividade que o satisfaça?

O incômodo a outras pessoas vai da educação de cada um, pois, há que se saber o local e a hora de degustar um puro.

A resposta ao terceiro questionamento é a presente correspondência de duas pessoas civilizadas que não se conheciam e ainda não encontraram-se pessoalmente, porém conseguem comunicar-se e encontraram, mesmo à distância, coincidentes e EXTREMAMENTE AGREGADORES hábitos.

O que faz mal à saúde é a falta de amor, educação, amizade, fraternidade, consideração para com o próximo e acima de tudo, falta de fé em Deus.

Então meu dileto Hugo, nessas poucas e mal escritas linhas, lhe exponho minhas experiências de “calouro” ressaltando que, com você e meu amigo Marcelo Ferreira como mestres estou me sentindo um Doutorando nessa verdadeira arte, que é a apreciação e participação ativa no prazer de alguns momentos com um atento ouvinte e parceiro que é um PURO.

A propósito estamos realmente sentindo uma SAUDADE MÁGICA da FUMAÇA MÁGICA.

Abraços do amigo

Rubens Tinoco

 

São manifestações como a acima transcrita, somadas à crença de estarmos promovendo um trabalho de cunho agregador, que me animam, confortam e incentivam. Encerrando nosso encontro de hoje devo ainda informar que continuamos enfrentando problemas alternados de abastecimento. Os novos empregados que vêm sendo admitidos para aumentarmos a produção ainda estão na incipiente fase de treinamento.

Até a próxima FUMAÇA MÁGICA.


014.    DEU NA GAZETA MERCANTIL

“Raramente um charuto é apenas um charuto”.

Jornalista Neyse Cunha Lima, in jornal Gazeta Mercantil, edição de 18 de novembro de 1997.

 

Julgando que meus estimados leitores apreciem opiniões, de outras fontes, acerca do mercado charuteiro nacional, reproduzo texto de matéria do jornal “Gazeta Mercantil” de 18 de novembro do ano passado a qual retratou com elogiável precisão, o que vem acontecendo com as (poucas) fábricas brasileiras de charutos remanescentes.

O artigo em questão, “Bahia produz charutos de olho no mercado americano”, da autoria de Neyse Cunha Lima, foi editado no caderno de Economia, área de exportação, página D-3. Vamos, pois, à integra do publicado.

Houve tempo em que um charuto era apenas um charuto. Na época de Freud, no entanto, Demi Moore, Cláudia Schiffer e Linda Evangelista não andavam fazendo pose na capa da Cigar Aficionado, uma bíblia em papel couché que se dedica exclusivamente a convencer o próximo de que um bom charuto não é apenas glamuroso, mas muito sexy também. O modismo tomou os Estados Unidos de assalto nos últimos cinco anos e hoje se traduz em outra meia dúzia de publicações especializadas, clubes de praticantes, dezenas de sites na Internet e até restaurantes que estimulam a presença dos fumantes. É de olho neste mercado que a Bahia, o único estado brasileiro a exportar charutos, começa a investir pesado em marketing a partir do próximo ano.

Os Estados Unidos já são o maior comprador de charutos brasileiros, tendo consumido, de janeiro a outubro deste ano, 39 das 52 toneladas exportadas. A República Dominicana, Honduras, Jamaica e Nicarágua são, no entanto, infinitamente mais populares no mercado do Tio Sam. “Os charutos brasileiros são muito apreciados na Europa, em particular na Alemanha, mas ainda são praticamente desconhecidos nos Estados Unidos”, explica Félix Menendez, diretor da Menendez Amerino, uma das duas maiores exportadoras do estado. O primeiro passo no sentido de corrigir a situação foi dado pelo próprio Fernando Henrique Cardoso, ao presentear o presidente Bill Clinton  com uma caixa de charutos Menendez, em sua última visita ao Brasil.

Mas o governo federal que mais. Os ministérios das Relações Exteriores e da Indústria e Comércio estão trabalhando em conjunto com as exportadoras Menendez Amerino e Suerdieck, a Secretaria da Indústria, Comércio e Mineração da Bahia e o Promoexport na criação de uma estratégia de promoção maciça do charuto brasileiro nos EUA, que inclui desde publicidade em revistas e participação em feiras até o trabalho direto com os distribuidores de lá. Os custos da operação ainda não estão fechados, mas, de acordo com o gerente comercial do Promoexport, Luciano Freitas, a estratégia já está mais do que definida. “Queremos aproveitar a onda anti-tabagista, oferecendo os charutos como uma alternativa menos nefasta à saúde do fumante”, diz. Essa idéia não é nova. Foi ela que ajudou a catapultar o consumo entre os americanos, que foi quadruplicado desde o início da década, quando os fumantes convencionais começaram a ser banidos do convívio social.

A promoção dos charutos brasileiros tem, no entanto, um obstáculo nada desprezível a transpor: o El Niño e seu efeito arrasa-quarteirão sobre a safra brasileira. Luciano Freitas está convencido da capacidade de produção das empresas locais, mas não se pode ignorar o fato de que a quebra da safra fez que a produção diminuísse à metade, como lembra Félix Menendez.

Em conseqüência disso, sua empresa, que costumava importar entre 10 e 15% de sua matéria prima da Indonésia, da República Dominicana e dos próprios EUA, vai precisar importar o dobro para cumprir a sua meta para o próximo ano.

Vale dizer, no entanto, que a meta da Menendez não é nada modesta. “Queremos aumentar a produção em 50%”, diz. A fábrica produz algo em torno de quatro milhões de charutos por ano, 90% dos quais são exportados. Os Estados Unidos consomem 75% deste total e o restante é dividido entre o Canadá e a Alemanha. Pelos cálculos da Menendez, para aumentar sua produção em dois milhões de charutos vai precisar investir cerca de US$ 1,4 milhão, consumidos basicamente em matéria prima e, em menor escala, na formação e admissão de mão de obra. Atualmente a empresa tem 93 funcionários trabalhando no beneficiamento de fumos e outros 150 na fabricação artesanal de charutos, mas sua meta é aumentar este número para 315 funcionários ao todo.

A maior parte desta produção em larga escala vai ser direcionada ao mercado americano, cujo gosto, também no que diz respeito aos charutos, é radicalmente diferente daquele dos consumidores europeus. Em vez dos charutos médios de capa escura, quase preta, apreciados pelos alemães, suíços, holandeses e ingleses, eles preferem charutos grandes, de capa branca.

Como se vê, raramente um charuto é apenas um charuto.

Tendo eu o prazer de servir ao Amigo com os charutos da Menendez & Amerino, sinto-me gratificado em transmitir-lhe as notícias acima, as quais eventualmente podem não ter chegado ao seu conhecimento.

Afora disto, espero que tais esclarecimentos, somados aos muitos outros que tenho prestado via minhas publicações, aumentem cada vez mais a sua satisfação em participar do especialíssimo universo dos conhecedores da arte e do prazer de fumar.

Até nosso próximo bate-papo.


013.    FELIZ 1998

Caro Hugo: “Poesia pura, a sua descrição do acender do delicioso puro.

Agora que o frio já começa a apertar aqui no Texas, a “Fumaça Mágica”

vem aquecer-me “ (Luiz C. Toledo, M.D. – Fort Worth, Texas, USA)

Neste final de ano, contrariando a praxe, decidi substituir o tradicional Cartão de Boas Festas por mais uma Fumaça Mágica da série que, com a presente, atinge sua 13ª edição.

Enviar uma mensagem natalina seria bem mais fácil e simples.

Entendo porém que, face a tantas manifestações de apreço e preferência e, porque não dizer, de tanta paciência, o Amigo está a merecer algumas explicações importantes com relação aos problemas havidos no decurso deste ano, relativos tanto à qualidade quanto à falta de abastecimento regular.

Felizmente, posso adiantar, a companhia tem tudo alinhavado para que em 98 as coisas corram de forma mais harmônica não frustrando, assim, as expectativas daqueles que, como o Amigo, elegeram as marcas produzidas por Menendez Amerino & Cia. Ltda.

Penso outrossim que, considerando os longos bate-papos mantidos consigo através das cartas anteriores agora, será mais fácil fazer-me entender quanto aos percalços que tivemos que contornar em 97.

Aumento da produção

Porque Vocês não aumentam a produção se têm tantos pedidos em carteira?

Esta tem sido a mais comum das indagações de nossos clientes que, ao telefonarem pedindo determinado charuto, são informados que não temos uma caixa sequer em estoque e mais ainda, que segundo nossa programação, só voltaremos a dispor do produto dentro de determinado prazo.

Aparentemente a equação é fácil. Se vendo duzentos, produzo duzentos. Se vendo quinhentos, produzo quinhentos. Mesmo que as exigências para se duplicar ou triplicar a produção fossem meras abstrações, no caso particular da manufatura charuteira o crescimento imediato esbarra num fator absolutamente limitante. Tal fator chama-se TABACO. A decisão de se elevar a produção para níveis superiores só pode ser tomada numa época do ano: quando ocorre a safra da matéria prima, vez que a mesma não é encontrável rotineiramente no mercado como se fossem chapas de ferro, cimento, papelão ou qualquer outro insumo industrial. Tomada a decisão e conseguidos os recursos financeiros para se comprar a totalidade da matéria prima programada para os 12 meses seguintes o nível da produção mensal média do ano estará por conseqüência predefinido. E, se porventura tal média não seja bem acompanhada e se tentem quebrar records mensais, por certo que, lá na frente, a fábrica irá parar por falta de fumos.

Temos negócios acertados com o Exterior que somados aos das curvas históricas de nossas vendas no mercado interno, nos autorizam aumentarmos nossa produção em, no mínimo, duas vezes e meia. Estamos atravessando justamente a época de compra de fumos plantados na Bahia, indispensáveis às nossas formulações.

Estiagem e Plantio próprio

Com a estiagem havida na época do plantio, além do produto haver aumentado em 50% (custo da matéria prima bruta a nível de lavrador) não há fumo em quantidade suficiente para suprir a demanda. Tanto a nossa, quanto a de outros compradores internacionais que aqui vêm comprar fumos da Mata-Fina.

Resultado: fomos compelidos a suprir a falta de matéria prima local deslocando esforços da área industrial e nos dedicando também à área agrícola em larga escala. Demos início a um plantio de 40 hectares irrigados com pivô central em fazenda situada a 270 km de nossa fábrica, como forma de garantir matéria prima que permita nossa expansão industrial em 98.

Então como vê o Amigo, sob tal aspecto temos encaminhadas soluções que irão resolver, dentro de uns 3 a 4 meses nossos problemas de abastecimento.

Qualidade

Falemos agora um pouco da qualidade e, de modo especial, sobre a dos nossos Alonso Menendez.

Sabemos que ao longo de 97 nosso padrão de qualidade sofreu altos e baixos. Vezes houve em que o Amigo recebeu charutos simplesmente majestosos; outras quando, ao contrário, as reconhecidas características que fizeram a fama e o nome dos Alonso Menendez estavam irreconhecíveis.

Isto irá melhorar, e muito em 98. Nossa antiga e conhecida marca El Pátio voltará ao mercado. E o Amigo então se perguntará: o que tem a ver a qualidade dos Alonso Menendez com a volta dos charutos El Pátio? Tem e muito.

Charutos El Pátio

Conforme já lhe expliquei numa de minhas cartas anteriores, uma das etapas do processo consiste na revisão da uniformidade dos charutos de determinada bitola (sob todos os aspectos).

Produtos de linhas “non plus ultra” como devem ser os Alonso Menendez (País) e Cañonero (Exterior) correspondem às melhores seleções cujas respectivas “descargas” serão aproveitadas numa outra linha que, naturalmente, terá preços mais atraentes. Aí entrarão nossos futuros El Pátio.

Até agora, por não termos tal linha alternativa a qualidade de nossos Alonso Menendez e Cañoneros flutuava bastante. Isto em função das variações cromático-qualitativas das capas que são importadas, para uso exclusivo em tais linhas de charutos. Com o breve relançamento da linha El Pátio, com idêntica formulação a dos Alonso Menendez, estes voltarão a ter seu constante padrão de uniformidade e requerido por nossa exigente clientela.

Abastecimento

No que se refere a uma regular disponibilidade de estoques para permitir despachos imediatos, pedimos ainda um pouquinho mais de sua paciência. Com o aumento de nossa produção, em decorrência de adequada disponibilidade de matérias primas, quando concluídas as safras de nossos plantios próprios, o abastecimento se normalizará.

Charutos celofanados

A oportunidade é propícia para demonstrar que, apesar dos percalços explicados, não ficamos parados ao longo deste ano pois, além de havermos conseguido aumentar nossa produção em mais de 70%, todos nossos charutos para o mercado nacional passaram a ser celofanados, uma a um. Graças a havermos investido na nacionalização de um equipamento próprio para produzir bolsas de celofane, até então importadas dos USA.

Estojos de luxo – Delano do Brasil

Neste restante do ano, como temos que nos desdobrar para atender a tudo e a todos e, mais ainda, para cumprir nossos compromissos de geração de divisas, estamos concentrados na produção dos charutos para exportação da marca “Delano do Brasil”, em belíssimos estojos de luxo com 20 unidades (bitola: Robustos e capa da variedade Java).

