FUMAÇA MÁGICA 269

São Gonçalo dos Campos/BA.

 

DEPENDÊNCIAS

 

HUGO CARVALHO*

 

 Vou lhes contá como é triste,

vê a velhice chegá,

vê os cabelo caíno,

vê  as vista encurtá.

 

Do “Cordel da Velhice” – autor desconhecido

 

 

Mesmo de óculos, penduricalho facial do qual sou dependente e que me acompanha desde a juventude, eu não mais estava conseguindo distinguir, sem esforço, as veias e pequenos detalhes das capas dos meus charutos. A cada vez que me propunha a degusta-los, me obrigava a trazer o objeto dos desejos para junto dos olhos, com a mesma distância que sempre adotara para aspirar seu aroma. Uma visita à oftalmologista resolveu o problema. 

Hoje quando se fala em dependências, raramente ocorre a idéia que se poderia estar falando dos cômodos de uma casa. Acodem logo idéias relativas às limitações que a vida nos impôs, quando não o forem de drogas, algumas socialmente aceitas, outras consideradas ilícitas. 

Quem não conhece a expressão “Fulano é dependente de beltrano pra tudo”. A depender do contexto se poderá estar falando de uma questão pecuniária, de uma questão de limitações físicas, etc. 

Eu sou cheio de dependências.

 

Sou dependente de meus óculos para que meus olhos que possam ver com o carinho dos amantes.

Sou dependente de minhas mãos para apalpar e sentir junto a mim aquilo que aprecio.

Sou dependente de minha mulher que, com meus dois menores, compõe a trilogia da perfeição, minha família da melhor idade.

Sou dependente do computador para, quando quero, estar em contato com o mundo.

Sou dependente de meus charutos, fiéis escudeiros e amigos de minhas jornadas interiores.

Sou dependente dos anos já vividos que me impõem limites a joviais desejos.

E finalizando, mas não esgotando, sou dependente de meus leitores, viciado por dizer-lhes das coisas que penso, sem que tanto me tenham perguntado.


É autorizada a reprodução desta crônica em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, desde que citada a fonte e seu autor. www.hugocarvalho.tk


HUGO CARVALHO - economista gaúcho que se fez baiano em 1965, aos 24 anos de idade. Missivista por força de ofícios quando jovem, hoje, aposentado, mata saudades do passado escrevendo crônicas.

 

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