FUMAÇA MÁGICA 230

São Gonçalo dos Campos/BA, 13 de junho de 2006

 

A AULA

HUGO CARVALHO* 

 

Você aperta no triângulo para dar pernadas; aperta no quadrado para dar murros; aperta na bola para falar e aperta no xis para pular. 

Assim foi minha primeira aula de PlayStation2. Os professores? Meus dois filhos, de cinco e sete anos, havidos na terceira idade. 

Desculpem! Comecei pelo final. Vamos colocar ordem na casa e no relato.

Num quase final de tarde, estava dando tratos à bola, fumando meu charuto e rabiscando idéias (rabiscando é força de expressão, melhor dizer digitando) quando os dois guris “invadiram” meu reduto lítero-charuteiro tirando minha concentração.

Normalmente eles “respeitam” este recanto da casa. Aliás, é o único lugar onde eu fumo sem rodeios e onde eles não sobem nos sofás, não apertam qualquer botão que encontrem pela frente, não mexem nas gavetas.

A mulher saíra e me deixara com os dois, que ficaram lá pelas bandas da sala de estar; três TVs ligadas. Uma com a programação normal; outra passando um desenho em DVD e a terceira com o PS2 ligado. Ainda não entendi como eles conseguem “assistir” tudo isso, ao mesmo tempo.

Pai! Você tem que comprar um memory-card pois assim posso salvar o jogo do Homem Aranha no lugar onde parei! Disparou o maior.

Botei o charuto de lado; salvei o que houvera escrito até então; voltei-me para eles na cadeira giratória e me dispus a dar-lhes minha sempre, por eles, disputada atenção.

Foi quando começou a história. Ou melhor, a aula.

Você aperta no triângulo para dar pernadas; aperta no quadrado para dar murros; aperta na bola para falar e aperta no xis para pular. 

Fiz-me interessado. E, quanto me foi agradável vê-los se divertirem “explicando-me”, com gestos amplos e em altos brados, os efeitos gráficos ao se apertar no triângulo, no quadrado, no círculo (na bola, segundo eles) ou no xis. 

Pai! Você está entendendo? Viu como é fácil? – e me arrastaram lá para a sala onde me ministraram a parte prática da aula da qual sempre me furtara.

Antes de sair, recorri ao charuto. Outra baforada prazerosa. Despedi-me do puro e, na qualidade de aprendiz, coisa que nunca deixamos de ser na vida, fui desfrutar da inigualável companhia de meus filhos, apesar da enorme distância entre as idades que nos separam.


É autorizada a reprodução desta crônica em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, desde que citada a fonte e seu autor. www.hugocarvalho.tk


Hugo Carvalho - é economista e cronista. Já publicou mais de duzentas crônicas, nas quais o tema "charutos" é recorrente. Volta e meia costuma inserir em seus textos, aspectos particulares da sua visão da vida em São Gonçalo dos Campos-BA.

 

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Telefones: (075) 9133 1209 ou 3246 1744  

Via Skype: hbcarvalho


São Gonçalo dos Campos


Amigos.

Quando, há alguns anos, comecei a escrever sobre charutos era movido por preocupações de cunho meramente comercial. Marketing direto e telemarketing eram palavras da moda. 

Preocupava-me em explicar como são feitos os charutos, como são fumados, etc. Tais textos, quando hoje os releio, me parecem estéreis, enfadonhos. Transcrições adaptadas à minha linguagem, daquilo que outros disseram e redisseram, muito antes de mim, sobre a matéria.

Com o advento da Internet, então, nem se fala. “Choveram” sites sobre puros. Basta Você acessar qualquer um e irá encontrar, quase sempre, as mesmas ladainhas. Quantas vezes, navegando em sites charuteiros, encontrei palavras minhas (?). Ledo engano querer ensinar o padre-nosso ao vigário. Quem melhor sabe de charutos é Você que os consome. 

Evadi-me da vala comum. Abandonei as preocupações mercantis; troquei o marketing direto pelo Marketing de Relacionamento e passei a escrever pelo prazer de escrever e de fumar charutos.

Puxa! Como a vida mudou.

Agora, salvo ocasional recaída que o retrogosto dos puros provoca, não retroajo. Interajo consigo. Procuro dar novo sentido a nosso relacionamento tentando demonstrar serem os charutos, para quem neles se iniciou, parte integrante do cotidiano.

Tenho relutado em ter criado meu site na Internet, pois não gosto de falar com estranhos sem ter sido previamente apresentado. Não me sinto confortável em me expor para aqueles a quem não conheço. Essa característica pessoal meus charutos não corrigiram. Ao contrário, respeitam-na, pois eles não são para todo mundo. São apenas para pessoas especiais, como Você dileto amigo, que os curte nos, por si eleitos, melhores momentos de sua vida.

HUGO CARVALHO