Penso que o Amigo não deveria perder esta breve oportunidade de ter para seu consumo, bem como para presentear aqueles que o merecem, estes excepcionais charutos. Se estiver interessado, deixe-me saber. Os charutos Robustos, Delano do Brasil, neste curto período em que dispomos de algum estoque, estão com preços atraentes, ou seja R$ 82,00 cada estojo de luxo.

 Para encerrar aceite meus sinceros agradecimentos por suas atenções para comigo, aos quais associo a manifestação de minha amizade e os meus melhores votos de Paz, Saúde e Sucesso.

 Até 1998!


012.    PREÇOS EM DÓLARES EM 1997

“O charuto é igual a uma boa pintura. 

Uma questão subjetiva, que depende de  gosto”. 

(Felix Menendez, diretor de Menendez Amerino & Cia. Ltda.)

 

Questão volta e meia abordada nos inúmeros contatos que mantenho com consumidores tem sido a dos preços dos charutos brasileiros.

Sendo assim me vi no dever, para bem orientar os que me privilegiam com suas preferências, de elaborar estudo estatístico comparando preços de venda ao consumidor, no mercado norte-americano, de charutos oriundos de cinco países distintos com os praticados para os nossos Alonso Menendez, no mercado nacional.

Preliminarmente alguns esclarecimentos importantes

Lonsdale: tamanho de charutos que correspondem ao Alonso Menendez n.º 10 (diâmetro ao redor de 16,6 mm por 165 mm de comprimento);

Robusto: tamanho de charutos que correspondem ao Alonso Menendez Robusto (diâmetro ao redor de 20,6 mm por 127 mm de comprimento).

Todos os preços estão cotados em US$ sendo que para os charutos cubanos (não encontráveis no norte-americano) fizemos a conversão de suas cotações de libras esterlinas para US$. 

Verifiquemos, inicialmente, os valores relativos à bitola Robustos:

“ROBUSTOS” produzidos em CUBA

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

HOYO DE MONTE REY Epicure nº 2 50 x 4 7/8 ” 19,8 x 124 13,90
ROMEO Y JULIETA Exhibicion nº 4 48 x 5 19,0 x 127 12,10
COHIBA Robusto 50 x 4 7/8 ” 19,8 x 124 21,50
RAMON ALLONES Specially Selected 50 x 4 7/8 ” 19,8 x 124 12,18

Média Cuba  US$ 15,08

 

“ROBUSTOS” produzidos na JAMAICA

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

MACANUDO Vint. Cab.Sel. V 49 x 5 ½ ” 19,4 x 140 11,00
8-9-8 COLLECTION Robusto 49  x 5 ½” 19,4 x 140 7,75
TEMPLE HALL Robusto 49 x 5 ½ ” 19,4 x 140 6,85
MACANUDO Vint Cab. Sel. VIII 50 x 5 ½ ” 19,8 x 140 12,50

Média Jamaica  US$ 9,52

 

“ROBUSTOS” produzidos na REPUBLICA DOMINICANA  

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

MONTECRISTO Robusto 50 x 4 ¾” 19,8 x 121 7,50
MONTECRUZ Robusto 49 x 4 ½” 19,4 x 114 3,50
LA AURORA Robusto 50 x 5” 19,8 x 127 4,08
PARTAGAS Robusto 49 x 4 ½” 19,4 x 114 4,70

Média Republica Dominicana  US$ 4,95

 

“ROBUSTOS” produzidos na NICARÁGUA

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

JOYA DE NICARÁGUA Consul 52 x 4 ½” 20,6 x 114 4,00
JOSE MARTI Robusto 50 x 4 5/8 ” 19,8 x 118 2,50
LICENCIADOS Wavell 50 x 5” 19,8 x 127 4,50
LA GIANNA Robusto 50 x 5” 19,8 x 127 4,60

Média Nicarágua  US$ 3,90

 

“ROBUSTOS” produzidos em HONDURAS

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

PUNCH Super Rothschild 50 x 5 ¼ ” 19,8 x 133 3,30
EL REY DEL MUNDO Rothschild 50 x 5” 19,8 x 127 3,25
HOYO DE MONTERREY Rothschild 50 x 4 ½ ” 19,8 x 114 2,40
DOM MELO Non Plus 50 x 4 ¾ ” 19,8 x 121 4,60

Média Honduras  US$ 3,39

 

Examinemos agora os dados da bitola Lonsdales:  

“LONSDALES” produzidos em CUBA

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

MONTECRISTO N.º 1 42 x 6 ½” 16,6 x 165 14,22
PARTAGAS 8 9 8 43 x 6 5/8” 17,0 x 168 14,54
EL REY DEL MUNDO Lonsdale 42 x 6 3/8” 16,6 x 162 12,25
SAINT LUIS REY Lonsdale 42 x 6 ½ ” 16,6 x 165 7,32

Média República Dominicana  US$ 12,08

 

 “LONSDALES” produzidos na JAMAICA

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

MACANUDO Vintage Cabinet 2 43 x 6 9/16” 17,0 x 167 8,50
CIFUENTES Lonsdale 42 x 6 ½ ” 16,6 x 165 10,60
MACANUDO Baron Rothschild 42 x 6 ½ ” 16,6 x 165 4,00
TEMPLE HALL N.º  625 45 x 6 ¾ ” 17,8 x 171 5,45

Média Jamaica  US$ 7,14

 

“LONSDALES” produzidos na REPÚBLICA DOMINICANA

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

PARTAGAS 8 9 8 44 x 6 7/8” 17,4 x 175 4,75
LICENCIADOS Excelente 43 x 6 ¾” 16,0 x 171 3,00
POR LARRAÑAGA Cetros 42 x 6 7/8” 16,6 x 175 4,50
DON DIEGO Lonsdale 42 x 6 5/8” 16,6 x 168 3,50

Média República Dominicana  US$ 3,94

 

“LONSDALES” produzidos na NICARÁGUA

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

JOYA DE NICARÁGUA N.º 1 44 x 6 5/8” 17,4 x 168 2,55
DON JUAN Numero Um 44 x 6 5/8” 17,4 x 168 2,55
LA FINCA Romeo 42 x 6 ½” 16,6 x 165 1,60
THOMAS HINDS Lonsdale 43 x 6 2/3” 17,0 x 169 4,30

Média Nicarágua  US$ 2,75

 

“LONSDALES” produzidos em HONDURAS

Marcas Nome da Bitola Medidas

Em polegadas

Medidas

Em mm

US$

Unidade

DON LINO N.º 1 44 x 6 ½ ” 17,4 x 165 3,15
EL REY DEL MUNDO Lonsdale 43 x 7” 17,0 x 178 3,50
DON MELO Corona Gorda 44 x 6 ¼ ” 17,4 x 159 2,90
SAINT LUIS REY Lonsdale 44 x 6 ½ ” 17,4 x 165 3,00

Média Honduras  US$ 3,14

Fonte: Revista “Cigar Aficionado” Edições September/96 e August/97

Para maiores esclarecimentos sobre as medidas em polegadas consultar FUMAÇA MÁGICA 07

Vamos ao ranking comparativo?

Bitola “ROBUSTOS”

PAÍSES

US$ Unidade

CUBA – Média encontrada

15,08

JAMAICA – idem, idem

9,52

REPÚBLICA DOMINICANA – idem, idem

4,95

NICARÁGUA – idem, idem

3,90

HONDURAS – idem, idem

3,39

BRASIL– Alonso Menendez Robusto em caixas

2,58

BRASIL– idem, idem em maços

2,26

 

Bitola “LONSDALE”

PAÍSES

US$ Unidade

CUBA – Média encontrada

12,08

JAMAICA – idem, idem

7,14

REPÚBLICA DOMINICANA – idem, idem

3,94

NICARÁGUA – idem, idem

2,75

HONDURAS – idem, idem

3,14

BRASIL– Alonso Menendez Nº 10 em caixas

2,30

BRASIL – idem, idem em maços

2,02

Observação: Os preços dos charutos Alonso Menendez correspondem aos valores em reais vigentes para mercado interno, desde 31/03/97, e convertidos a US$ pela paridade de US$ 1,00 = R$ 1,13.

Os números acima falam por si mesmos. Embora no mercado norte-americano produtos manufaturados em geral, sejam mais baratos, no Brasil, com os charutos dá-se equação inversa.

É evidente que os fabricantes nacionais estão atentos para isto sendo de se esperar que, em futuro próximo, nossos puros de qualidade marchem para acompanhar seus competidores mais próximos ou seja, Honduras e Nicarágua.

Enquanto isto não acontece fica patente que o binômio “qualidade-preço” é essencialmente brasileiro.

Até nosso próximo encontro.

011.    ACENDENDO UM CHARUTO

“O senhor tem encantado a gente com seu trabalho”.

(Dr. Alício Peltier de Queiróz, médico, 91 anos, fumador de puros professor catedrático jubilado da antiga Faculdade de Medicina da Bahia, referindo-se às cartas da série Fumaça Mágica)

Como charutos viraram modismo, a Rede Globo volta e meia tem inserido em suas novelas cenas onde os quais são consumidos. E, lástima das lástimas, quanto amadorismo incompatível com os padrões globais de qualidade.

É claro que um ou outro personagem, por força do próprio papel, não teria obrigação de performance plausível no ato de degustar puros. Mas a tônica têm sido posturas que revelam faltar melhor conhecimento quanto à forma de bem se desfrutar um charuto.

Como tudo na vida, fumar-se um puro é também exercer-se um papel. Há no ritual uma teatralidade própria que faz a diferença entre quem sabe e quem não sabe.

Em minha FUMAÇA MÁGICA 05  abordei as vinculações dos sentidos à arte de fumar. Gostaria de avançar mais um pouco falando agora sobre como acender e degustar-se um puro.

Confesso não ser ortodoxo a ponto de só faze-lo com fósforos, ou mais ainda, com a chama de uma lâmina de cedro acesa previamente. Há quem prefira tais formas, corretíssimas diga-se de passagem.

Eu não gosto dos fósforos porque normalmente se consomem antes dos charutos estarem acesos. E não uso o cedro porque, há muito tempo, a maioria dos fabricantes, deixou de usar aquela entrecamada divisória entre os charutos e que se constituía no material ideal para incendiar-se e com a ele dar-se candela ao puro.

A mim satisfaz a chama longa de um isqueiro a gás. Isqueiros de fluído (ainda existem?) nem pensar. São condenáveis pois têm grande chance de “contaminar” o sabor do produto.

E para que me seja possível transmitir minha experiência, da forma mais autêntica possível, vou agora, acender um Alonso Menendez n.º 10, escolhido com carinho. Veja. Eu disse “escolhido com carinho” pois charutos não são cigarros. Estes são anônimos; os puros têm individualidade.

Primeiro passo: deitá-lo sobre a mão esquerda (falo para os destros) e apreciar o produto em si. Girá-lo, apalpá-lo, senti-lo.

Segundo passo: com guilhotina apropriada (ou mesmo um canivete), cortar-se o bico do charuto. Opcionalmente pode usar-se, para tanto, a unha do polegar. Eu prefiro esta última pois a unha está sempre comigo e a danada da guilhotina, volta e meia, não sei onde se meteu.

A operação é facílima. Gentilmente vai se despegando o fumo que capeou o bico, enquanto se roda o charuto com a outra mão. Como se fosse um abridor de latas. Concluído o perímetro, pronto! A pequena partícula desprende-se sem maior trabalho. Observe que a mesma deve corresponder ao diâmetro do charuto. Isto garantirá uma passagem de ar, quando das aspirações, sem provocar condensações nicotínicas de gosto amargo e desagradável. Por tal razão é que o hábito de alguns fumadores, em simplesmente furar o bico do charuto com um palito, é desaconselhável.

“Abrir-se” com os dentes? Horrível!

Pior ainda é fazê-lo e cuspir-se longe a partícula de fumo. Selvagem!

Terceiro passo: Lábios secos, charuto à boca, isqueiro aceso com ponta da chama na ponta do charuto. Se em lugar do charuto fosse um cigarro, uma única e simples aspiração o acenderia. Com charutos as coisas são um pouco diferentes.

Enquanto, lentamente, se roda o charuto nos lábios, aspira-se e sopra-se de forma breve, umas duas vezes. Foi o tempo de dar-se a candela inicial. Isqueiro ainda aceso, a seguir, duas ou três profundas aspirações, deixando-se após cada uma, a boca entreaberta para a fumaça “passear” pelo palato e sair da boca, naturalmente, no ato de fechá-la para a aspiração seguinte.

Resolvido! Seu charuto estará aceso apresentando uma cinza regular com cerca de dois milímetros.

Agora é tratar de degustá-lo lembrando que charuto se empunha de qualquer maneira. Exceto como cigarro ou seja, nunca com os dedos médio e indicador esticados. O verdadeiro charme está em saber acolhe-lo.

Uma das formas preferidas é manter-se por um lado o dedo polegar como apoio e os demais pelo outro lado, como se estivéssemos dedilhando as teclas de um piano. Recorde que o bom fumador prefere estar com o charuto em suas mãos durante todo o ato de fumar, raramente deixando-o no cinzeiro.

Quanto ao pulso poderá ser rotacionado para que possamos “enamorar-nos” com a plasticidade do produto enquanto o mesmo se consome para a nossa alegria. O “nossa” tem no caso, um duplo sentido. Pode ser relativa à satisfação do consumidor ou à do produtor pois a “alegria deste é ver o seu produto pegar fogo”.

