FUMAÇA MÁGICA 270

São Gonçalo dos Campos/BA.

 

COR & AÇÃO

 

HUGO CARVALHO*

 

Confesso ter sido um dos melhores charutos dos últimos tempos. Mas, antes de avançar no tema, deixem-me à sombra das minhas alegrias, acomodar-me numa cadeira espreguiçadeira, dar tratos à bola e pôr o coração a pulsar. Memórias.

Das várias formas de amor, nenhuma conheço mais duradoura, infensa a separações e divórcios, do que o amor clubístico. São amores que só acabam com a viuvez. Eu mesmo testemunhei o caso de um viúvo, que voltou a ter atrações por novas cores, dado à quase imperiosa necessidade cultural nossa, de se (man)ter um amor futebolístico.

Eram inícios dos anos cinqüenta do século passado quando, eu nos meus 12 ou 13 anos, lá na minha trilegal Porto Alegre, meu pai enviuvara. Seu time do coração, o “Renner”, fechara as portas e deixara viúvos seus torcedores. Foi quando vi começar a aparecer em nossa casa, tecidos bordados com um círculo vermelho com três letras brancas superpostas, rebuscadas, ao melhor estilo de começos do século 20. Tais letras correspondiam às iniciais de três palavras grafadas de forma reveladora da influência inglesa, no mundo do futebol da época. Era um “S” de “Sport”, um “C” de “Club” e um “I” de “Internacional”, carinhosamente conhecido como “Colorado”, palavra que é a mais perfeita tradução gaúcha da cor vermelha.

Não se esqueça que os adeptos dos dois partidos políticos gaúchos que, no passado, sempre se digladiaram, em tempos que já vão longe, eram os maragatos e os colorados. Esses últimos, tendo sempre tendo ao pescoço, o característico lenço vermelho. Cor que, por sinal, continua sendo usada nos lenços dos “gaudérios” de hoje, quando devidamente “pilchados”.

Registre-se que o gaúcho, povo de ação, sempre teve uma preferência especial pelo vermelho. Na bandeira do Rio Grande além do auriverde do pavilhão nacional, o vermelho marca majestosa presença. A tricromia do lábaro gaúcho o faz inconfundível no concerto das demais bandeiras estaduais.

Pois bem. Aquele emblema que eu encontrava pelos cantos da casa, já era o claro sinal de que meu pai encontrara um novo amor, no futebol. De torcedores do Renner, viramos colorados.

Pena que o velho tenha partido, sem a alegria de ver nosso amor clubístico se converter em campeão mundial. O maravilhoso charuto que fumei, ao qual aludi ao começo desta crônica, foi justamente pela vitória do “Inter” me haver proporcionado tão agradável retorno ao passado.

O PT governou o estado sulino por 16 anos. Facilitou no galope, caiu do cavalo. Agora reinam os colorados. O Rio Grande, portanto continua vermelho. De cor & ação.


É autorizada a reprodução desta crônica em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, desde que citada a fonte e seu autor. www.hugocarvalho.tk


HUGO CARVALHO - economista gaúcho que se fez baiano em 1965, aos 24 anos de idade. Missivista por força de ofícios quando jovem, hoje, aposentado, mata saudades do passado escrevendo crônicas.

 

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