Alguém já afirmou que “fumar charutos é um estado de espírito” e como tal nos induz à reflexão, a uma paz interior, a um júbilo. Portanto, nada de gestos nervosos ou apressados. Deve haver perfeita sintonia entre o fumante e o charuto; a mesma que se requer entre um piloto e seu carro. Há claros limites para a velocidade nesses momentos supremos, nesta viagens de inefável satisfação pessoal.

O bom fumador, irá acompanhar a performance do charuto, em todos os sentidos. E cuidará de “fumar seco” isto é, evitar de ensalivar o puro. Há fumantes que apreciam mascar a ponta dos charutos umedecendo-as, pressionando-as com os dentes a ponto de deformá-las. Na minha opinião tal hábito é, no mínimo, anti-estético.

Charuto à boca, cuida-se para que os lábios estejam secos, não devendo ser tocado com a língua. Os dentes são usados, para firmar o charuto enquanto se muda a posição da empunhadura. O puro deve permanecer nos lábios apenas pelo tempo necessário para que se aspire sua fumaça mágica. Esta deve ser expelida lentamente pelas narinas, e o eventual excesso poderá ser devolvido pela boca ao se fechá-la de forma gentil. A fumaça do charuto, ao contrário de como se usa fazer com a do cigarro, nunca deve ser expelida na forma de um sopro forte.

Deixe-a esvair-se. E, se for o caso, enquanto isto, torne a re-inspirá-la pelas narinas. Como os ex-fumantes que andam sempre à cata de um rastro de fumaça para matar saudades. Surpreenda-se a si mesmo na sua ladroagem. Curta, desfrute, delicie-se, cause inveja.

Uma vez consumida a maior parte do charuto está na hora em desfazer-se do companheiro. Não há nenhuma imposição matemática mas, se limite pudesse ser recomendado, afirmaria que o mesmo deverá corresponder ao momento em que seu dedo mínimo não mais possa se apoiar no charuto, quando cabem apenas os dedos indicador, médio e anular.

Lembre-se que a parte final de seu puro que, com saudades será depositada sem esmagá-lo no cinzeiro, funcionou como filtro da fumaça mágica que lhe proporcionou tanta satisfação.

A mesma que espero, esta carta lhe tenha dado.

010.    VIAGEM A SÃO GONÇALO – 4ª PARTE

Cá estamos nós, em São Gonçalo dos Campos para concluirmos nossa visita à fábrica dos famosos Alonso Menendez e Amerino. Conforme se recorda havíamos percorrido a produção de puros até a etapa da classificação cromática, quando se escolhiam os irmãos da mesma caixa. 

Pois bem, após este rápido cafezinho, não percamos mais tempo. Antes de continuarmos na ala da produção, nos dirijamos para o setor da fabricação das caixas de madeira. Vamos lá? 

Este primeiro depósito pelo qual estamos passando é a área de estocagem de fumos enfardados. A seguir temos o Almoxarifado de matérias-primas em geral (exceto fumos) onde, como você vê, há uma enormidade de itens em sua grande maioria, materiais de embalagem. 

Agora, chegamos na carpintaria onde trabalham 15 empregados. É uma fábrica dentro da fábrica. Observe que só trabalhamos com cedro em pranchas e em lâminas de compensado. Aquelas são usadas para a confecção das caixas ditas “de luxo” e estas, recebidas em diversas espessuras, para a maioria das caixas vendidas no País e no Exterior. 

Historicamente o cedro tem sido considerado a madeira por excelência para acondicionamento dos charutos. Seu odor característico “casa” à perfeição com o aroma dos tabacos resultando numa simbiose que a todos agrada.  

Quantas e quantas vezes o Amigo já viu alguém, após abrir uma caixa de charutos , de forma quase que intuitiva, levá-la até às narinas e aspirar, com prazer, o aroma que se desprende da caixa recém-aberta? Pois observe que, a rigor em tal momento, especialmente se os charutos estiverem celofanados estaremos nos deliciando muito mais com o aroma do cedro do que com o dos charutos. 

Aqui vale também registrar outra observação interessante. Lembra-se quando lhe falei que um charuto necessita no mínimo de um mês de repouso, para que adquira seu esplendor gustativo? Pois note que haverá sensível diferença se os charutos não celofanados estiverem ou não guardados numa caixa de cedro. Nestas, após certo tempo ocorrerá uma interpenetração de odores. Resultado: um sabor distinto. Nem melhor, nem pior. Apenas diferente. 

É claro que se passando muito tempo, melhor dizendo, muitos anos o gosto do charuto ficará prejudicado. Eu mesmo já tive oportunidade de fumar um deles que estava embalado por mais de vinte anos O produto perdera seu aroma característico. Parecia que estava fumando somente cedro. 

“O Brasil é o país.

Sem exageros astutos.

O único que usa o cedro

Para encaixar seus charutos

Exportando para Europa,

Enaltece seus produtos.”

(Antônio Alves da Silva - cordelista e poeta popular de Feira de Santana)

Exagero poético à parte a verdade é que o Brasil é dos pouquíssimos países que ainda usam o cedro, cada vez mais escasso. Dita madeira vem sendo substituída por outras, mais baratas, como a virola por exemplo. 

Mas aqui na fábrica só trabalhamos com o velho e famoso cedro, cujo aroma inebria a carpintaria. Há, é verdade outras madeiras, em lâminas de 0,6 mm tais como a imbuia o freijó, a cerejeira, a sucupira e o mogno, que são usadas para revestimento externo das caixas de luxo as quais como você está vendo, são essencialmente artesanatos. A ponto de muitos duvidarem que as mesmas sejam fabricadas por nós. Verdadeiras obras de arte formam composições de matizes policromáticas, usando-se, madeira distintas, compondo caprichosos desenhos na tampa das caixas.Vale a pena você ter uma delas, em sua casa com seu nome gravado, para obsequiar seus amigos. E, como um presente especial, nada as supera em classe, distinção e bom gosto.

Lembre-se disto. 

Bem, no restante aqui na carpintaria vale você também notar o quanto de trabalho se consome na montagem de caixas e em especial na colocação das dobradiças e fechos com os balmazes, estes mini-pregos latonados. Observe que para tanto usamos mão de obra feminina pois é um trabalho delicado e requer muita paciência. 

As caixas, após aprontadas e inspecionadas, seguem para o setor de embalagem dos charutos para onde vamos agora. Antes, tomemos outro cafezinho e um copo d’água gelada pois a primavera chegou com um calor recalcitrante. São os primeiros efeitos locais do El Niño.

Estamos agora no setor do “Anelado” onde os charutos são identificados para o distinto público. Neste departamento os puros já pré-escolhidos receberão o anel respectivo e serão celofanados, quando for o caso. “Anelar” implica também em saber escolher a “cara” do charuto pois, por mais uniforme que tenha sido a elaboração, os charutos sempre têm uma “cara”, que é o melhor do seus lados.

Após anelados e celefonados os produtos são embalados nas suas caixas específicas as quais externamente contém gravadas a marca comercial (nome do produto), a quantidade, o nome de fantasia da bitola (e a depender de exigências do cliente, as medidas) e o nome o fabricante.

 

Daí as caixas cheias são levadas para a câmara frigorífica para o processo de esterilização onde permanecem por prazos de 24/48 horas a uma temperatura de 10º C negativos. O congelamento da massa esteriliza os eventuais ovos da “lasioderma serricorne”, vulgarmente conhecida como “bicho do fumo” impedindo sua posterior eclosão que causaria o conhecido problema de charutos que apresentam perfurações.

 

Verifique, agora, estas caixas que estão sendo retiradas da câmara frigorífica. As ditas já sofreram o processo de congelamento e estão sendo levadas para aquele mesmo setor de secagem, por onde eles passaram logo que foram capeados. Trata-se do “recondicionamento ” para devolve-las a temperatura ambiente, após o qual tornam a voltar para o setor de acabamento final da embalagem.

 

Acabou o processo? Ainda não mas falta muito pouco, como você verá a seguir.

 

No setor de embalagem as caixas são reinspecioanadas, fechadas e têm apostos, a depender do caso, rótulos e etiquetas outras exigidas pelo cliente ou por determinações legais (a depender do país de destino). Procede-se a seguir a celofanagem das caixas, empacotando-as, uma a uma, com papel transparente.

 

Tudo aprontado, agora na Expedição, este setor onde acabamos de entrar, onde a temperatura e umidade relativa do ar são controladas, os produtos permanecem armazenados nas caixas máster (caixas de papelão) aguardando que Você nos dê a honra de sua preferência.

Bem, concluímos nossa visita as instalações e espero que sua vinda à São Gonçalo dos Campos haja valido a pena. Você por acaso sabia que aqui recebemos muito mais visitas de estrangeiros do que de brasileiros? Trata-se simplesmente da confirmação de tudo quanto lhe tenho dito quanto à importância do mercado externo para nossos negócios. 

Gratíssimo por seu interesse e até a próxima FUMAÇA MÁGICA, com mais informações sobre o maravilhoso mundo dos charutos. 

Encerrando, destaquem-se as palavras de Carlos Heitor Cony: 

Depois dos havanas , os únicos charutos confiáveis são os brasileiros. Brasil e Cuba se parecem na comida, na música, raízes africanas e no gosto pelo rebolado”.


009.    VIAGEM A SÃO GONÇALO – 3ª PARTE

“Tem moça que quando vê

Um charuto, perde o prumo

E diz: com esta fumaça

Eu nunca me acostumo...

Mas quando está namorando,

Tá doida p’ra levar fumo”.

(Antônio Alves da Silva,cordelista de Feira de Santana - BA)

Antes de continuarmos nosso passeio pela fábrica, interrompido na FUMAÇA MÁGICA 08, ocasião em que conhecêramos o Departamento de Fumos e a Banca de Capas, atendendo pedido de atento leitor, deixe-me esclarecer como identificar nas embalagens, o processo de produção. 

Nas caixas de charutos cubanos, entre outras, podemos encontrar três distintas menções:

1) totalmente hecho a mano, 2) hecho a mano, ou 3) hecho en Cuba.

É bom saber distingui-las. A primeira delas é clara por si mesma. A segunda se refere a charutos capeados a mão usando-se tirulos (bunches) feitos mecanicamente com equipamentos de alta produção. A terceira significa que todo o processo de fabricação é mecanizado. 

Já na terminologia norte-americana os correspondentes, respectivamente, são:

1) hand made, 2) hand rolled, ou 3) machine-made.

Como se vê, os termos usados em USA são bem mais auto-explicativos e não deixam margem a dúvidas. 

Quanto aos fabricantes brasileiros, em geral não têm se preocupado em fazer tais distinções nas embalagens comercializadas no mercado interno. O que é compreensível pois sendo um mercado de reduzidas dimensões é pouco sofisticado. E mais ainda pelo fato que, originariamente, todos os charutos nacionais eram feitos à mão.

Isto esclarecido prossigamos conhecendo um pouco mais da fabricação de puros a mão reiniciando por este setor onde trabalham cerca de 50 empregados, mulheres na sua imensa maioria: o Departamento de Tirulos

É aqui que cada operadora, conforme o Amigo está vendo, dispõe de pequena maquineta manual que lhe permite envolver os fillers com o capote. Os fillers são usados na quantidade necessária para se obter o diâmetro especificado para o charuto final. Os tirulos são a alma dos charutos. As produções individuais são acompanhadas constantemente, via controles dos pesos e dos diâmetros de acordo com standards internos. Verifique que se requer extrema habilidade tátil e muito treinamento para se direcionar os capotes na esteira da maquineta (recorde que há os de esquerda e os de direita), evitando-se que os fumos se rompam ou sejam usados pelo avesso. Cada operadora tem sua produção diária controlada para fins de percepção de prêmios de produção sempre que ultrapasse as tarefas mínimas estipuladas pela empresa. E, para que o amigo tenha uma melhor idéia do quanto de mão de obra é consumida para se produzir um puro, saiba que, neste departamento, o índice diário médio de eficiência é da ordem de 310 tirulos por operadora.

Os tirulos revisados agora seguem para o Departamento de Prensas & Cortes. É aquele pessoal ali no meio desta ala fábrica rodeado de pilhas de moldes de charutos. Ali os tirulos são cortados na extremidade que corresponderá ao bico do futuro charuto e em seguida, já acomodados nos moldes, cada qual com capacidade para dez unidades, são submetidos à operação de prensagem por duas horas no mínimo. Observe que os moldes não são apanhados ao acaso. Como variam os diâmetros dos charutos, também variam os moldes. Por isso os responsáveis pela programação da produção têm que ter pleno conhecimento das inter-relações departamentais, caso contrário a coisa vira “samba do crioulo doido”: ora faltarão tirulos, ora faltarão moldes, ora teremos tirulos porém não no comprimento desejado, etc. etc. Além disto maior cuidado e conhecimentos ainda, são exigidos pois dois tirulos absolutamente iguais poderão ser de formulações distintas e, portanto, se destinam a charutos diferentes. 

Agora nos desloquemos para a área adjacente, onde estão outras tantas mulheres trabalhando em bancadas semelhantes às do Departamento de Tirulos. É o setor do capeamento o qual, internamente é também conhecido como “galera”, termo advindo de Cuba. Aqui os moldes após prensados são entregues às charuteiras que, a rigor, são as que executam a operação do capeamento. Estas operárias retiram, um a um, os tirulos prensados aplicando-lhes a capa com técnica adequada, conforme seja de esquerda ou de direita. Este setor é o que demanda maior tempo de treinamento na empresa, sendo ele o fator determinante da velocidade de produção da fábrica. 

A produção efetiva média diária é ao redor de 300 charutos capeados e para atingir tal índice se demanda um período de treinamento de meio ano. Esta etapa da produção é em geral a mostrada ao público seja em fotos, seja em catálogos, seja em feiras ou exposições. Mas ela, apesar de importantíssima, é apenas uma gota d’água no oceano de distintas atividades necessárias à produção de um puro, conforme o amigo está verificando. 

Após capeados os charutos retornam ao Setor de Prensas & Cortes para, como dizemos no jargão interno, serem “bitolados”, ou seja serem recortados no para o comprimento desejado. 

A seguir as produções diárias individuais das charuteiras são amarradas em maços de 50 unidades sendo inspecionadas e anotadas para fins de premiação. Observe que na mesa do controle de qualidade os charutos são revisados um a um sob todos os aspectos, rejeitando-se os que não atendam aos requisitos básicos para o produto. 

E já que estou lhe falando em descartes ou descargas de produção saiba que temos os seguintes índices médios de quebras até esta fase do processo. Do Setor de Tirulos para o Setor de Capeamento perdem-se cerca de 6% da produção inicial; deste até a embalagem, outros 5%. São números altos mas que se compreendem quando você verifica que todo o processo é artesanal. 

Uma vez analisada qualitativamente a produção dos charutos capeados, os mesmos, são novamente amarrados em lotes inspecionados de 50 unidades (médias-ruedas), sendo transportados, em bandejas de madeira, para esta sala fechada, com temperatura e umidade relativa controladas. Aqui ficam descansado para retirar-se o excesso de umidade, pois como o amigo verificou, as capas são usadas úmidas para permitir-lhes a necessária elasticidade. Como você está constatando fazer charutos é, básica e simplificadamente, botar água e retirar água, amarrar e desamarrar. 

Decorrido prazo que poderá variar de 24 a 48 horas os charutos estão devidamente condicionados, ou seja, estão com o grau de umidade corrigido e portanto, aptos à etapa subsequente que é a classificação cromática. 

Detalhe: somente após haverem passado pelo secador é que os charutos são relativamente “fumáveis”. Até então o excesso de umidade além de dificultar a “queima”, impede apreciar-se o “bouquet” do produto. Vale acrescentar que os charutos, em tal momento, estão ainda, digamos, muito frescos. Não maturaram o suficiente, não descansaram o bastante para que, de forma natural, ocorra o homogeneização do “blend”. Muitos fumadores exigem charutos “bem fresquinhos” mas devo afirmar que o esplendor de um bom charuto se ressalta após seu “envelhecimento” que ocorre, no mínimo, um mês após sua fabricação. 

Mas continuemos, abrindo parênteses para lhe falar um pouco sobre fumos capeiros. Saiba que ao se comprar as capas elegem-se determinados tamanhos, cores e cortes do fumo desejado. Tais cores podem variar do amarelo-esverdeado até os tons do castanho escuro, havendo toda uma complexa terminologia quanto à cromática dos fumos capeiros que, apesar de importante para os fabricantes, aos consumidores não interessa e por isso não irei abordá-las. 

O importante é que, depois de condicionadas, as “medias-rueadas” são desfeitas e os charutos são arrumados sobre esta grande mesa da Escolha Cromática, na qual podem ser processados até uns dois mil charutos. Vão se buscar neste grande lote as distintas nuances de cor que mais se assemelham. E, concomitantemente, nova inspeção é feita rejeitando-se os produtos que apresentem imperfeições que tenham passado desapercebidas pelo controle de qualidade dos setores anteriores, tais como defeitos nos cortes dos pés, capas soltas ou com pequenos defeitos, capas com manchas, etc. Os charutos descartados quando da seleção cromática também são chamados de rezagos, os quais, a depender do caso, podem refluir ao processo: sendo recortados para um comprimento menor, aproveitados para uma marca comercial de preços mais baixos, ou são destruídos. 

Feita a seleção cromática dos charutos reunem-se 25 unidades, ou 20 a depender do padrão de embalagem da bitola/marca sendo inspecionada, amarrando-as novamente. Serão os 25 “irmãos” a serem embalados na mesma caixa. Para usar-se termo em voga, persegue-se um resultado visual como se os produtos tivessem sido clonados. 

Restam ainda conhecer o departamento de embalagem, a fábrica de caixas e a expedição

Mas, para não ficar muito cansativo, vamos deixar para fazê-lo na próxima FUMAÇA MÁGICA quando concluiremos nossa visita à fábrica e veremos a identificação dos charutos para o distinto público. 

E para encerrar por hoje, nada melhor que outros bem humorados versos do magnífico cordelista Antônio Alves dos Santos

“Dizem que antigamente

Só para enganar os trouxas

O fabrico dos charutos

Só era feito nas coxas

Das mulheres que faziam

Pretas, morenas ou roxas.”


008.    VIAGEM A SÃO GONÇALO – 2ª PARTE

Continuemos nossa visita à fábrica de charutos da Menendez Amerino & Cia. Ltda. onde nascem os incomparáveis charutos Alonso Menendez e outras magníficas regalias. Agora vamos entrar no setor da produção propriamente dita, iniciando pelo Departamento de Fumos. 

Aqui são manipulados os fillers e suas ligas. O pessoal é informado do planejamento de consumo do dia seguinte abrindo então os fardos necessários, procedendo as mesclas e entregando-as, mediante pesos controlados, às tiruleiras

Por outro lado, aquele grupo de mulheres que você está vendo, sentadas em círculo tendo folhas de fumos espalmadas sobre as coxas, é a turma da Banca de Capas, setor também conhecido como Destalo & Molhado. Elas cuidam dos fumos capeiros e dos capotes. Abrem os fardos respectivos, nos quais, conforme o Amigo está vendo as folhas de fumo, prensadas, estão amarradas em pequenos molhos, aos quais denominamos manocas

Nesta outra sala fechada com alto grau de umidade ambiental as manocas são penduradas nestes varais para amaciarem, ou seja, serem umedecidas para que as folhas de fumo adquiram elasticidade e sejam, por conseguinte, manipuláveis sem romperem. 

Pegue esta “manoca” de capas umedecidas. Prenda a mesma entre as pernas. Escolha uma das folhas e a distenda com cuidado. 

Êpa, não é assim. Fumo não se lê pelo avesso, as veias devem ficar para baixo. 

Agora pressione a folha escolhida, gentilmente, de baixo para cima, com o dedo médio na sua parte avessa. Observe como o fumo, quando úmido, se torna elástico. Proceda da mesma forma nas duas bandas da folha. Note sua cromaticidade, seu brilho. Sinta a textura, o volume das veias. 

Muito trabalho? 

Pois saiba que isto é feito em cada uma das folhas dos fumos capeiros, pelo pessoal da Banca de Capas. 

Tal leitura individual irá determinar a classificação das capas. Lembre-se que fumo é um produto natural e que portanto, apesar da capa que estiver sendo aberta ter sido antes classificada pelo fornecedor, faz-se necessária nova e cuidadosa inspeção a nível de fábrica, subdividindo-a, agora, em três tipos básicos: 1º tipo, 2º tipo e rezagos. 

As do 1º tipo são as folhas de melhor uniformidade cromática, com menor quantidade de manchas e serão usadas nos charutos de bitolas maiores ou de linhas premium. As do 2º tipo se destinam aos charutos menores. 

Já os rezagos são as que fogem aos standards qualitativos da fábrica e que, portanto, não poderão ser usadas para capear os charutos de determinada(s) marca(s). Além disto, a depender da variedade do fumo capeiro, os rezagos poderão ser usados como capotes. Mas, esta não é a regra. Normalmente tais rezagos, assim como as veias centrais oriundas do destalo, são imprestáveis sendo computados apenas para fins de custeio da produção, ou seja, para o importantíssimo cálculo do rendimento líquido dos fumos. 

Feita a classificação o pessoal cuida do destalo. 

Note a técnica da retirada manual das veias centrais das folhas, uma a uma. Temos agora os dois lados, aos quais chamamos bandas e que, portanto, serão bandas de direita e bandas de esquerda

Porque a divisão? É fácil de entender e explicar. Quando visitarmos o setor do capeamento o Amigo notará que a divisão é necessária para que a charuteira saiba, no momento de capear, qual a direção a ser seguida. Se usasse todas as bandas no mesmo direcionamento, metade dos charutos ficaria com as capas enroladas pelo avesso. 

A propósito, vou aproveitar para alertar, se é que o Amigo ainda não saiba, quanto a um segredinho. Como identificar, prontamente, ao abrir-se uma caixa de charutos, se os mesmos foram capeados a máquina ou a mão? 

É facílimo. Se capeados a máquina as voltas das capas de todos os charutos estarão numa mesma direção. Porém se foram capeados a mão logo se irá notar que alguns “puros” estão com as capas enroladas no sentido direito e outros, no sentido esquerdo. 

Mas, continuemos observando o trabalho da turma da Banca de Capas. Veja que as bandas após classificadas são enroladas em pequenos amarrados cada qual com exatas 50 unidades. Note também que para os capotes, idênticas operações são executadas. 

Haja mão de obra! E olhe que mal estamos começando a conhecer um pouquinho do processo. 

Os amarrados das bandas dos capotes serão entregues às tiruleiras e os das capas, às charuteiras, sendo que o controle quantitativo dos mesmos nos permitirá auferir o consumo real e eventuais desperdícios. Não perca de vista que, especialmente as capas, são materiais de altíssimo custo, hoje na ordem de U$ 100.00 por quilo bruto, ou seja o fumo sem destalar. E, anote também que a operação de destalo representa uma perda ao redor de 23% do peso inicial. 

Hoje ficaremos por aqui. Afinal não temos tanta pressa e há, ainda, um incontável número de detalhes para você conhecer. 

Espero que sua viagem a São Gonçalo dos Campos esteja sendo de valia para melhor entender o quanto de perfeccionismo artesanal e de trabalho se escondem atrás de um puro. 

Na próxima FUMAÇA MÁGICA continuaremos nosso passeio pela fábrica.


007.    VIAGEM A SÃO GONÇALO – 1ª PARTE

“Como o forró nordestino, charuto também é cultura” - Carlos Heitor Cony

(in “Prazer e Charutos: bem-aventurados os puros”) (Folha de São Paulo, 18/07/97) 

Chegou a hora de iniciarmos nossa viagem pelo mundo encantado da produção de puros. Portanto, acenda seu charuto predileto pois é permitido fumar a bordo, aperte o cinto e relaxe. Vou trazê-lo para São Gonçalo dos Campos, em pleno Recôncavo Baiano. E Você vai me permitir, aqui recém chegado e antes de irmos até à fábrica, fazer uma breve apresentação do lugar pois sei que, muitas vezes, se perguntou “afinal, onde é que fica esta cidade?” 

Para sua primeira curiosidade tenho a resposta . “Porque dos Campos?”. “Terá sido algum santo especial distinto daquele Gonçalo português lá das bandas de Amarante?”

Nada disto. 

Esta paragem, pela primeira vez visitada pelo Amigo, que se situa numa altitude de 235 m com temperatura média de 24ºC, até 113 anos passados era uma freguesia pertencente à histórica cidade de Cachoeira. A região, por ser relativamente plana, era então conhecida por “Campos de Cachoeira”. A igreja matriz, já tricentenária, sempre fora consagrada a São Gonçalo. Com a emancipação política..... deu para entender

“Distância de Salvador?” Pertinho, 107 quilômetros nos separam da Capital,sendo 69 em linha reta. Mas muito mais próxima de nós está Feira de Santana, meio milhão de habitantes e uma das maiores cidades do Norte/Nordeste. São só 15 quilômetros, o que tem contribuído para São Gonçalo manter seu estado de pureza. (Detesto o termo estagnação). 

Avalie, não temos uma única loja de eletrodomésticos. O povo daqui adora ir à Feira. Aliás, dizem que em São Gonçalo, todo o dia é dia de feira. Segunda, terça, quarta, quinta e sexta....feira; sábado é o dia da feira e domingo o pessoal vai para Feira. 

“Táxis?” Pouquíssimos. Uns vinte, se muito. Em compensação, há quanto tempo Você não via tantas carroças? 

Notou que não temos ruas asfaltadas? Todas são, ainda, no antigo sistema de paralelepípedos. E as calçadas, aqui, chamam-se “passeios”. 

“Indústrias?” Além da fábrica de charutos para a qual estamos indo agora, a cidade conta com uma empresa beneficiadora e exportadora de tabaco e com a única indústria baiana de suco concentrado de laranjas. 

“Base econômica do município?” A agricultura de subsistência tradicional, mandioca, fumo e alguns haras e granjas avícolas no entorno. 

 “Infra-estrutura urbana?” Eu lhe diria que, exceção feita a boas instalações para abate de gado, no restante dispomos de tudo quanto aspire uma cidade decente. Uma razoável pousada com 15 apartamentos, prédios públicos dos três poderes, cine-teatro, biblioteca, centro de abastecimento, duas escolas de grau médio, biblioteca municipal, etc. Agora, não me pergunte se tudo funciona bem. Isto é outra história. 

“Habitantes?” Ao redor de 24 mil, dos quais uns 6 mil na sede e os restantes nos dois distritos e mais de quinze povoados rurais espalhados pelos 288 km2 do município. 

Bem, andando, andando, chegamos à fábrica de charutos da Menendez & Amerino.

Este campo em frente, plantado com fumo, pertence à empresa. Aqui são produzidas mudas para distribui-las a lavradores da região. 

O prédio, como Você está vendo, é antigo. Nele, nos anos 60 funcionava um armazém de beneficiamento de fumo em folhas para exportação. 

Vamos entrar? 

Não se surpreenda com a simplicidade de tudo. Nada de automatismos, mecanismos, e outros “ismos” ensurdecedores ou poluidores. O único ruído que se ouve é o do compressor que gera ar para o equipamento que produz as bolsas de celofane e aciona a máquina de pirogravação das caixas de madeira. 

Afora disto, nem parece que iremos nos deparar com mais de 150 empregados distribuídos pelos vários departamentos, os quais irei lhe mostrar e explicar. 

Antes porém vamos até à sala de nosso diretor, Félix Menendez para Você o conheça, tomarmos um cafezinho e filarmos um dos bons charutos da casa. 

Félix, cubano, 53 anos de idade e 18 de São Gonçalo é o homem que toca a fábrica. Acolhedor e gentil por natureza, tem prazer em falar sobre o que mais gosta na vida, puros e Você por certo, ficará encantado com seus conhecimentos do ramo. Asseguro-lhe que só o bate-papo com ele terá valido a viagem. 

E, enquanto tomamos o cafezinho saboreando este Alonso Menendez (ou Você prefere um Amerino?) antes de entrarmos no setor de produção, ouçamos o que Félix nos explicará sobre tipos, formatos e linhas de charutos. 

À primeira vista todos os charutos são iguais. E é de estranhar aos não iniciados como, com praticamente uma só matéria prima, genericamente chamada “fumo”, haja tantas variedades distintas de “puros”. 

Posso afirmar ser inesgotável a gama de variações quando se combinam diferentes “capas”, diferentes “capotes”, diferentes “fillers”, em diferentes diâmetros e diferentes comprimentos. O que tipifica a procedência fabricante é a eleição dos fumos usados em suas formulações onde se levam em conta as disponibilidades locais de matéria prima. 

Por isso, se a empresa se vocacionar para o mercado alemão, seus charutos necessariamente serão de capas "escuras”. Se direcionar suas vendas para o mercado norte-americano as capas serão “claras”. Isto não significa que qualquer fumo capeiro “claro” sirva, pois se computa a seguir, o importantíssimo item do sabor. Trata-se de uma equação cromático-gustativa imposta pelo mercado.  

Assim é que há fumos capeiros claros de variedades distintas, Java, Cameroon, Sumatra, Agro/Bahia, Connecticut, etc., e de variados sabores. O mercado norte-americano prefere, disparadamente o sabor da variedade Connecticut, capa usada por nossa empresa E, acombinação das capas Connecticut com fumos Brasil/Bahia, usados nos “capotes” e “fillers”, conferiu aos nossos produtos um balanço gustativo que, nos abriu espaço no enorme mercado norte-americano onde o Brasil sempre esteve estatisticamente ausente. Não se esqueça que as outras duas fábricas existentes no País, a Dannemann e a Suerdieck, são de históricas raízes germânicas e sempre dirigiram seus produtos para o mercado alemão. 

Quanto ao bitolário, ou melhor, a relação do comprimento versus o diâmetro, são múltiplas as combinações. No mercado internacional, charutos são especificados pelo comprimento em polegadas e pelo seu “ring” que corresponde a seu diâmetro em frações de 1/64 de polegada. 

Desta forma um charuto 6” x Æ 42 corresponde a um produto com 6 polegadas de comprimento por um diâmetro de 42/64 de polegada. Os comprimentos variam, em geral, de 4 ¼” podendo chegar até 8”. Os diâmetros mais solicitados variam de Æ 42 indo até Æ 52. A tendência do mercado norte-americano é consumir, cada vez mais os produtos maiores (acima de 6 ½”e de Æ.48). 

Às bitolas dos charutos, os fabricantes dão números ou nomes de fantasia. Assim os “puros” se tornam conhecidos ora com o nome de “Coronas”, ora com o nome de “Lonsdales”, ora como Nº 1, ora como Nº 4, e assim por diante . Pode acontecer até, que a mesma bitola, sob marcas comerciais distintas, do mesmo fabricante, tenha nomes diferentes. A questão é puramente mercadológica. 

Ante tantas variáveis de tamanhos ou seja, pesos finais dos produtos acabados, parece que as equações de custos seriam infindáveis. Mas, felizmente, as coisas são bem mais simples neste campo. Os custos de produção de bitolas distintas, numa mesma combinação de fumos, isto é, numa linha de charutos, são praticamente iguais. Os custos da mão de obra e os índices de produtividade entre o bitolário são os mesmos. O custo das capas é, na prática, estandardizado, vez que estas, compradas em quilos, são consumidas em folhas, correspondendo ½ folha para cada charuto. Restam os custos dos demais fumos, estes sim quantificados e rateados, proporcionalmente, em peso, pelo mix do bitolário produzido em cada linha. 

Que tal? Gostou dos esclarecimentos? Não lhe dissera que Félix passa horas falando, prazerosamente, sobre charutos? 

Bem, conversamos, conversamos, o tempo passou, a sirene tocou, a fábrica está encerrando o expediente e o pessoal está batendo o ponto. Já são 16:50 horas. 

Menos mal que Você não veio a São Gonçalo para ficar só um dia. E, se não quiser ir pernoitar em Salvador ou Feira, sugiro que fique na nossa Pousada do Centenário. Se ficar, vai gostar. Casa simples, comida boa, bebida honesta, puros e seu proprietário, um galego chamado Lino Bouzas, gosta de prosa e de receber amigos. E, Félix e eu, lhe faremos companhia até lá pelas tantas. Afinal, não é todo dia que recebemos visitas gratificantes como a sua. 

Na próxima FUMAÇA MÁGICA continuaremos nossa viagem. Até lá, fique com meu cordial abraço

 

VIAGEM A SÃO GONÇALO – 2ª PARTE

Continuemos nossa visita à fábrica de charutos da Menendez Amerino & Cia. Ltda. onde nascem os incomparáveis charutos Alonso Menendez e outras magníficas regalias. Agora vamos entrar no setor da produção propriamente dita, iniciando pelo Departamento de Fumos. 

Aqui são manipulados os fillers e suas ligas. O pessoal é informado do planejamento de consumo do dia seguinte abrindo então os fardos necessários, procedendo as mesclas e entregando-as, mediante pesos controlados, às tiruleiras

Por outro lado, aquele grupo de mulheres que você está vendo, sentadas em círculo tendo folhas de fumos espalmadas sobre as coxas, é a turma da Banca de Capas, setor também conhecido como Destalo & Molhado. Elas cuidam dos fumos capeiros e dos capotes. Abrem os fardos respectivos, nos quais, conforme o Amigo está vendo as folhas de fumo, prensadas, estão amarradas em pequenos molhos, aos quais denominamos manocas

Nesta outra sala fechada com alto grau de umidade ambiental as manocas são penduradas nestes varais para amaciarem, ou seja, serem umedecidas para que as folhas de fumo adquiram elasticidade e sejam, por conseguinte, manipuláveis sem romperem. 

Pegue esta “manoca” de capas umedecidas. Prenda a mesma entre as pernas. Escolha uma das folhas e a distenda com cuidado. 

Êpa, não é assim. Fumo não se lê pelo avesso, as veias devem ficar para baixo. 

Agora pressione a folha escolhida, gentilmente, de baixo para cima, com o dedo médio na sua parte avessa. Observe como o fumo, quando úmido, se torna elástico. Proceda da mesma forma nas duas bandas da folha. Note sua cromaticidade, seu brilho. Sinta a textura, o volume das veias. 

Muito trabalho? 

Pois saiba que isto é feito em cada uma das folhas dos fumos capeiros, pelo pessoal da Banca de Capas. 

Tal leitura individual irá determinar a classificação das capas. Lembre-se que fumo é um produto natural e que portanto, apesar da capa que estiver sendo aberta ter sido antes classificada pelo fornecedor, faz-se necessária nova e cuidadosa inspeção a nível de fábrica, subdividindo-a, agora, em três tipos básicos: 1º tipo, 2º tipo e rezagos. 

As do 1º tipo são as folhas de melhor uniformidade cromática, com menor quantidade de manchas e serão usadas nos charutos de bitolas maiores ou de linhas premium. As do 2º tipo se destinam aos charutos menores. 

Já os rezagos são as que fogem aos standards qualitativos da fábrica e que, portanto, não poderão ser usadas para capear os charutos de determinada(s) marca(s). Além disto, a depender da variedade do fumo capeiro, os rezagos poderão ser usados como capotes. Mas, esta não é a regra. Normalmente tais rezagos, assim como as veias centrais oriundas do destalo, são imprestáveis sendo computados apenas para fins de custeio da produção, ou seja, para o importantíssimo cálculo do rendimento líquido dos fumos. 

Feita a classificação o pessoal cuida do destalo. 

Note a técnica da retirada manual das veias centrais das folhas, uma a uma. Temos agora os dois lados, aos quais chamamos bandas e que, portanto, serão bandas de direita e bandas de esquerda

Porque a divisão? É fácil de entender e explicar. Quando visitarmos o setor do capeamento o Amigo notará que a divisão é necessária para que a charuteira saiba, no momento de capear, qual a direção a ser seguida. Se usasse todas as bandas no mesmo direcionamento, metade dos charutos ficaria com as capas enroladas pelo avesso. 

A propósito, vou aproveitar para alertar, se é que o Amigo ainda não saiba, quanto a um segredinho. Como identificar, prontamente, ao abrir-se uma caixa de charutos, se os mesmos foram capeados a máquina ou a mão? 

É facílimo. Se capeados a máquina as voltas das capas de todos os charutos estarão numa mesma direção. Porém se foram capeados a mão logo se irá notar que alguns “puros” estão com as capas enroladas no sentido direito e outros, no sentido esquerdo. 

Mas, continuemos observando o trabalho da turma da Banca de Capas. Veja que as bandas após classificadas são enroladas em pequenos amarrados cada qual com exatas 50 unidades. Note também que para os capotes, idênticas operações são executadas. 

Haja mão de obra! E olhe que mal estamos começando a conhecer um pouquinho do processo. 

Os amarrados das bandas dos capotes serão entregues às tiruleiras e os das capas, às charuteiras, sendo que o controle quantitativo dos mesmos nos permitirá auferir o consumo real e eventuais desperdícios. Não perca de vista que, especialmente as capas, são materiais de altíssimo custo, hoje na ordem de U$ 100.00 por quilo bruto, ou seja o fumo sem destalar. E, anote também que a operação de destalo representa uma perda ao redor de 23% do peso inicial. 

Hoje ficaremos por aqui. Afinal não temos tanta pressa e há, ainda, um incontável número de detalhes para você conhecer. 

Espero que sua viagem a São Gonçalo dos Campos esteja sendo de valia para melhor entender o quanto de perfeccionismo artesanal e de trabalho se escondem atrás de um puro. 

Na próxima FUMAÇA MÁGICA continuaremos nosso passeio pela fábrica.

 

VIAGEM A SÃO GONÇALO – 3ª PARTE

“Tem moça que quando vê

Um charuto, perde o prumo

E diz: com esta fumaça

Eu nunca me acostumo...

Mas quando está namorando,

Tá doida p’ra levar fumo”.

(Antônio Alves da Silva,cordelista de Feira de Santana - BA)

Antes de continuarmos nosso passeio pela fábrica, interrompido na FUMAÇA MÁGICA 08, ocasião em que conhecêramos o Departamento de Fumos e a Banca de Capas, atendendo pedido de atento leitor, deixe-me esclarecer como identificar nas embalagens, o processo de produção. 

Nas caixas de charutos cubanos, entre outras, podemos encontrar três distintas menções:

1) totalmente hecho a mano, 2) hecho a mano, ou 3) hecho en Cuba.

É bom saber distingui-las. A primeira delas é clara por si mesma. A segunda se refere a charutos capeados a mão usando-se tirulos (bunches) feitos mecanicamente com equipamentos de alta produção. A terceira significa que todo o processo de fabricação é mecanizado. 

Já na terminologia norte-americana os correspondentes, respectivamente, são:

1) hand made, 2) hand rolled, ou 3) machine-made.

Como se vê, os termos usados em USA são bem mais auto-explicativos e não deixam margem a dúvidas. 

Quanto aos fabricantes brasileiros, em geral não têm se preocupado em fazer tais distinções nas embalagens comercializadas no mercado interno. O que é compreensível pois sendo um mercado de reduzidas dimensões é pouco sofisticado. E mais ainda pelo fato que, originariamente, todos os charutos nacionais eram feitos à mão.

Isto esclarecido prossigamos conhecendo um pouco mais da fabricação de puros a mão reiniciando por este setor onde trabalham cerca de 50 empregados, mulheres na sua imensa maioria: o Departamento de Tirulos

É aqui que cada operadora, conforme o Amigo está vendo, dispõe de pequena maquineta manual que lhe permite envolver os fillers com o capote. Os fillers são usados na quantidade necessária para se obter o diâmetro especificado para o charuto final. Os tirulos são a alma dos charutos. As produções individuais são acompanhadas constantemente, via controles dos pesos e dos diâmetros de acordo com standards internos. Verifique que se requer extrema habilidade tátil e muito treinamento para se direcionar os capotes na esteira da maquineta (recorde que há os de esquerda e os de direita), evitando-se que os fumos se rompam ou sejam usados pelo avesso. Cada operadora tem sua produção diária controlada para fins de percepção de prêmios de produção sempre que ultrapasse as tarefas mínimas estipuladas pela empresa. E, para que o amigo tenha uma melhor idéia do quanto de mão de obra é consumida para se produzir um puro, saiba que, neste departamento, o índice diário médio de eficiência é da ordem de 310 tirulos por operadora.

Os tirulos revisados agora seguem para o Departamento de Prensas & Cortes. É aquele pessoal ali no meio desta ala fábrica rodeado de pilhas de moldes de charutos. Ali os tirulos são cortados na extremidade que corresponderá ao bico do futuro charuto e em seguida, já acomodados nos moldes, cada qual com capacidade para dez unidades, são submetidos à operação de prensagem por duas horas no mínimo. Observe que os moldes não são apanhados ao acaso. Como variam os diâmetros dos charutos, também variam os moldes. Por isso os responsáveis pela programação da produção têm que ter pleno conhecimento das inter-relações departamentais, caso contrário a coisa vira “samba do crioulo doido”: ora faltarão tirulos, ora faltarão moldes, ora teremos tirulos porém não no comprimento desejado, etc. etc. Além disto maior cuidado e conhecimentos ainda, são exigidos pois dois tirulos absolutamente iguais poderão ser de formulações distintas e, portanto, se destinam a charutos diferentes. 

Agora nos desloquemos para a área adjacente, onde estão outras tantas mulheres trabalhando em bancadas semelhantes às do Departamento de Tirulos. É o setor do capeamento o qual, internamente é também conhecido como “galera”, termo advindo de Cuba. Aqui os moldes após prensados são entregues às charuteiras que, a rigor, são as que executam a operação do capeamento. Estas operárias retiram, um a um, os tirulos prensados aplicando-lhes a capa com técnica adequada, conforme seja de esquerda ou de direita. Este setor é o que demanda maior tempo de treinamento na empresa, sendo ele o fator determinante da velocidade de produção da fábrica. 

A produção efetiva média diária é ao redor de 300 charutos capeados e para atingir tal índice se demanda um período de treinamento de meio ano. Esta etapa da produção é em geral a mostrada ao público seja em fotos, seja em catálogos, seja em feiras ou exposições. Mas ela, apesar de importantíssima, é apenas uma gota d’água no oceano de distintas atividades necessárias à produção de um puro, conforme o amigo está verificando. 

Após capeados os charutos retornam ao Setor de Prensas & Cortes para, como dizemos no jargão interno, serem “bitolados”, ou seja serem recortados no para o comprimento desejado. 

A seguir as produções diárias individuais das charuteiras são amarradas em maços de 50 unidades sendo inspecionadas e anotadas para fins de premiação. Observe que na mesa do controle de qualidade os charutos são revisados um a um sob todos os aspectos, rejeitando-se os que não atendam aos requisitos básicos para o produto. 

E já que estou lhe falando em descartes ou descargas de produção saiba que temos os seguintes índices médios de quebras até esta fase do processo. Do Setor de Tirulos para o Setor de Capeamento perdem-se cerca de 6% da produção inicial; deste até a embalagem, outros 5%. São números altos mas que se compreendem quando você verifica que todo o processo é artesanal. 

Uma vez analisada qualitativamente a produção dos charutos capeados, os mesmos, são novamente amarrados em lotes inspecionados de 50 unidades (médias-ruedas), sendo transportados, em bandejas de madeira, para esta sala fechada, com temperatura e umidade relativa controladas. Aqui ficam descansado para retirar-se o excesso de umidade, pois como o amigo verificou, as capas são usadas úmidas para permitir-lhes a necessária elasticidade. Como você está constatando fazer charutos é, básica e simplificadamente, botar água e retirar água, amarrar e desamarrar. 

Decorrido prazo que poderá variar de 24 a 48 horas os charutos estão devidamente condicionados, ou seja, estão com o grau de umidade corrigido e portanto, aptos à etapa subsequente que é a classificação cromática. 

Detalhe: somente após haverem passado pelo secador é que os charutos são relativamente “fumáveis”. Até então o excesso de umidade além de dificultar a “queima”, impede apreciar-se o “bouquet” do produto. Vale acrescentar que os charutos, em tal momento, estão ainda, digamos, muito frescos. Não maturaram o suficiente, não descansaram o bastante para que, de forma natural, ocorra o homogeneização do “blend”. Muitos fumadores exigem charutos “bem fresquinhos” mas devo afirmar que o esplendor de um bom charuto se ressalta após seu “envelhecimento” que ocorre, no mínimo, um mês após sua fabricação. 

Mas continuemos, abrindo parênteses para lhe falar um pouco sobre fumos capeiros. Saiba que ao se comprar as capas elegem-se determinados tamanhos, cores e cortes do fumo desejado. Tais cores podem variar do amarelo-esverdeado até os tons do castanho escuro, havendo toda uma complexa terminologia quanto à cromática dos fumos capeiros que, apesar de importante para os fabricantes, aos consumidores não interessa e por isso não irei abordá-las. 

O importante é que, depois de condicionadas, as “medias-rueadas” são desfeitas e os charutos são arrumados sobre esta grande mesa da Escolha Cromática, na qual podem ser processados até uns dois mil charutos. Vão se buscar neste grande lote as distintas nuances de cor que mais se assemelham. E, concomitantemente, nova inspeção é feita rejeitando-se os produtos que apresentem imperfeições que tenham passado desapercebidas pelo controle de qualidade dos setores anteriores, tais como defeitos nos cortes dos pés, capas soltas ou com pequenos defeitos, capas com manchas, etc. Os charutos descartados quando da seleção cromática também são chamados de rezagos, os quais, a depender do caso, podem refluir ao processo: sendo recortados para um comprimento menor, aproveitados para uma marca comercial de preços mais baixos, ou são destruídos. 

Feita a seleção cromática dos charutos reunem-se 25 unidades, ou 20 a depender do padrão de embalagem da bitola/marca sendo inspecionada, amarrando-as novamente. Serão os 25 “irmãos” a serem embalados na mesma caixa. Para usar-se termo em voga, persegue-se um resultado visual como se os produtos tivessem sido clonados. 

Restam ainda conhecer o departamento de embalagem, a fábrica de caixas e a expedição

Mas, para não ficar muito cansativo, vamos deixar para fazê-lo na próxima FUMAÇA MÁGICA quando concluiremos nossa visita à fábrica e veremos a identificação dos charutos para o distinto público. 

E para encerrar por hoje, nada melhor que outros bem humorados versos do magnífico cordelista Antônio Alves dos Santos

“Dizem que antigamente

Só para enganar os trouxas

O fabrico dos charutos

Só era feito nas coxas

Das mulheres que faziam

Pretas, morenas ou roxas.”

 

VIAGEM A SÃO GONÇALO – 4ª PARTE

Cá estamos nós, em São Gonçalo dos Campos para concluirmos nossa visita à fábrica dos famosos Alonso Menendez e Amerino. Conforme se recorda havíamos percorrido a produção de puros até a etapa da classificação cromática, quando se escolhiam os irmãos da mesma caixa. 

Pois bem, após este rápido cafezinho, não percamos mais tempo. Antes de continuarmos na ala da produção, nos dirijamos para o setor da fabricação das caixas de madeira. Vamos lá? 

Este primeiro depósito pelo qual estamos passando é a área de estocagem de fumos enfardados. A seguir temos o Almoxarifado de matérias-primas em geral (exceto fumos) onde, como você vê, há uma enormidade de itens em sua grande maioria, materiais de embalagem. 

Agora, chegamos na carpintaria onde trabalham 15 empregados. É uma fábrica dentro da fábrica. Observe que só trabalhamos com cedro em pranchas e em lâminas de compensado. Aquelas são usadas para a confecção das caixas ditas “de luxo” e estas, recebidas em diversas espessuras, para a maioria das caixas vendidas no País e no Exterior. 

Historicamente o cedro tem sido considerado a madeira por excelência para acondicionamento dos charutos. Seu odor característico “casa” à perfeição com o aroma dos tabacos resultando numa simbiose que a todos agrada.  

Quantas e quantas vezes o Amigo já viu alguém, após abrir uma caixa de charutos , de forma quase que intuitiva, levá-la até às narinas e aspirar, com prazer, o aroma que se desprende da caixa recém-aberta? Pois observe que, a rigor em tal momento, especialmente se os charutos estiverem celofanados estaremos nos deliciando muito mais com o aroma do cedro do que com o dos charutos. 

Aqui vale também registrar outra observação interessante. Lembra-se quando lhe falei que um charuto necessita no mínimo de um mês de repouso, para que adquira seu esplendor gustativo? Pois note que haverá sensível diferença se os charutos não celofanados estiverem ou não guardados numa caixa de cedro. Nestas, após certo tempo ocorrerá uma interpenetração de odores. Resultado: um sabor distinto. Nem melhor, nem pior. Apenas diferente. 

É claro que se passando muito tempo, melhor dizendo, muitos anos o gosto do charuto ficará prejudicado. Eu mesmo já tive oportunidade de fumar um deles que estava embalado por mais de vinte anos O produto perdera seu aroma característico. Parecia que estava fumando somente cedro. 

“O Brasil é o país.

Sem exageros astutos.

O único que usa o cedro

Para encaixar seus charutos

Exportando para Europa,

Enaltece seus produtos.”

(Antônio Alves da Silva - cordelista e poeta popular de Feira de Santana)

Exagero poético à parte a verdade é que o Brasil é dos pouquíssimos países que ainda usam o cedro, cada vez mais escasso. Dita madeira vem sendo substituída por outras, mais baratas, como a virola por exemplo. 

Mas aqui na fábrica só trabalhamos com o velho e famoso cedro, cujo aroma inebria a carpintaria. Há, é verdade outras madeiras, em lâminas de 0,6 mm tais como a imbuia o freijó, a cerejeira, a sucupira e o mogno, que são usadas para revestimento externo das caixas de luxo as quais como você está vendo, são essencialmente artesanatos. A ponto de muitos duvidarem que as mesmas sejam fabricadas por nós. Verdadeiras obras de arte formam composições de matizes policromáticas, usando-se, madeira distintas, compondo caprichosos desenhos na tampa das caixas.Vale a pena você ter uma delas, em sua casa com seu nome gravado, para obsequiar seus amigos. E, como um presente especial, nada as supera em classe, distinção e bom gosto.

Lembre-se disto. 

Bem, no restante aqui na carpintaria vale você também notar o quanto de trabalho se consome na montagem de caixas e em especial na colocação das dobradiças e fechos com os balmazes, estes mini-pregos latonados. Observe que para tanto usamos mão de obra feminina pois é um trabalho delicado e requer muita paciência. 

As caixas, após aprontadas e inspecionadas, seguem para o setor de embalagem dos charutos para onde vamos agora. Antes, tomemos outro cafezinho e um copo d’água gelada pois a primavera chegou com um calor recalcitrante. São os primeiros efeitos locais do El Niño.

Estamos agora no setor do “Anelado” onde os charutos são identificados para o distinto público. Neste departamento os puros já pré-escolhidos receberão o anel respectivo e serão celofanados, quando for o caso. “Anelar” implica também em saber escolher a “cara” do charuto pois, por mais uniforme que tenha sido a elaboração, os charutos sempre têm uma “cara”, que é o melhor do seus lados.

Após anelados e celefonados os produtos são embalados nas suas caixas específicas as quais externamente contém gravadas a marca comercial (nome do produto), a quantidade, o nome de fantasia da bitola (e a depender de exigências do cliente, as medidas) e o nome o fabricante.

 

Daí as caixas cheias são levadas para a câmara frigorífica para o processo de esterilização onde permanecem por prazos de 24/48 horas a uma temperatura de 10º C negativos. O congelamento da massa esteriliza os eventuais ovos da “lasioderma serricorne”, vulgarmente conhecida como “bicho do fumo” impedindo sua posterior eclosão que causaria o conhecido problema de charutos que apresentam perfurações.

 

Verifique, agora, estas caixas que estão sendo retiradas da câmara frigorífica. As ditas já sofreram o processo de congelamento e estão sendo levadas para aquele mesmo setor de secagem, por onde eles passaram logo que foram capeados. Trata-se do “recondicionamento ” para devolve-las a temperatura ambiente, após o qual tornam a voltar para o setor de acabamento final da embalagem.

 

Acabou o processo? Ainda não mas falta muito pouco, como você verá a seguir.

 

No setor de embalagem as caixas são reinspecioanadas, fechadas e têm apostos, a depender do caso, rótulos e etiquetas outras exigidas pelo cliente ou por determinações legais (a depender do país de destino). Procede-se a seguir a celofanagem das caixas, empacotando-as, uma a uma, com papel transparente.

 

Tudo aprontado, agora na Expedição, este setor onde acabamos de entrar, onde a temperatura e umidade relativa do ar são controladas, os produtos permanecem armazenados nas caixas máster (caixas de papelão) aguardando que Você nos dê a honra de sua preferência.

Bem, concluímos nossa visita as instalações e espero que sua vinda à São Gonçalo dos Campos haja valido a pena. Você por acaso sabia que aqui recebemos muito mais visitas de estrangeiros do que de brasileiros? Trata-se simplesmente da confirmação de tudo quanto lhe tenho dito quanto à importância do mercado externo para nossos negócios. 

Gratíssimo por seu interesse e até a próxima FUMAÇA MÁGICA, com mais informações sobre o maravilhoso mundo dos charutos. 

Encerrando, destaquem-se as palavras de Carlos Heitor Cony: 

Depois dos havanas , os únicos charutos confiáveis são os brasileiros. Brasil e Cuba se parecem na comida, na música, raízes africanas e no gosto pelo rebolado”.


006.    A GUARDA DOS PUROS

Hoje conversaremos sobre a guarda dos puros e sobre charutos “duros”. Produto do reino vegetal que não “morre” após seco e fermentado, o tabaco ao se transformar num puro causa surpresas aos que não estão muito afeitos às suas particularidades.

Na crônica anterior ao falar dos prazeres sensitivos de degustá-los tratei das sensações táteis. Agora gostaria de esclarecer, a propósito das ditas, conceito expresso por alguns consumidores que, desejando interpretar um “defeito” de fabricação, a rigor estão transmitindo uma das características que os charutos podem, eventualmente, apresentar. É quando afirmam, baseados apenas no teste tátil, que os charutos estão duros, sem antes os haverem provado.

Incorre-se numa confusão dos sentidos associando-se ao fato dos charutos estarem duros, uma eventual dificuldade de aspiração. A rigor, um alto grau de rigidez em si mesmo, não é atributo que possa desclassificar o produto. O importante é seu peso relativo.

Podemos encontrar charutos duríssimos e excelentes. Basta apenas que tenham sido muito prensados, estejam relativamente secos, mas que contenham a quantidade exata (peso) de tabaco para sua respectiva bitola.

De modo reverso, poderá haver charutos brandos, macios e simplesmente infumáveis (desculpe o neologismo, foi que lembrei de imexível). Basta que estejam relativamente úmidos e que contenham quantidade excessiva de tabaco em seu filler. Devo, a bem da verdade, abrir aqui um parênteses para explicar que poderá acontecer o caso, raro, de um charuto com peso correto não ser aspirável: ocorre quando, num defeito da confecção do filler, a charuteira torça de forma inadequada os fumos do mesmo, provocando uma espécie de “nó” no interior do charuto.

O fumante experiente e fiel a uma dada marca/bitola sabe disto. Com o passar do tempo ele reconhece (e associa) o “sentir” o peso, quando das sensações táteis. O peso específico e não sua rigidez é, portanto, o que determina se um charuto é aspirável ou não.

E como guardá-los de forma adequada?

Dita a regra que as condições ideais para estocagem se situam em temperatura ao redor de 24/25º C e umidade relativa do ar em torno de 65/70%. Binômio que é lógico não se encontra em grande parte do território nacional. De tais condições a umidade relativa do ar é a mais importante. Climas secos como o de Brasília ou úmidos como o de Manaus, p. ex., são igualmente danosos aos charutos.

Reduzidas taxas de umidade relativa do ar desumidificam os puros ressecando-os, esfarelando ao cortar-se o bico, soltando e partindo as capas. A queima transcorre normalmente mas o sabor fica prejudicado.

Já no caso inverso, por ser o tabaco muito higroscópico, os charutos ficam “moles” (pode-se até curvá-los, sem parti-los), podem mofar, a aspiração fica dificultada, a combustibilidade é péssima e o sabor também é alterado. Para pior. E se o charuto estiver mofado fica imprestável para o consumo.

Ambientes com ar condicionado, desde que os charutos fiquem protegidos (em suas caixas preferencialmente), em geral, favorecem a guarda por prazos ao redor de 30 a 60 dias. Na ausência de condições ambientais adequadas ou na falta de umidores especiais e na hipótese da manutenção de estoques por largos períodos, a solução recomendada é o freezer ou mesmo o refrigerador.

Há entretanto que se considerar que, além da higroscopia, os tabacos têm a propriedade de absorver, com extrema facilidade, os odores circundantes. Por isso deve-se protege-los com envoltório plástico selado, antes de refrigerá-los ou congelá-los para estocagem por longo prazo.

Tal sistema, além de manter intactas as características dos puros, também tem a vantagem de impedir a eclosão, promovendo a esterilização, de eventuais ovos de lasioderma presentes no fumo que poderiam causar perfurações no corpo dos charutos.

Congelados os puros poderão durar anos a fio e, no momento de consumi-los, manda a regra retirá-los com razoável antecedência (mínima de 24 horas) deixando-os descansar na embalagem plástica selada, até que a massa adquira a temperatura ambiental. Este processo poderá ser acelerado, com cautela, deixando-os num ambiente com umidade relativa reduzida. E aí, a regra variará. Se estivermos no Planalto Central, ao ar livre. Se estivermos num dia invernoso dos pampas gaúchos, na sala aquecida pela lareira ou pela estufa elétrica.

Assim, devidamente recondicionados, os charutos estarão com todo seu frescor inicial, prontos para concederem o inefável prazer da sua fumaça mágica.

Prometendo em minha próxima Fumaça iniciar sucinta descrição do processo de manufatura dos charutos by Menendez (desculpe o anglicanismo, acho que a novela “A Indomada” tem algo a ver) fico por aqui.

005.    PRAZERES SENTIDOS

Todos intuímos o que é prazer. Nem sempre sabemos defini-lo. “Prazer é dar satisfação aos sentidos”.

Nossos sentidos são a porta de entrada das sensações que nos rodeiam. Logo, um prazer é tão mais completo, quanto maior número de sentidos se fizer presente. Não é sem razão que ao beber, brindamos batendo as taças entre si ou tilintamos os cubos de gelo contra as paredes do copo. Estamos incorporando ao ato, de forma intuitiva, o único sentido ausente na bebida. Estamos, literalmente, intensificando o prazer de beber.

Contava meu pai que por tal motivo, à expressão “Saúde!”, nos seus primórdios, se sucediam as palavras “e que Deus conserve os nossos cinco sentidos”

No ritual prazeroso de se desfrutar as delícias de um puro , ocorre o mesmo.

Primeiro o prazer visual. O apreciar da cromaticidade da capa, do esmero na feitura do bico, do anel e do retirá-lo no momento certo, do se descobrir se foi capeado a mão, a escolha, entre muitos, daquele charuto para ser fumado naquele momento. Escolha à qual se mescla o prazer tátil. O dedilhar, o apalpar de cima abaixo. O perceber-se, pelo tato, da uniformidade do seu filler, o sentir da maciez e do condicionamento. O “ver” por dentro.

E haja sensação! Agora, com o ingresso das etapas gustativo-olfativas.

O dar candela ao charuto após haver cortado seu bico de forma plena ou em formato de bisel. Com bela chama, girando o charuto nos lábios, umedecendo-o discretamente, aspirar com cadência, dando uniformidade à brasa.

É rito que requer paciência e longo aprendizado.

Depois se sentir a doçura do bom tabaco, inebriando a boca, degustando a fumaça. E nada de degluti-la, pois os prazeres gustativos estão no palato e nas vias respiratórias superiores.

Enquanto isto olhos ligados na cinza que vai se formando, cada charuto é uma história à parte, e narinas sintonizadas no esplêndido aroma que, quando o produto é de qualidade, vence as barreiras dos mais ardorosos anti-tabagistas. 

Recordo fato ocorrido com uma de minhas filhas. Quando criança, ao lhe indagarem “A fumaça dos charutos de teu pai não te incomoda?”, respondeu prontamente: “Não! charuto tem cheiro de pai em casa!”. Uma verdadeira declaração de amor. Tanto que aos cinco prazeres, para mim desde então, se incorporou um sexto indefinível. Mora na minha cabeça. E sei que você entende do que falo. Por isso me permito a confidência. 

E onde anda o prazer auditivo?

Após a eleição tátil-visual, antes de acender, levar-se o charuto próximo ao ouvido, girando-o e apalpando-o. Perceber discretíssimos estalidos na capa que revelarão se o grau de umidade do produto está adequado. Estalidos fortes: charutos muitos secos. Ausência de estalidos: charutos úmidos. Há que se recondicioná-los. E, como descobrir os estalidos certos? Praticando, praticando, praticando. 

E a prática deve ser cadenciada. Da mesma maneira como se degusta um bom charuto. Sentindo seus prazeres. 


004.    INDIVIDUALIDADE E ORIGINALIDADE

O vocábulo charuto conceituável como “um rolo de folhas secas de fumo, preparado para fumar-se”, com tal grafia, está registrado em nosso idioma, por volta do ano 1831. Antes escrevia-se charoto, sendo uma absorção da palavra inglesa cherrot, derivada do tâmul shuruttu (rolo de tabaco) .

Oportuno registrar que a palavra inglesa cherrot subsiste naquele idioma, não para designar genericamente charutos, aos quais chamam cigars, e sim especificamente a determinados tipos de charutos, mais simples e mais populares que, no Brasil, chamaríamos charutilhos (produtos rústicos, sem cabeça formatada, levemente cônicos: uma espécie de “home-made smokes”).

Quanto ao termo inglês cigar, acredita-se tenha se derivado da palavra maia sigar, que ingressando no idioma espanhol transformou-se em cigarros a qual, para os hispânicos, continua significando charutos.

O fumo, como se recorda, é americano. Ingressou nas cortes européias pelas mãos do embaixador francês em Lisboa, Jean Nicot (1530-1606), que enviou sementes de tabaco para a rainha Catarina de Médicis, em 1560. Aliás, foi de Nicot que derivou o vocábulo nicotina, batizando-se assim o alcalóide existente nas folhas de fumo.

Registradas tais curiosidades etimológicas, retornemos a nosso bate-papo interrompido pela FUMAÇA MÁGICA 03, quando lhe enviei pequeno glossário da indústria charuteira. Vamos, agora, tentar resumir as diferenças básicas entre os charutos dos continentes americano e europeu.

Devo informar, de antemão, que os aspectos diferenciais são de ordem genérica e não excludentes. São linhas mestras que caracterizam os universos produtores, sem significar que os perfis característicos de um deles não possam ser encontráveis no outro.

O fundamento da grande diferença está no conceito “hand-made”. Feitos à mão. A pedra de toque que unge os charutos de alta classe.

Quando feitos à mão, sabe-se que os charutos, via de regra, foram manufaturados em regiões menos desenvolvidas (mão de obra mais barata) e são consumidos em regiões de poder aquisitivo elevado.

O exemplo brasileiro se insere no que ocorre no contexto mundial: o grande centro consumidor nacional reside no eixo Rio-São Paulo, onde não se encontra nenhum fabricante. E os europeus, ao internalizarem a produção charuteira, dado ao alto custo da sua mão de obra, não tiveram outra alternativa se não mecanizá-la. O mesmo ocorreu nos Estados Unidos. Mecanização plena da produção interna ou concentração de suas unidades produtoras de “hand-made” em países tais como República Dominicana, Panamá, Honduras, etc.

Mecanizando-se a produção ajustes foram necessários na estrutura dos “fillers” os quais, em lugar de serem compostos por folhas inteiras de tabaco, passaram a sê-lo com folhas recortadas. Conseqüência também do processo mecanizado, os “bicos” dos charutos, cuja feitura requer extrema habilidade manual para obter-se o formato semi-esférico, perderam sua característica original, passando a ser discretamente pontiagudos.

Por considerar importante, assinalo que ser feito à mão, no caso de charutos, não retrata o conceito de qualidade e sim os de individualidade e originalidade, embora estes dois últimos pressupostos arrastem consigo, o primeiro deles. É a regra, embora a bem da verdade, devo esclarecer que pode haver excelentes charutos feitos à máquina e péssimos charutos feitos à mão. Mas, na premissa de qualidades equivalentes, os “hand-made” têm o “appeal” da individualidade. Elegem-nos aqueles iniciados que preferem o original de uma obra de arte a uma de suas reproduções.

São os preferidos pelos consumidores que associam ao gosto de fumar, os prazeres olfativos, tácteis, visuais e, por que não? auditivos, que se lhe incorporam e sobre os quais falarei proximamente.

003.    GLOSSÁRIO

Em meus escritos lanço mão, muitas vezes, de alguns termos exóticos ou técnicos, não familiares aos não iniciados na produção charuteira ou mesmo, a muitos apreciadores de charutos.

Tais palavras ora foram pinçadas da língua inglesa; ora fazem parte do linguajar regional, digeridas há mais de um século no Recôncavo Baiano, tradicional região produtora de fumos/charutos; ora são vocábulos introduzidos por técnicos cubanos que aqui se instalaram em 1977, de uso corrente nas manufaturas e campos de tabacos de seu país de origem, muitos dos quais se aportuguesaram e passaram a integrar nosso dialeto.

Não pretendendo, nem de longe, esgotar o vocabulário do ramo e me atendo às palavras de uso mais corrente, elaborei um pequeno glossário o qual, prazerosamente, reproduzo ao final.

Não registro etimologias ou origens dos termos, mesmo porque não é tal o objetivo. Pretendo apenas facilitar a leitura e o entendimento daqueles que se debruçam sobre meus textos.

A par disto, este ensaio alfabético não deixa de ser um rico atestado da interligação de culturas no mundo dos charutos. Do qual participo com extremada satisfação e alegria.

 

ANELADO Setor fabril onde se colocam os anéis dos charutos.
BAJO-TELA Diz-se dos fumos capeiros plantados com sombreamento artificial (gases acrílicas ou telas de nylon) o qual objetiva reduzir a incidência dos raios solares sobre as plantas, garantindo-lhes maior uniformidade cromática e melhor textura.
BANDAS Diz-se dos dois lados de uma mesma folha de tabaco após ter sido submetida à operação do “destalo”. Assim sendo há “bandas de direita “e “bandas de esquerda”.
BICO A parte superior do charuto que corresponde àquela pela qual o fumante aspira o produto.
BINDER O mesmo que CAPOTE.
BITOLA(R) Sob a forma substantiva, tem significados distintos conforme o setor onde seja utilizado o termo. Referindo-se a charutos prontos para a comercialização, trata-se das medidas dos diâmetros versus comprimento. Referindo-se a “tirulos” em produção ou charutos sendo capeados, trata-se exclusivamente do diâmetro do produto. Sob a forma verbal, refere-se às operações executadas no setor de “Prensas & Cortes” onde os charutos são recortados para um dado comprimento.
BOLSAS CELO São tubos de celofane, de diâmetros variáveis, para acondicionamento individual de charutos, exigência característica do mercado norte- americano. As bolsas celo, ao consumidor, representam a vantagem de melhor manutenção da umidade do produto; ao revendedor, facilitam a comercialização dos charutos em unidades e, para o fabricante, têm a vantagem de “disfarçar” eventuais variantes cromáticas entre os charutos de uma mesma caixa. 
BUCHA O mesmo que FILLER.
BUNCH  O mesmo que TIRULO.
BUNDLE O mesmo que MAÇO, no sentido comercial. (Produtos prontos em pacotes).
CABEÇA O mesmo que BICO.
CAPA Folha de fumo que envolve os charutos externamente. São oriundas dos fumos ditos “capeiros”, de altos custos de produção, geralmente plantados “bajo-tela”. As capas são o ítem de maior participação, em valor, nos custos de produção e a elas se atribuem grande responsabilidade pela qualidade gustativa dos charutos.
CAPEAMENTO Ato de “capear-se” um charuto, ou seja envolver o "tirulo” com a capa. Requer extrema destreza  manual e um período de aprendizado/treinamento ao redor de cinco meses. Também denomina-se o departamento fabril onde as charuteiras executam a operação.
CAPOTE Folha de fumo que envolve o “filler” dos charutos. Também chamada sub-capa. Um perfeito equilíbrio entre os fumos dos capotes e os fumos das capas, é garantia para o sucesso de um charuto.
CELOFANADO Setor fabril, geralmente agregado ao ANELADO, onde se acondicionam os charutos, um a um, em tubos de celofane. Tais tubos são conhecidos como BOLSAS CELO. 
CEPO Aparato de madeira, metal ou plástico, usado pelo Controle de Qualidade, com orifícios de diversos diâmetros, para conferir-se a exatidão da grossura dos charutos. Passar no cepo: ato de conferir a exatidão do diâmetro (tanto dos “tirulos”, quanto dos charutos capeados).
CHAVETA Aparato metálico usado pelos encarregados da operação de capeamento para recortar as bordas da meia-folha (banda) de fumo que irá capear charuto, em formato de meia lua. É usada complementarmente para recortar, em forma circular, um pequeno pedaço de fumo remanescente,  para colá-lo no bico do charuto.
CIGAR Charuto.
DAR CANDELA O ato de acender um charuto.
DESTALO Ato de destalar uma folha de fumo e que consiste na extração da veia principal. O destalo é importante pois as veias centrais, por serem muito volumosas, se mantidas, não permitiriam uniformidade táctil e beleza visual dos charutos após “capeados”. Registre-se que a operação de destalo representa perda de peso (aumento de custo) que varia, a depender do tipo de fumo, de 23% a 25%. Os talos não têm utilidade industrial.
ESCOLHIDA Setor fabril onde os charutos após prontos, e antes de receberem os anéis, são cromaticamente classificados. A operação requer grande acuidade visual.
FILLER Fumos usados no interior dos charutos, que são envoltos pelo “capote”. Os “fillers” tem importante participação na QUEIMA dos charutos.
FROGS O mesmo que SAPO.  
FUMO CAPEIRO Vide CAPAS.
FUMOS BRASIL-BAHIA Diz-se da variedade de fumos secularmente cultivados na Bahia, conceituadíssimos no Exterior por seu aroma e gustabilidade, considerados entre os melhores tabacos do mundo para a fabricação de charutos. A depender da região produtora são classificados em diversas procedências, entre as quais ressaltam Mata Fina e Mata Norte. Embora qualitativamente semelhantes, cada uma delas tem suas próprias características.  
GALERA Vide CAPEAMENTO (departamento).  
HAND-MADE Feito à mão (referindo-se a charutos).  
LAGARTIXA São folhas de fumos para “fillers” que foram inteiramente destaladas.  
LONG-FILLER Diz-se dos charutos cujos fumos da parte interior são constituídos de folhas de fumo inteiras.  
MAÇO Dois significados distintos. Em nível de produtos acabados, qualquer pacote envolto com papel celofane, contendo determinada quantidade de charutos (em geral 25). Em nível de produção, o amarrado correspondente a uma MÉDIA-RUEDA.  
MANOCA(R) Os fumos para capas e capotes são enfardados, sendo antes amarrados pelos pés das folhas, em lotes ao redor de 40 folhas. Tais amarrados são chamados de manocas. Manocar: “fazer manocas”.
MATA FINA Diz-se dos fumos da variedade BRASIL-BAHIA plantados na região assim denominada e que abrange, entre outros, a dos municípios de São Gonçalo dos Campos, Cruz das Almas, Conceição da Feira, etc.  
MATA NORTE Diz-se  dos fumos da variedade Brasil/Bahia, plantados na região assim denominada, a qual abrange, entre outros, a dos municípios de Irará, Coração de Maria, Amélia Rodrigues, etc.
MEDIA-RUEDA As produções individuais de charutos no Setor Capeamento são amarradas em lotes de 50 unidades para serem submetidas à inspeção visual e controle do peso. Tais amarrados são as medias-ruedas (também chamados de maços).
MOLDES Artefatos (de madeira ou plástico) importados, compostos de 2 partes que se encaixam (macho e fêmea), com dez células semi-cilíndricas em cada lateral do molde. Tais células têm, após o encaixe das duas laterais, o diâmetro exato desejado para o charuto. Assim sendo, para cada diâmetro de charuto, há um molde específico. Os moldes acomodam os “tirulos” e após fechados são submetidos a uma operação de prensagem para lhes conferir uma forma cilíndrica uniforme e permitir a operação subseqüente: o capeamento.
A ponta do charuto que corresponde àquela na qual o fumante o acenderá.  
PICADURA Vide SHORT FILLER.
PRECINTO Um rótulo (geralmente esverdeado, lembrando uma cédula de dólar) ainda muito usado, por alguns fabricantes, colado no lado destro das caixas, semi-envolvendo a tampa, a cabeceira e o fundo da mesma.
PREMIUM CIGAR Diz-se dos charutos hand-made, 100% fumo natural que, no mercado, têm preços de venda ao público acima de US$ 1.00 por unidade. 
PUROS Charutos.
QUEIMA A combustibilidade dos charutos.  
REZAGOS Diz-se dos produtos (fumos ou charutos) rejeitados pelo Controle de Qualidade.
RUEDA  Um maço, a nível de produção, com 100 charutos (e não 50).
SAPO Folha de fumo semi-destalada, na qual as 2 bandas ficam unidas pela ponta da folha . É uma das variações usadas nos “fillers” dos charutos.
SELO DE GARANTIA O mesmo que PRECINTO.  
SHORT-FILLER Diz-se dos charutos cujos fumos da parte interior são constituídos de folhas de fumos recortadas.  
SOCA Diz-se do pé de fumo que renasce após a colheita da planta-mãe.
SUB-CAPA Vide CAPOTE.
TALO Diz-se de uma parte da veia central do tabaco que ocasionalmente haja sido incorporada ao charuto.  
TAPA-PREGOS Etiqueta (geralmente auto-adesiva) utilizada em certos tipos de caixas de charutos, afixada centralmente de formas a selar a tampa com a cabeceira das caixas.  
TIRULEIRA A(o) operária (o) que produz “tirulos”. Diz-se também da maquineta manual que auxilia na execução da tarefa.  
TIRULO O charuto semi-acabado, composto apenas pelo “filler” e o “capote”. Também se denomina TIRULOS o departamento onde os mesmos são produzidos.  
TORCIDA INTEIRA Vide LONG FILLER.  
TORCIDA MIÚDA Vide SHORT FILLER.  
TORCIDA O mesmo que FILLER.  
WRAPPER O mesmo que CAPA.  

002.    QUEM ENSINOU A ARTE DE FUMAR

 

Alguns pesquisadores brasileiros, entre eles Celene Costa, que faz doutorado na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, em Paris, defendem a tese que a formulação simbólica do 22 de abril, como o dia do descobrimento do Brasil, está relacionada ao etnocentrismo e ao colonialismo.

Segundo tais estudiosos, há um paradoxo imenso no ato do descobrimento, visto que, quando do mesmo, os portugueses encontraram os verdadeiros descobridores, etnias nativas, que aqui vivam há milhares de anos.

A rigor, 22 de abril não foi a data da descoberta e sim, a da chegada dos europeus, e do conseqüente ingresso de outros padrões culturais.

Por extensão tal raciocínio se aplica a Colombo o qual, ao aportar em terras americanas em 1492, encontrou entre os habitantes locais o hábito, desconhecido aos europeus, de aspirar folhas acesas de tabaco.

Por isso, em minha carta anterior, declarei que o ato e o rito de acender um “puro” tem mais de 500 anos.

O tabaco pertencia à seara dos pajés e certa magia estava presente no consumo dos rústicos e primitivos charutos, feitos com folhas de fumo nem fermentadas. A fumaça pretendia ser um elo de ligação com suas entidades superiores.

Recorde-se que, tanto a fumaça dos turíbulos do cristianismo, quanto a dos incensos e defumadores dos mais variados ritos religiosos, orientais e ocidentais, têm similar significado: preparar o ambiente para a recepção da divindade.

Esta herança cultural torna fácil entender porque, no Brasil, charutos são também ligados a manifestações de determinados cultos.

Não esqueçamos, portanto, que os “puros” são americanamente nossos e que os povos de outros continentes foram alvo de um verdadeiro processo de aculturação. Mesmo assim há, ainda, quem julgue que os melhores charutos são os europeus.

Que nos desculpem os fumadores do “Velho Mundo”, mas quem lhes ensinou a arte e o prazer de fumar fomos nós.

001.    RITO DE 500 ANOS

Seu nome integra minha relação de especialíssimos clientes, muitos creia, que há mais de dez anos confiam em meu atendimento expresso e personalizado. Gente que compõe o universo dos amantes da arte e do prazer de fumar.

Com o passar do tempo desenvolveu-se entre nós uma empatia, de forma tal que, ao nos comunicarmos pelo telefone, é como se velhos amigos estivessem se reencontrando.

Charutos têm destas coisas. Despertam afinidades. Promovem amizades. Concedem momentos de inefável satisfação.

Por tudo isto e pelo fato do Amigo sempre preferir meus serviços, quando vezes muitas até dispõe de um fornecedor local, foi que decidi iniciar, e manter com regularidade, uma série de cartas, série esta que intitulei FUMAÇA MÁGICA. Uma reminiscência do final dos anos oitenta, quando editava um boletim informativo, assim também intitulado.

Em cada carta, algo do mundo charuteiro. Ora um comentário sobre a produção nacional; ora uma curiosidade sobre o hábito de fumar charutos; ora uma prática consagrada; ora uma estatística do mercado. Informes que são fruto de minha longa vivência na atividade, onde continuo aprendendo todos os dias.

Se o Amigo se der ao trabalho de colecionar minhas mensagens terá, ao final de algum tempo, muito material interessante para convencer os mais inveterados protestantes ou para deliciar seus interlocutores que respeitam (e invejam) sua preferência pessoal.

Portanto, aguarde minhas notícias. Enquanto isto, acenda um majestoso Alonso Menendez ® ou um inebriante AMERINO ®. Saiba que o ato e o rito de acender um charuto tem mais de 500 anos.


Hugo Carvalho

E-mail: hugocharutos@uol.com.br

Telefones: (075) 9133 1209 ou 246 1045

Caixa Postal, 02

44330-000 São Gonçalo dos Campos - BA

 

 

 

 

FUMAÇA MÁGICA